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A indústria da fraude não descansa

Adalberto Luque

O comerciante de produtos de uma grande rede mundial de celulares e equipamentos para informática havia acabado de fechar mais uma venda. Um notebook no valor de R$ 13 mil. Um casal de namorados chegou à sua loja, na zona Sul de Ribei­rão Preto. Conversaram com o vendedor, pedindo muitas in­formações sobre o produto.

Na hora de pagar, o cartão do rapaz foi recusado, por con­ta do limite. A namorada não hesitou e passou a compra em seu cartão pessoal. Tudo cer­to e aprovado, foram embora felizes, levando um notebook com tecnologia de ponta.

Tempos depois, chega a mensagem da operadora da máquina do cartão: a compra havia sido contestada. “A dona do cartão disse que não tinha comprado nada naquele valor na nossa loja. Falei com o re­presentante da empresa respon­sável pela máquina de cartão e ele me disse que a contestação da compra tanto na modalida­de online, quanto na máquina está virando um meio de vida. Resultado: tivemos que provar que a venda foi feita. Felizmen­te tínhamos muitas imagens do casal em nossas câmeras de segurança e o cartão não tinha problema. Depois é que sou­bemos que o casal rompeu o relacionamento uns dias após a compra e a moça não queria pagar a dívida do ex. Mas aca­bou tendo de arcar, porque a compra estava no cartão dela, mas a nota estava com a docu­mentação correta dele. Conse­guimos provar que fizemos a venda, mas levou uns seis me­ses”, lamenta o comerciante.

Ele é um dos milhares que acabam tendo aborrecimen­tos por conta da criatividade e oportunismo de fraudadores. Hoje as vendas digitais correm riscos tanto para o lado dos compradores, que podem ter os dados clonados, quanto por parte dos vendedores.

Compra seguida de arrependimento sem devolução do produto
virou meio de vida para muitos

R$ 5,8 bilhões
Durante 2022, o Brasil re­gistrou 5,6 milhões de tentati­vas de fraudes no período de 1º de janeiro a 31 de dezembro, de acordo com o Mapa da Fraude da ClearSale, empresa especia­lista em soluções de prevenção e gerenciamento de risco.

O estudo exclusivo anali­sou 312,2 milhões de pedidos realizados no e-commerce bra­sileiro, feitos via pagamento por cartão de crédito, que to­talizaram R$ 5,8 bilhões em ações fraudulentas. Em com­paração com o ano passado, as tentativas de fraude apresenta­ram uma queda de 0,3%, mas os valores ainda foram 4,8% maiores do que em 2021.

Para o diretor presidente da ClearSale, Eduardo Mônaco, os números apontam um cres­cimento controlado na quanti­dade de tentativas de fraudes, em razão da desaceleração do comércio eletrônico.

“Como era esperado, o ano de 2022 foi marcado por um crescimento moderado do e-commerce brasileiro e pelas incertezas financeiras do con­sumidor para 2023. Tais fato­res contribuíram para a queda diante dos anos anteriores, po­rém, o período ainda apresen­tou altos números de golpes, e os consumidores e varejistas precisam ficar atentos”, explica.

Ainda de acordo com o exe­cutivo, “o número de fraudado­res no e-commerce é equivalente à quantidade de consumidores que migram para o varejo digi­tal todos os dias, tendo em vista que os golpistas procuram vigiar os comportamentos destas pes­soas para enganá-las. Algumas das principais ferramentas utili­zadas são a fragilidade emocio­nal dos consumidores, que aca­bam sendo atraídos pelas falsas narrativas criadas e a exclusão digital, fortemente presente no Brasil. É imprescindível que as instituições possuam medidas firmes para combater este cri­me”, reforça.

Mais homens
De acordo com estudo feito pela ClearSale, o público mas­culino é o que mais sofre com tentativas de fraudes, atin­gindo 3,1% das negociações envolvendo homens. A faixa etária mais visada pelos frau­dadores são pessoas com até 25 anos, seguidos por pessoas acima de 51 anos.

Entre as datas comemora­tivas, o campeão de tentativas ou registros de fraudes é o Dia das Mães, seguido pelo Dia do Consumidor e Dia dos Na­morados. Segundo Mônaco, a Black Friday não é tão atrativa, pois possui foco em grandes promoções, o que não faz dife­rença para os fraudadores.

Mônaco: consumidores e varejistas precisam ficar atentos – CLEARSALE/DIVULGAÇÃO

Fraudes mais comuns
A empresa classificou três tipos como as fraudes mais uti­lizadas pelos fraudadores.

