A guerra entre a Rússia e Ucrânia tomou conta da mídia brasileira e mundial, que elegeu o ditador russo como o demônio, e colocou um nazista como herói mundial. Toda guerra produz atrocidades e revela a crueldade humana, pois a crueldade no ser humano é inata, só precisa de um ambiente propício para se revelar. O clima de indignação com o sofrimento do povo ucraniano causado pela guerra toma conta do cotidiano brasileiro, no entanto não há uma reação contundente contra as guerras urbanas, que diariamente eliminam principalmente os jovens negros das periferias pobres, mas como isso já faz parte do ambiente urbano, nem é notado – faz parte do cenário.
Uma sociedade alicerçada no escravagismo, não permite que o conhecimento seja para todos, e em cima desta premissa construíram uma educação marcada pela segregação, principalmente a educação básica. O tempo passou, e a segregação na educação básica se perpetuou. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, lançado em 1932 espelhado no movimento europeu e estadunidense, que propunha um ensino público, onde os educandos eram protagonistas, foi abduzido pela velha oligarquia aliada à Igreja Católica, que tratou de combater com virulência este movimento, e até hoje o Brasil não conseguiu ter uma educação básica pública de qualidade para todos.
O Brasil vive o eterno dilema de ter as melhores leis educacionais, e de não conseguir colocá-las em prática. A Constituição cidadã, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são leis que se fossem respeitadas seríamos um país evoluído. No entanto a história da educação básica nos mostra que mesmo tendo os melhores teóricos da educação mundial, ainda amargamos o analfabetismo, e a exclusão dos filhos das periferias pobres de terem o direito a uma educação pública de qualidade como manda a lei.
A mentira e o sofisma são os carros chefes da política educacional no Brasil, demostrando que não temos uma crise econômica, e sim uma crise ética. Há um costume vezo no Brasil, construído por gente pernóstica que diz: “tem lei que pega, e lei que não pega” usam deste subterfúgio para justificar o crime que cometem não cumprindo as leis, e na educação isso é uma festa. De tempos em tempos são apresentados pelos governantes de plantão projetos alienígenas que nada têm a ver com a nossa realidade, no entanto pagam caro por eles – afinal dinheiro não é o problema.
O retrocesso social e de costumes protagonizado pela extrema direita religiosa tomou conta de boa parte do mundo, e produziu seus efeitos por aqui também. O sofisma e a falsidade ideológica fizeram parte de uma propaganda maciça, onde o centro era o de combate à corrupção, e que boa parte da imprensa brasileira ajudou a proliferar e a materializar. O dramaturgo alemão Bertolt Brecht definiu bem o uso da mentira: “Aquele que não conhece a verdade é um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso”, e neste diapasão de falsidade uma enxurrada de criminosos foi eleita pela população incauta, e essa gente desqualificada está dilapidando com ferocidade o erário.
Aquela esperança de ver a educação básica pública ser tratada como prioridade nacional vai se desfazendo nas mãos destes criminosos. A educação básica pública é o alicerce para o enriquecimento cultural, e pode mudar o patamar do País acabando com a desigualdade social. Como disse o grande Paulo Freire: “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda”. A violência urbana no Brasil está matando os jovens das periferias pobres, de maioria negra – isso é uma guerra declarada.
Devemos nos indignar com as mortes ocorridas em outras guerras, no entanto não reagimos com a mesma indignação com as mortes dos jovens das periferias pobres por falta de uma política pública. A guerra está aqui!