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A lição de um liberal

A lição de um mestre sempre serve a qualquer espírito, esteja ele no limite da descrença ou já na catacumba do desespero. No caso, fala-se do mestre do direito, da política, da literatura, um liberal que se formou e viveu equidistante dos radicalismos ideológicos, e que ocupa lugar de destaque na história política, social e cultural do Brasil.

Ei-lo. Afonso Arinos de Melo Franco (BH-1905, RJ-1900), figura proeminente, que pertenceu a UDN – União Democrática Nacio­nal, deputado federal (1947/1958) e Senador (1958), Ministro das Relações Exteriores de Jânio Quadros, professor de direito, jurista, historiador, ensaísta, homem público, orador impecável, cultura humanista densa. Membro da Academia Brasileira de Letras (1958). Autor da lei contra a discriminação racial de 1951. Inaugurou a Política Externa Independente do Brasil.

Afonso Arinos, olhar atento à crise de 1963/64 com seus artigos e ensaios (in Evolução da Crise Brasileira, 2ª ed. TopbooKs, 2005), registra a tensão ideológica e política que retirava a objetividade de qualquer discussão sobre qualquer problema da realidade econômi­ca, social e financeira do país, para ficar, nas beiradas dos gritos, dos slogans e das acusações, sendo que atualmente existe a novidade de palavrões, que indicam o voo baixíssimo que saiu do arroto popular, indignado, da ultima eleição presidencial.

Para aquela crise de 1963/1964, como para essa, o estágio a ser conquistado é o da restauração moral do governo. Essa é, para ele, a condição da estabilidade das instituições e das leis, não significando com isso que se possa confundir com esse moralismo hipócrita que invadiu o ambiente do país. Governo moralizado é o que tem credi­bilidade e, portanto, garante-se na governabilidade.

Mas é Afonso Arinos que previne – “… o processo de moralização pública deve ser inerente ao movimento de estabilidade política e de reformas de base. E deve ser inerente não apenas por motivos éticos, mas porque, indiscutivelmente, qualquer esforço para os dois outros objetivos (estabilidade e reformas de base) será fatalmente frustrado se não for integrado e concomitante com o de moralização”.

A moralidade governamental de que se fala é a construção da credibilidade, que passa necessariamente pela “coexistência inter­na”, e para o qual os radicalismos devem ser apartados, e todas as forças partidárias e políticas possam fazer o diagnostico correto e apresentar cada resposta para cada problema nacional. Para em seguida “tentarmos o remédio, ou seja, a reunião do povo em torno de objetivos realmente nacionais”. Hoje, é essa a posição trabalhista com Ciro Gomes.

Ele – Arinos reconhece que o governo Goulart tinha um plano de desenvolvimento nacional, que precisava ser implementado, quando o governo atual não tem nenhum, aliás nem se fala hoje em interesse nacional, o que era comum no discurso governamental da época.

Na verdade, ele está esquecido desde a primeira hora, quando o presidente bateu continência para bandeira estrangeira, revelando a que veio.

O gesto simbólico demonstra o compromisso fundamental com a pátria de sua devoção, ou demonstra que a pátria preferida é a outra.

E a continência é ato exclusivo de militar.

Sem a restauração moral do governo, sem a estabilidade criada pelas forças política divergentes que construam conjuntamente um pacto de ressurreição do país, numa prática de “coexistência interna”, as empresas continuarão fechando, o desemprego aumentando, e economia só afundando, camuflada agora pela crise sanitária.

Para onde vamos? Com certeza só se sabe que no dia 1º de abril de 1964, a democracia no Brasil foi golpeada, instalando-se a dita­dura, mesmo existindo plano de desenvolvimento nacional e mesmo com a maioria da população aprovando o governo.

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