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A rua como companheira

JF PIMENTA

Um relatório realizado pelo Serviço de Abordagem Social (SEAS) do município e operacionalizado pelo Ins­tituto Limite contratado para esta finalidade, revelou que entre 27 de junho de 2017 e 31 de março de 2019, foram registradas em Ribeirão Pre­to três mil e trezentas pessoas em situação de rua.

O levantamento que serve para traçar um raio X deste público e ajudar na elabora­ção de políticas públicas para o setor, mostra ainda que a maioria, 2.706, é homem, o que corresponde a 82% do total. Já as mulheres totali­zam 594 e representam 18%.

Em reação a faixa etária o relatório concluiu que a maioria dos moradores em situação de rua tem entre 26 e 35 anos de idade. E os lo­cais com maior concentração destas pessoas são na região central da cidade, como as praças Carlos Gomes, no Calçadão, e a Francisco Sch­midit, localizada ao lado da Unidade Básica Distrital de Saúde (UBDS) Central, na avenida Jerônimo Gonçalves. Praças e avenidas das regiões Norte e Leste também tem grande concentração de mo­radores de rua.

No caso da Praça Fran­cisco Schmidit, a Guarda Ci­vil Municipal instalou uma base móvel no local, duran­te o dia. O objetivo é inibir a presença de moradores de rua e desenvolver ações de combate ao tráfego de dro­gas por lá. Em 2018 foram registrados pela base móvel 21 flagrantes e em 2019 até o mês de outubro foram re­gistrados 21, por tráfico de entorpecentes, furto de celu­lares, lesão corporal, estupro de vulnerável, e descumpri­mento de medida protetiva Lei Maria da Penha.

O relatório, do Instituto Limite, porém, não mensura a origem, ou seja, os muni­cípios de onde estas pesso­as vêm. O levantamento diz apenas que em média um terço dos moradores de rua é de Ribeirão Preto. O restante seria das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nor­deste. Já em relação às causas que levaram estas pessoas a abandonarem suas casas e fa­mílias, a bebida, as drogas e problemas familiares lideram o ranking.

FOTOS: J.F.PIMENTA

Vale destacar que a equipe de abordagem social do Ins­tituto Limite é composta por 18 pessoas, que trabalham das 6 às 24 horas, de segunda a sexta. Na abordagem, eles conversam com estas pesso­as, oferecendo banho, comi­da, roupa, formas de contato com a família e, se for de fora, também oferecem passagem de ônibus para voltar para a cidade de origem.

Prefeitura destaca os atendimentos que faz
A Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS) afirma que oferece vários serviços para pessoas em situação de rua, mas não es­pecificou ao Tribuna a quantidade de atendi­mentos que realiza nos serviços que oferece.

CASA DE PASSAGEM
Local para que eles possam dormir. Lá os moradores de rua têm direito ao banho e ao jantar. A pessoa pode permanecer até por seis meses (excepcionalmente até mais), além de receber atendimento especializado e enca­minhamento para compreensão do caso e planejamento sócio-assistencial.

CENTRO POP
Unidade pública que oferta serviço especia­lizado para as pessoas em situação de rua. São ofertados atendimentos individuais e coletivos, oficinas, atividades de convívio e socialização, além de ações que incentivem o protagonismo e a participação social das pessoas em situação de rua. O Centro é um espaço de referência para o convívio social e o desenvolvimento de relações de solidariedade, afetividade e respeito. Funciona como ponto de apoio para guarda de pertences, higiene pessoal, alimentação (café da manhã, almoço e lanche) e provisão de documentação, além de informar, orientar sobre os direitos e o acesso a benefícios Socioassistencias.

RECÂMBIO
Serviço que oferece passagem de ônibus para o retorno à cidade de origem. É feito um estudo, caso a caso, para que ocorra o recâmbio. Até o fechamento desta reportagem a Prefeitura não havia informado quantas passagens foram distribuídas de 2018 até o momento e nem os destinos – cidades – para onde os moradores em situação de rua foram encaminhados.

PROGRAMA RECOMEÇO
Programa que promove ações preventivas do uso indevido de substâncias psicoativas. Oferece apoio sócio-assistencial e financia o tratamento, aos dependentes de substâncias psicoativas, em comunidades terapêuticas conveniadas.


Juliano puxa duzentos quilos de reciclável por dia
Quem passa pelas ruas São Paulo e João Ramalho, nos Campos Elíseos, no começo da manhã ou no final da tarde, com certeza alguma vez já viu o catador de reciclável Juliano Cesar, de 25 anos puxando um imenso carrinho tipo carroça, cheio de papelão, plástico e ou algum outro material vendável.

Morador em um pequeno barraco Favela do Brejo, lo­calizada às margens do córrego Tanquinho, nos Campos Elíseos, Juliano transporta, todos os dias, cerca de du­zentos quilos de material reciclável recolhido nas ruas da cidade. O destino? Um depósito de ferro velho localizado próximo a favela onde mora.

