Edwaldo Arantes *
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Nestes dias de festas carnavalescas, onde impera o reinado de Momo, desfiles, fantasias, blocos e encontros.
Na atual etapa da vida, fico distante dos momentos saudosos vividos nas minhas Minas Gerais, principalmente em São Sebastião do Paraíso e seu inesquecível Carnaval de Rua.
Hoje, permaneço na calmaria dos livros, vinhos e reminiscências, desligo a televisão, vagando entre a sala e a sacada.
Decido abrir antigos álbuns, com fotografias, desbotadas pelo tempo que tudo corrói.
Sinto o cheiro do papel antigo, abro e começo a folhear, nas primeiras páginas vislumbro um passado distante e perdido, com batizados, casamentos, aniversários, o caminho natural do existir.
Continuo a virar as folhas, toda uma história começa a brotar, impressionante e assustador como os anos conseguem passar em uma rapidez de saltar aos olhos, fazendo menção a uma cena do genial cineasta espanhol, Carlos Saura, em “Mamãe faz 100 anos”.
A fotografia realmente é a ” arte de escrever a luz, no instante exato de um minuto, que nunca se repetirá no espaço/tempo” . O momento em silêncio, os motivos, as razões são absolutamente nossas. A imaginação e a lembrança apenas pertencem aos nossos segredos e instantes, não a quem clicou, pois na minha época, ainda bem, não existiam celulares quanto mais “Selfies”, todos portavam a velha Kodak.
O momento eterniza e resguarda, segredos, sorrisos, semblantes, acobertados e marcados pelo instante da pose, no registro absolutamente estático, pode ser um captar da vida ou da morte, sem um movimento sequer.
Continuo a passar as páginas, uma, depois outra e outras tantas quanto os dedos e as mãos deslizando tecendo leves carinhos, como se o mover e o toque pudesse afagar um tempo.
Cada folha que passa parece um caminhar na trajetória e história, a Primeira Comunhão, a escola estampada com o dia, mês, ano e série cursada, a valsa com minha mãe na colação de grau e tantos momentos vividos, Natais, carnavais, bailes, a primeira mesa com cervejas depois das calças curtas.
O tempo galopa como um alazão, passando como um raio a cada folha, lembro-me de João Guimarães Rosa, ” a vida embrulha tudo”, penso que a infância, adolescência, maturidade e velhice, embrulham tudo.
Quase ao final me vejo com a Marina, minha filhota em todas as formas de viver, carregando ao colo, abraço aos quinze anos, depois o sorriso feliz ao seu lado, com sua formosura de mulher.
A fotografia realmente é “a arte de escrever a luz, no instante exato de um minuto, que nunca se repetirá no espaço/tempo”. É o registro, o momento em silêncio, a cena estática, que leva até a eternidade, sem movimentos.
Quase ao fim da história e dos registros da existência, descubro emocionado e faço menção ao romance do brilhante escritor chileno e Nobel, Pablo Neruda, em “Confesso que Vivi”, afirmando: “a vida foi feita de todas as vidas do poeta”.
Nas derradeiras fotos, vislumbro a atualidade do meu ser, registro meus encontros com tantos e queridos amigos, alguns permanecem apenas nas cenas capitadas, partiram para um outro prisma, apenas posso vê-los agora, depositados, sobre meu colo, em um arquivo, que se fecha para sempre.
Sobrou apenas uma foto, onde retiro com cuidado e no seu verso está escrito em letras garrafais; FIM.
* Agente cultural