A mais comum é a “Fraude Efetiva”, também chamada de “Fraude Limpa”. Neste caso, o fraudador efetua a compra na loja virtual e na hora do paga­mento utiliza dados roubados de cartões de crédito de bons consumidores. Por serem da­dos verdadeiros, muitas equi­pes de combate a fraudes sen­tem dificuldade em barrar este tipo de golpe.

Tem ainda a “Fraude Ami­gável”, modalidade que ocorre quando alguém próximo ao titular do cartão, geralmente parentes ou amigos, faz uma compra sem o consentimento dele. Ao receber sua fatura, o dono do cartão não reconhece a compra e entra em contato com a instituição financeira para pedir o estorno.

E não menos comum é a “Auto Fraude”. Diferente dos demais tipos de fraudes, esta é uma ação realizada pelo pró­prio titular do cartão. Neste caso, ele realiza a compra on­line e, contesta o lançamento dentro do prazo da instituição financeira, alegando que não fez a compra, mesmo já tendo recebido o produto.

Link de pagamento
O supervisor de vendas de uma empresa que opera ma­quinetas de cartões que atua na região de Ribeirão Preto e pediu para não ser identi­ficado, lembra ainda que al­guns comerciantes perderam muito dinheiro com o link de pagamento.

“É um dos golpes que as quadrilhas usam muito. Cria uma venda online. Cria um link e o cliente paga sem os dados do cartão, à distância, sem passar pela máquina. Depois ele cancela essa ope­ração. Contestando que não foi ele. Como é venda sem senha, é passível de contesta­ção. Estão de olho”, revela.

Ele adianta que as grandes empresas que operam as ma­quinetas já não permitem mais a criação do link de pagamento nos casos em que o pagamento é imediato.

“Só com 14 dias, por conta da contestação. Tem empresas que não atuam com vendas virtuais, mas acabam queren­do oferecer essa facilidade. É uma venda onde não se insere senha. O comprador recebe o link, onde digita seus dados criptografados. Pode usar da­dos de terceiros ou seus pró­prios, contestando a compra. Depois é o vendedor quem vai ter que ir atrás para provar que fez a venda, emitiu nota fis­cal, efetuou a entrega. É muito aborrecimento”, alerta.

Comerciantes não devem atualizar programas da maquineta a menos que seja feito por funcionários devidamente credenciados pela empresa que opera as negociações

Atualização de software
Outro golpe que tem sido comum é a atualização do sof­tware. Neste caso, comerciante e comprador acabam lesados. Um suposto funcionário da maquineta de cartão entra em contato dizendo que é pre­ciso atualizar o software da máquina para evitar fraudes. Ele manda um link e, quando o comerciante acessa, instala um programa que direciona o crédito das vendas feitas para o fraudador. Além disso, a ma­quineta copia todos os dados do cartão do comprador e en­via para o fraudador, que passa a ter dados para efetuar outras compras online.

Geralmente a fraude só é percebida quando não apare­cem os créditos. Dependendo do comerciante, isso pode le­var algumas semanas, causan­do um prejuízo enorme no seu faturamento e expondo dados de diversos clientes.

Cuidados para evitar golpes
Confira as principais dicas:
– Cuidado ao deixar a máquina sobre o balcão, à vista de todos;
– Na venda online, fazer um cadastro do seu cliente com cópia do documento e comprovante de endereço;
– Desconfiar de vendas fora da realidade dele;
– Estar com uma empresa de adquirência (empresa que intermedia os pagamentos realizados com cartões de crédito e débito) que seja homologada pelo BC;
– Não faça atualização. Procure sempre um canal oficial com a empresa que opera sua maquineta.

ILUSTRACAO SERASA

A ClearSale, que elaborou o mapa da fraude, também tem suas dicas:
– Use senhas fortes. Não utilize senhas óbvias e que sejam de fácil conexão com você ou a pessoas próximas, como iniciais e data de nascimento. Opte por códigos fortes com a mistura de letras maiúsculas, minúsculas, símbolos e números. E lembre-se: para garantir ainda mais segurança, jamais utilize a mesma senha para mais de uma conta;

– Tenha cuidado com links estranhos. Algumas quadrilhas especializadas criam sites falsos, idênticos aos verdadeiros, para roubar dados. Posteriormente, com essas informações, os criminosos conseguem efetivar suas fraudes. Portanto, atente-se aos pedidos de recadastramento, trocas de senha não programadas ou links suspeitos;

– Desconfie de promoções absurdas. O Phishing é um tipo de ação fraudulenta comum no ambiente online. Geralmente, o criminoso envia aos usuários e-mails com ofertas imperdíveis ou exclusivas, no entanto, são mensagens contendo links para a captura de senhas. Verifique a página oficial da loja e pesquise a reputação da empresa em questão.

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