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A herdabilidade dos comportamentos humanos complexos (10)

Análises genéticas ajudam-nos a repensar algumas de nossas suposições básicas sobre como o mundo ao redor modela o que somos e o que não somos. O melhor exemplo é o tópi­co “natureza da criação”, muito discutido na grande área da genética do comportamento por fornecer novo entendimento sobre como o ambiente “é” e “funciona”. Quando pensamos sobre a criação, as imagens que nos vem imediatamente à mente são de pais cuidando de seus filhos, evidenciando seu amamentar, o treinamento de controle dos seus esfíncteres e a resolução de seus deveres de casa. De fato, desde Freud, milhares de estudos da Ciência do Comportamen­to têm investigado variados aspectos da parentalidade, incluindo afetividade e disciplina como influências ambientais no desenvolvimento das crianças.

A parentalidade e os eventos de vida, estressantes ou não, são arquétipos das medidas do ambiente que têm sido usados em milhares de estudos psicológicos. Essas medidas são, então, correlacionadas com traços biológicos para investigar a influência do ambiente. Por exemplo, o quanto os pais leem para suas crianças é correlacionado a quão bem as crianças aprendem a ler nas escolas. Conviver com maus colegas é correlacionado com condutas inadequadas, como, por exemplo, usar drogas na adolescência. Já o fracasso nos relacionamentos, e outros eventos de vida estressante, são correlacionados com depressão e outras desordens psicológicas.

Assim considerando, parece razoável assumir que essas correlações entre medidas ambien­tais e desfechos psicológicos são causados ambientalmente. Todavia, raramente se concebe que genética pode ser um fator que contribui para as correlações entre fatores ambientais e os traços psicológicos a eles associados. Isto é o que geneticistas do comportamento significam por “natureza da criação”. Exemplo típico desta ultima envolve o que os psicólogos chamam de eventos de vida estressantes.

É obvio que, ao longo da trajetória da vida temos altos e baixos, sucessos e fracassos, en­volvendo rompimento de relacionamentos, dificuldades financeiras, problemas no trabalho, doenças e lesões por roubo ou assalto. É claro também que as pessoas diferem em como elas respondem a esses eventos de vida. Estudos envolvendo gêmeos idênticos surpreendente­mente revelaram que os mesmos foram duas vezes mais similares que os gêmeos fraternos em suas correlações sobre as medidas dos eventos de vida: isto é 0,30 e 0,15, respectivamente. O mesmo padrão de resultado emergiu para os gêmeos que tinham sido criados separadamente em diferentes famílias. Essas correlações entre gêmeos sugerem que as diferenças herdadas de DNA explicam aproximadamente 30% das diferenças entre as pessoas. Interessante é que eventos de vida têm sido genuinamente concebidos como determinados ambientalmente na origem, mas uma terceira fonte dessa variância é genética na origem.

Por sua vez, divórcio é um exemplo de evento objetivo e dos mais estressantes para grande parcela de pessoas. O primeiro estudo genético acerca do divórcio causou furor. Num estudo envolvendo 1500 pares de gêmeos adultos, a concordância para o divórcio foi muito maior para gêmeos idênticos do que para gêmeos fraternos, a saber, 55% versus 16%, respectivamen­te, sugerindo substancial efeito genético sobre o divórcio.

Influências genéticas também ocorrem no tempo que as crianças despendem assistindo te­levisão. Num estudo, envolvendo delineamento genético, foram investigadas crianças adotadas e não-adotadas, nas idades de 3, 4 e 5 anos. As correlações para os irmãos não-adotados, que compartilhavam tanto os genes quanto o ambiente familiar para os três grupos etários, foram de aproximadamente 0,50, indicando que irmãos não-adotados assistiam quantidades simi­lares de programas televisivos. Surpreendentemente, as correlações para os irmãos adotados foram consistentemente metade do valor das correlações para os irmãos não-adotados. O porquê disso? Pelo fato de os irmãos adotados não serem geneticamente relacionados, esses resultados sugerem que as diferenças genéticas explicam aproximadamente metade das dife­renças entre crianças no quanto tempo que elas assistem televisão.

Tomados em conjunto, inúmeros estudos que olharam medidas ambientais em estudos geneticamente sensitivos indicaram uma substancial influência genética nessas medidas, quaisquer que sejam elas, com uma herdabilidade média ≥ que 25%. O futuro desses estudos? Provavelmente será a análise do código genético dos nossos traços comportamentais complexos.

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