A minha caminhada matinal de hoje, no condomínio onde moro, foi particularmente agradável, devido ao perfume exalado pelas murtas, com suas elegantes flores brancas enfeitando a ponta dos ramos verdes. Há muitas arvoretas dessa espécie, ladeando os muros e os caminhos, promovendo um ambiente onírico para quem busca se exercitar logo cedo, quando o sol ainda é suave e uma temperatura amena não demonstra o calor que virá. O perfume surge de repente, enche o ambiente e transporta o caminhante para paisagens distantes, sedutoras, misteriosas, convidando para sonhar acordado.
Desde seu surgimento na Terra, as plantas vem evoluindo sua capacidade de reprodução e o perfume é forma de atração de insetos polinizadores, que visitando-as, intercambiam, entre elas, o pólen fecundador. O perfume vem de um óleo nelas produzido, volátil e de rápida duração, porém suficiente para atrair os bichinhos.
A murta, da família das myrtaceas, tem sua origem na Europa e África e, com certeza, foi trazida pelos portugueses que nos colonizaram. É muito utilizada em nossos jardins, principalmente como cerca viva, embora, bem trabalhada, possa se transformar numa arvoreta ornamental.
Parente das laranjas, limões, tangerinas, quase foi erradicada de nossa região, quando, em 2004, descobriram-se as primeiras infestações do greening em nossos laranjais. A murta não causa doença nos seus primos cítricos, mas, pode hospedar o psilídeo que transmite o greening. Várias cidades montaram planos para a sua erradicação. Porém, venenos que combatem o psilídeo e corte dos pés cítricos afetados, acabaram convencendo as autoridades de que bastava afastar as murtas da proximidade dos pomares, para que a doença fosse controlada, decisão que permitiu a continuidade do perfume que encantou minha caminhada.
Todo perfume forte e exótico desperta em nós curiosidade para a planta. Sempre pensei que a murta fosse usada somente para decoração. Afinal, desde os tempos gregos, os heróis eram coroados com seus ramos e as noivas enfeitavam seus cabelos com guirlandas de suas flores. Os judeus usavam seus galhos para cobrir suas tendas durante a Festa dos Tabernáculos
Curioso, fui pesquisar e descobri que a murta é planta medicinal, usada no Oriente para problemas renais, respiratórios e infecção na gengiva. Suas folhas e flores são usadas nas saladas ou como tempero de carne e peixe, aos quais fornece um sabor picante. De suas flores faz-se um chá parecido com o da laranjeira e a Água de Anjo, usada como produto de beleza.
Confesso que não pretendo fazer estes usos, mas, não abro mão da alegria em sentir o perfume que, ousado, impregna a manhã. E de ver as inúmeras abelhas e pequenos insetos, que ficam buscando o pólen fundamental, participando da enorme roda da reprodução dos vegetais. Na folhagem verde intensa, não fosse o perfume, talvez nós não percebêssemos as pequenas flores brancas, com suas pétalas que se vão enrolando, para deixar bem expostos seus órgãos reprodutivos.
Há quanto tempo o perfume das murtas encanta os humanos?