Natural de Sorocaba, de onde se mudou para Brodó­squi, ele está em Ribeirão Preto há um ano. Aqui reco­lhe reciclável num carrinho emprestado pelo dono do depósito de ferro velho e diz tentar esquecer as mortes da esposa e da filha de cerca de dois anos atropeladas – há cerca de seis anos – em Brodósqui, por um motorista, segundo ele, embriagado. Sem perspectiva de futuro, na última quinta-feira tentava conseguir R$ 15,00 para mandar consertar a câmara dos pneus do carrinho que tinham furado. “Minha vida é viver um dia após o outro”, diz o catador que admite fumar baseados de maconha. “Ajuda a acalmar e a esquecer meus problemas”, afirma.


Luciano, sozinho no centro da cidade
Luciano tem 40 anos de idade e há dois vive nas ruas da região central de Ribeirão Preto. A diferença dele para a maioria de muitos moradores em situação de rua é que Luciano prefere viver só, longe dos visíveis grupos espalhados pela cidade. Luciano é natural de Ribeirão Preto e durante grande parte de sua vida morou no bairro Ribeirão Verde, zona Leste da cidade. Entretanto o vício em drogas desde a adolescência, os problemas familiares que culminou nos roubos e furtos, acabou levando ele para a prisão. Condenado a cinco anos de cadeia, após cumprir a pena numa penitenciária da região, até tentou voltar para casa. Mas os vínculos haviam se rompido e não deu certo.

Atualmente mora nas ruas e para sobre­viver diz que recolhe material reciclável e depende da ajuda das pessoas que, segundo ele, colaboram sem que ele peça. “Não tenho a mania de pedir, mas agradeço quando me dão”, diz. A afirmação de Luciano parece fazer sentido. Na manhã de quinta-feira en­quanto dormia embaixo da marquise de uma escola desativada no centro da cidade, uma pessoa deixou ao lado dele dois pães com mortadela e um copo plástico com leite.

Viciado em crack, Luciano até já tentou deixar o vício. Foi internado três vezes, mas não conseguiu. Hoje admite não ver ne­nhuma perspectiva de futuro. “Apenas vou vivendo até o fim chegar ”, conclui.

Alexandre, vergonha e depressão
Alexandre Messa, de 40 anos, aparentemente tinha tudo para ter um bom emprego e uma família unida. Morador de Carapicuíba, até 2010 ele era servidor municipal da Prefeitura de uma grande cidade da Região Metropolitana de São Paulo. Casado tinha quatro filhos e uma família que, segundo ele, era quase perfeita.

Entretanto pouco tempo depois, acusado – junto com outros servidores – de participar de um esquema de irregularidades no setor em que trabalhava, foi exonerado, responsabilizado criminal­mente e acabou condenado a dois anos e oito meses de pena em regime semi-aberto. A pena foi cumprida numa penitenciária da cidade de Bauru.

Ao sair da cadeia, sem emprego, marcado pela Justiça e sem família, mudou-se para a cidade de Batatais onde tem alguns conhe­cidos que cuida de uma Organização Social. A ideia era recomeçar, mas não deu certo e hoje, oito meses depois, Alexandre vive embaixo da fonte luminosa desativada existente na Praça Romulo Morandi, no bairro Campos Elíseos.

Para sobreviver recolhe recicláveis e faz pequenos serviços como a limpeza de jardins para os moradores daquela vizinhança. Para esquecer o passado e as boas coisas que já teve e que perdeu como ele mesmo diz, de forma besta, ingere bebida alcoólica mais do que o considerado normal. Não chega a viver embriagado, mas sabe que se não fizer nada para parar a tendência será esta.

O único contato esporádico que mantém com a família é através do Facebook que ele criou para isso. Como não tem celular, utiliza de vez em quando uma lan house no bairro. Na rede social não tem fotos e nas poucas conversas não conta para os filhos que está morando nas ruas. Prefere dizer que está tudo bem e que vive numa pensão. “Tenho muita vergonha e não consigo dormir por causa da minha depressão” diz. Alexandre tem quatro filhos, uma de 21 anos, um de dezoito, um de 16 e outro de 13.

Três moradores de ruas assassinados nas últimas semanas
No domingo, 6 de outubro, um homem aparentando ter 25 anos foi encontrado morto com marcas de agressão dentro da Escola Estadual D outor Meira Júnior, no bairro Vila Vir gí­nia. A suspeita é que a vítima, que teria se escondido no local durante a madrugada, tenha sido espancada, j á que o corpo apresentava ferimentos.

Também no domingo outro homem foi encontrado morto atrás da Secretaria Municipal da Cultura, no Parque Morro do São Bento, nos Campos Elíseos. O corpo estava em estado avançado de decomposi­ção. A causa da morte não foi identificada

Já na segunda-feira, 7 de outubro, um homem foi morto a pedradas na rua Rio Verde, na Vila Albertina. Câmeras de segurança registraram o momento em que ele estende um lençol na calçada, se deita cerca de uma hora e meia, depois, é surpreendido pelo agres­sor que lhe desfere pedrada na cabeça. O morador de rua morreu no local. A Polícia Civil está investigando todos os casos.

 

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