André Luiz da Silva *
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O país acompanha comovido os desdobramentos do acidente com o avião da Voepass. Muitas pessoas, ainda, se emocionam com as notícias dos ataques de Israel à população da Palestina, na Faixa de Gaza e dos combates entre Rússia e Ucrânia. As imagens são fortes e impactantes e geram incontáveis horas de exposição midiática e comentários nas rodas de conversas e redes sociais No entanto existe uma tragédia silenciosa e de pouca repercussão coletiva, embora devastadora para os envolvidos, está bem à nossa frente e não é comentada: a violência contra crianças e jovens brasileiros.
Na última terça-feira foi lançado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) a segunda edição do relatório Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil. O documento traz números alarmantes que merecem especial atenção de toda sociedade.
Somente nos últimos três anos, mais de 15 mil crianças e adolescentes, com idades entre 0 e 19 anos, foram mortos de forma violenta no Brasil. E no mesmo período, 165 mil meninos e meninas foram vítimas de violência sexual.
Enquanto nossos congressistas se digladiam com improdutivas discussões sobre a chamada agenda de costumes, a infância e a juventude brasileira estão sendo dizimadas. A violência institucional é a que mais preocupa, pois, embora a taxa de homicídios tenha caído, cresceu a porcentagem de mortes causadas por intervenções policiais. Em 2023, quase 1 a cada 5 crianças e adolescentes mortos no Brasil foi vitimado em ações policiais.
Para aumentar nossa indignação, os números de estupro contra crianças e adolescentes têm crescido constantemente. Foram registrados 46.863 casos de violência sexual em 2021, número que aumentou para 63.430 em 2023 – o equivalente a uma criança ou adolescente vítima de estupro a cada 8 minutos no último ano. Sim, infelizmente a informação está correta! Nem os garotos escapam, pois foram 20.575 casos de crianças e adolescentes do sexo masculino estuprados.
Outro fator de preocupação é que as violências sexuais e letais têm atingido cada vez mais as crianças mais novas notadamente as menores de nove anos. Quando fazemos o recorte por raça, constatamos que os meninos negros continuam a ser as maiores vítimas de mortes violentas.
Além da infância destruída, essas vítimas de abuso e violência frequentemente desenvolvem problemas graves como ansiedade, depressão, síndrome do pânico, comportamentos autodestrutivos e sexualização precoce, condenando uma geração inteira a uma vida de sofrimento.
Especialistas indicam que são necessárias ações concretas para mudar essa realidade. Entre as medidas recomendadas estão: prevenir e responder às violências, não justificar nem banalizar a violência, controlar o uso da força pelas polícias, regular o uso de armas por civis, enfrentar o racismo estrutural, compreender e enfrentar a violência doméstica, garantir atendimento adequado às vítimas, capacitar profissionais, ampliar o acesso a canais de proteção e investir em monitoramento e geração de evidências.
O tema é urgente e não é possível que continuemos passivos e reféns de disputas políticas, religiosas e ideológicas, enquanto nossos filhos e netos estão sendo molestados e mortos.
* Servidor municipal, advogado, escritor e radialista