Vários países assistiram ao longo dos últimos 30 anos o crescimento vertiginoso de empresas na Ásia, seja em solo chinês, seja em solo de outras nações asiáticas, seja em países ditos tigres asiáticos (Hong Kong, Coréia do Sul, Cingapura e Taiwan); empresas baseadas num baixíssimo custo de mão de obra. Custo esse forjado em condições de trabalho que remuneram com baixíssimos salários, com quase nenhum direito, com jornadas de trabalho extensas e condições de saúde e segurança do trabalho absurdamente diferentes dos padrões europeus, norte-americanos e até mesmo dos ainda baixos padrões sul-americanos.
Muitas empresas enxergando essa disparidade de custo de mão de obra trataram de transferir suas plantas para esses países (China, Vietnã, Filipinas, Camboja, Tailândia etc.) e aproveitarem dessa vantagem competitiva.
Isso levou a destruição de muitas indústrias em todo o mundo, pois na produção de muitos bens a mão de obra pode ser determinante para o custo final do produto.
Como a lógica do preço baixo é forte e a qualidade dos produtos vindos da Ásia foi melhorando, muitos produtos hoje acabam sendo produzidos em quase sua totalidade lá.
A pandemia evidenciou um setor, no caso de produtos médicos, que deixou vários países sem acesso a eles, uma vez que a China demandou a maior parte dos estoques e a demanda mundial cresceu e a oferta não está atendendo a este crescimento decorrente da pandemia do novo coronavírus.
Sejam produtos de baixa necessidade de tecnologia ou complexidade de produção como máscaras, protetores de calçados, toucas, jalecos descartáveis, enfim equipamentos de proteção individual (EPIs); além de produtos um pouco mais sofisticados como respiradores mecânicos e insumos para os testes de diagnóstico da covid-19; tudo isso hoje é quase 100% fornecido pela China.
Num momento como esse fica claro que essa lógica baseada meramente num custo, que é óbvio que compara ambientes de trabalho diferentes, pode gerar uma situação como a que vivemos hoje.
Fabricar alguns desses produtos em solo nacional, não é difícil, em qualquer país e até no Brasil, mas competir em custo comparando uma mão de obra com direitos sociais com outras recém saídas da escravidão, não dá.
Alguns países asiáticos tem jornada de trabalho que passam de mais 10 horas diárias, sem descanso semanal e sem férias!
É pedagógico ver esse contraste, assistindo o filme Indústria Americana (American Factory). Ganhador do Oscar 2020 de melhor documentário é uma produção de Barack e Michelle Obama. Assista, não vou dar spoiler!
Caros, essa pandemia vai forçar os países a repensar suas políticas industriais e o que é estratégico.
O mundo fechou os olhos a esse disparate de custo de mão de obra por que muitas indústrias mundiais montaram suas plantas nesses países. Lucraram com isso.
Mas será que coisas que são possíveis de serem fabricadas no próprio país e são estratégicas podem ficar nas mãos de outros?
Será que não é o caso de exigir os mesmos direitos trabalhistas mínimos para ter um custo de mão de obra semelhante? Deixar a diferença ser feita realmente pela eficiência e não pela exploração da mão de obra de outro país?
Certamente esse debate virá e é importante não nos deixarmos levar por essa balela de menor custo, sem saber o que compõe esse custo!