Eventos de vida têm sido foco central na psiquiatria desde a época em que eles foram incorporados numa escala conhecida como Escala de Avaliação do Reajustamento Social. O conceito permanece popular por causa da possibilidade de mensurar precisamente a exposição a eventos ambientais estressantes que permeiam o cotidiano de nossas interações pessoais. Uma suposição central, usualmente implícita, na maioria dos eventos de vida, é sua ocorrência ser aleatória, ou seja, um grande número desses eventos decorrerem da má sorte.
Todavia, várias linhas de pesquisa evidenciam que o modelo aleatório dos eventos de vida está incorreto. O que alegam? Primeiro, que o número de eventos de vida, registrado pelos indivíduos, ao longo de diferentes períodos, são altamente correlacionados. Ademais, alguns indivíduos experienciam mais momentos estressantes que outros. Segundo, que o número de eventos de vida pode ser predito por algumas características de personalidade do tipo classe social, autoestima, suporte social e temperamento. Terceiro, que pesquisa sobre eventos específicos, do tipo acidente de trânsito, por exemplo, e lesões industriais e vitimização criminal têm mostrado consistentes diferenças individuais na pré-disposição a eventos estressantes que, por sua vez, relacionam-se a atributos pessoais, tais como, personalidade, estilo de vida, condição psicopatológica e consumo de álcool e drogas.
Devido a robusta influência dos fatores familiares nos traços comportamentais humanos é de interesse examinar, de uma perspectiva epidemiológico-genética, as causas dos eventos de vida estressantes. Com esse propósito, um estudo buscou examinar o papel dos fatores genéticos e ambientais nas origens desses eventos usando, para tanto, um questionário que pedia às pessoas para descreverem e estimarem eventos estressantes de vida, ocorridos no último ano. Exemplos destes foram acidentes automobilísticos com o pai, morte ou doença de pessoas íntimas e próximas, dificuldades de relacionamento entre cônjuges, crianças, pais, irmãos e outros parentes próximos ou distantes do indivíduo. Também foram incluídos itens relacionados ao trabalho e nas relações maritais. Um total de 2.,315 pares de gêmeos, incluindo 890 gêmeos monozigóticos e 1425 gêmeos dizigóticos, responderam os 44 itens distribuídos nesse questionário.
Os eventos de vida foram moderada, e significativamente, correlacionados nos pares de gêmeos, sendo as correlações dos gêmeos monozigóticos consistentemente maiores que aquelas para os gêmeos dizigóticos. Considerando todos os eventos estressantes, um modelo genético envolvendo análise dos gêmeos indicou que fatores genéticos e ambientais-familiares explicam, cada um, cerca de 20% da variância total. Eventos de vida individuais podem ser melhor divididos em rede de eventos, isto é, afetando diretamente os indivíduos no seu ambiente social, onde a semelhança entre gêmeos deve-se somente ao ambiente familiar, e eventos pessoais, diretamente afetando a resposta onde muito da semelhança entre gêmeos foi resultante de fatores genéticos.
Fica claro com este estudo que nem os genes, nem o ambiente familiar são prováveis de afetar diretamente os eventos de vida, pois fatores sociais e pessoais que predispõem aos eventos de vida são substancialmente influenciados pela genética individual e pelos antecedentes familiares. Tomados em conjunto, estudos nesse domínio sugerem que os eventos de vida refletem muito mais do que influências aleatórias, podendo ter a influencia genética um valor tão alto quanto 40% da variança total dos escores dos eventos de vida. Como consequência, isto tem implicações para nosso entendimento da relação entre eventos de vida estressantes e psicopatologia.