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A rota das palavras

No aeroporto de Lisboa há uma placa curiosa: “Perdidos e Achados”. Perguntei se não seria “Achados e Perdidos” como no Brasil. Espantado, o português respondeu-me negativamente, pois você primeiro tem que perder para depois achar.

As palavras documentam a história dos homens e das gentes. Quando Portugal tinha acabado de descobrir o mundo para o mundo, vendia as especiarias asiáticas para a Europa. Uma delas tem o seu nome guardado até hoje: “Pimenta do Reino de Portugal”, a nossa conhecida “pimenta do reino”.

Quando exportavam chá para a Inglaterra, os portugueses escreviam no embrulho: “transporte de especiaria asiática”, ou seja, “tea”. Os ingle­ses e norte-americanos até hoje dão ao chá o nome de “tea”.

Em Lisboa há um museu dos coches imperiais. O mais extraordiná­rio foi fabricado em Berlim. Portanto o coche chama-se “berlinda”. Por tal razão, lá e cá, até hoje, quando alguém é muito observado, falamos que ele está na “berlinda”.

Quando os portugueses lutaram contra os espanhóis pela sua so­berania, os habitantes comiam as tripas dos animais e enviam a melhor carne para seus soldados. Com muito orgulho, até hoje quem nasce na cidade do Porto é conhecido como “tripeiro”. Acontece o mesmo no Bra­sil. Quem nasce no Rio é conhecido como “carioca”, quem nasce no Esta­do do Rio é conhecido como “fluminense”, palavra derivada diretamente do latim. Em Roma “flúmen” significava “rio”. Mas com muito orgulho os fluminenses se autodenominam “papa goiaba”.

O prato principal da cidade do Porto chama-se “tripa”, a nossa “do­bradinha”. O grande poeta Fernando Pessoa deixou um poema titulado como “Tripa à Moda do Porto”.

Os portugueses, mais nacionalistas do que nós, têm uma fidelida­de maior com a nossa língua. No passado fiz um curso de internet em Portugal. Aprendi que o “mouse” do computador lá na nossa terrinha chama-se “rato”. Nada de inglês ou francês, aqui em Portugal falamos o português, dizem com muito entusiasmo.

Os gregos criaram cidades por todo lado. Uma delas recebeu o nome do grande herói Ulisses. O porto chamava-se Ulissesponensis. Os árabes, que por ali mandaram durante oito séculos, reduziram a palavra: Lispo­nense, Lisbonense, Lisbona, até chegar a Lisboa.

Em Roma os pais de família tinham o poder de vida e morte sobre seus parentes. Eram sempre os mais velhos da tribo. Um dia resolveram implantar um local para debater os problemas da comunidade. Velho então era conhecido como “senex”. A sede dos debates foi batizada como “senado”, vocábulo que até hoje designa o legislativo federal brasileiro.

Antigamente, no Brasil, as Câmaras Municipais, então muito poderosas, chamavam “Senados Municipais”. Hoje tudo mudou.

Na época do paganismo, um imperador determinou a construção de uma ponte ligando a cidade de Roma com o seu subúrbio. Os imperado­res pagãos passaram a ser conhecidos como “pontífices”, nome herdado pelos cristãos. Hoje o Papa é um pontífice porque constrói pontes entre os homens e Deus.

Entre os deuses gregos, dois deles, Taumas e Electra, tiveram uma filha que se chamou Iris, que, como Hermes, tinha a incumbência de levar mensagens para Zeus, o maior de todos. Iris então passou a indicar os caminhos tão complicados como perfeitos. Os caminhos indicados por Iris até hoje são conhecidos como “arco-íris”.

Com toda a certeza as palavras documentam o caminho das histó­rias. No passado, fiz o curso de piloto de avião. Os nossos aviões só en­tendiam as ordens emitidas em francês. Estávamos na metade do século XX. Hoje os aviões somente obedecem a ordens emitidas em inglês. A substituição da linguagem indica que as palavras marcam o rumo trilha­do pelos nossos dias. Ou melhor, trilhado pelos nossos tempos.

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