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A última rosa

A força que tem meu netinho Kauã, de apenas 8 anos, me faz pensar uma infinidade de coisas que vão além do que posso imaginar. Caso contrário como explicar seu comportamento após a partida de seu papai, numa fase de sua vida em que tanto precisa dele? Fico pensando de onde vem tamanha valentia, tamanha serenidade para encarar a situação? Com certeza, seus anjos de guarda estão a cercá-lo de proteção e preparando-o para tudo.

Imagine você que está habituado a ler minhas crônicas aqui no nosso Jornal Tribuna Ribeirão: por mais que eu queira não mais tocar no assunto, alguma coisa me conduz a escrever mais uma vez sobre a partida de meu filho amado, Paulo Bueno, aos 42 anos.

Todos sabem que faz 12 anos que meu filho mais novo, Lucas Bueno, teve que partir. Paulo, diferentemente do irmão, nada tinha a ver com o lado artístico, suas qualidades eram outras. Era ele quem me ensinava a conhecer melhor meu computador, ele tinha enorme talento para descobrir o desconhecido e tudo numa rapidez que me fazia tirar o chapéu.

Era ele quem montava CDs de músicas gravadas de meus shows ao vivo e armazenava tudo no meu computador, tirava as canções de uma pasta, colocava todas em sequência e as gravava, tudo numa rapidez impressionante. Assim minha vida seguia, com ele sempre por perto, mesmo morando à dois quilômetros de casa.

Quando Lucas partiu, disse a Paulo em certa noite, ao nos despedirmos. “Eu e sua mãe só temos vocês, tome conta da gente, ok, meu filho?” Ele, com lágrimas nos olhos, disse: “Pai, é tudo que quero fazer”. De repente, aquele homem de 1,93 de altura e 135 quilos fica doente. Eu acreditava que seria uma coisa passageira. Ele não fumava, nunca bebeu, estava tranquilo até o dia em que precisou ser internado. Começava ali mais uma triste etapa de minha vida…

Foram tantas idas e vindas até o Hospital Ribeirãnia que decorei cada defeito, cada ondulação da pista da avenida Francisco Junqueira. Foram 21 dias de UTI – e como é triste aquele ambiente! Tanto que Paulo chegou a nos pedir para tirá-lo de lá. E nós o tiramos, ele foi para o quarto, mas teve que voltar. Dois dias antes de partir voltou para o quarto, em momento algum perdemos a esperança de sairmos de lá com ele completamente recuperado.

Mas como tudo em nossas vidas está programado… naquela noite de 29 de junho, sozinho em casa, eu não conseguia dormir. Veio a madrugada de 30 de junho e minha esposa, que havia passado a noite com ele, por volta das cinco da manhã me ligou pedindo para ir até lá, pois sentia Paulo estranho. Era seu coração de mãe pressentindo o que estava por vir. Ficamos olhando para ele, que fazia algumas perguntas, e de repente o vimos partir. Tentaram reanimá-lo por horas, mas ele já tinha nos dito até mais. Que pancada acabávamos de levar.

Fiquei sem chão, liguei na hora para José Fernando Chiavenatto, jornalista amigo-irmão que em minutos estava lá e cuidou de tudo, tudo, tudo. Pôxa! Que amigo tenho, que amigo Deus me deu! Eu me preocupava com minha esposa, minha nora, meus netos, principalmente o mais novo, nosso pequenino Kauã. A mãe dele falou: “Ele está preparado”. E estava! Tanto que ficou sobre uma cadeira ao lado do caixão do pai.

Acompanhando o cortejo, alguém me deu uma rosa. Já no túmulo, Kauã jogou muitas flores e rosas despedindo-se do papai, até que eu disse: “Acabaram as rosas”. Restava a minha, que lhe passei e ele a jogou sobre o caixão de seu papai. Foi a última rosa…

Dias depois ele pediu a sua mamãe que o levasse até onde seu papai estava. Foram os três, ele em silêncio observou tudo, nada falou, nem perguntou. Já vai fazer três meses e nunca o vi chorar, é um ser especial. Apenas diz: “Meu pai fazia isso, meu pai fazia aquilo…” A vida segue e eu levarei sempre comigo a imagem de Kauã jogando a última rosa.

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