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Amigo a gente acolhe, recolhe e agasalha…

Sabe aquela música que você ouve pela primeira vez e ela parece entrar em sua alma, te invade de tal maneira que você nem se dá conta e já foi conquistado? Pois é, há pouco tempo isso aconteceu comigo, talvez pelo fato de ultimamente ouvir tanto lixo. Estava sentindo o que sentia nosso saudoso Tom Jobim. Jô Soares perguntou a ele, durante uma entrevista em seu programa, o que o maestro achava da música brasileira atual. Tom deu um sorriso de jacaré e respondeu: “Jô, estão querendo fazer de meus ouvidos um penico”.

Pensando na resposta de Tom, estava meio que nem ele quando recebo, no Faceboock, um vídeo em que Simone e Zélia Duncan começaram a cantar “Amigo é casa”. Nunca tinha ouvido esta maravilha, fiquei estático, viajei em cada palavra cantada, visitei em pensamento amigos que amo, transportei-me a uma velha casa em que morei quando criança, em cujas portas haviam tramelas.

A melodia saindo do lugar comum… Quis saber mais sobre esta música, pedi socorro ao Google que deixou-me na cara do gol. Fiquei sabendo que a melodia era de um músico de Recife chamado “Capiba”. Ele é autor de um dos maiores sucessos do imortal Nelson Gonçalves, a belíssima “Maria Bethânia”. Dona Nonô batizou sua filha, a cantora Maria Bethânia, com este nome por gostar muito desta música.

O Google mostrou-me que “Capiba” tinha um parceiro nesta música, o poeta-compositor carioca Hermínio Belo de Carvalho que vestiu a melodia com palavras que só pessoas iluminadas são capazes de fazer. A letra da música é enorme e Hermínio, ao compor seus versos, faz a comparação com a construção de uma casa com uma amizade sólida.

Diz que “amigo é feito casa que se faz aos poucos, mas tam­bém é preciso muito tijolo e terra, preparar reboco, construir tramelas, usar a sapiência de um João de Barro que constrói com arte sua residência, e que o alicerce seja muito resistente para resistir às chuvas e aos ventos”. Poxa, que lindeza!

A letra prossegue até chegar à segunda parte, em que diz: “A casa é uma amizade construída aos poucos e que a gente quer com beiras e tribeiras, com portão bem largo pra se entrar sor­rindo de braços abertos, sem fazer alarde sem causar transtorno.” Mas o que me encantou é quando, quase chegando no final, Her­mínio diz que “amigo é pra ficar, se chegar, se achegar, se abraçar, se beijar, se louvar bem dizer… Amigo a gente acolhe, recolhe, agasalha e oferece lugar pra dormir e comer…”

Ouvi tanto essa música, e sempre que chegava na parte “ofere­ce lugar pra dormir e comer” a emoção tomava conta de mim. É fortíssima esta parte. Decidi gravar esta maravilha, liguei pro meu amigo Mauricio Bailoni, maestro que fez um arranjo maravilho­so, tocou vários instrumentos na gravação e quando terminou sua parte deu-me um toque para ir até seu estúdio colocar a voz.

Estava tão ansioso para este momento que cheguei lá emocio­nado. A música é muito difícil de cantar e segurar a frase com a mesma pressão inicial requer um pulmão supercheio, mas fomos indo. Quando cheguei na parte que usei como título desta crô­nica, minha voz embargava, vinha em meu pensamento amados amigos, alguns tiveram que partir, outros estão por aqui e sabem o quando os amo e que naquele momento queria estar com eles, abraçando-os, beijando-os. Após me refazer várias vezes, conse­gui terminar “Amigo é casa”.
Agradeço ao saudoso “Capiba” e a Hermínio Belo de Carvalho.

Sexta conto mais.

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