José Eugenio Kaça *
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Já estamos na metade da terceira década do século 21, e as demandas da educação básica pública estão longe de serem resolvidas. Desde 1961, quando a primeira lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) foi sancionada, e do primeiro Plano Nacional de Educação aprovado em 1962, que estamos esperando que suas diretrizes sejam cumpridas. O tempo passou e as diretrizes foram sendo minimizadas. Em 1971 uma nova versão foi sancionada, em pleno regime militar, em 1996 uma versão mais democrática do documento foi sancionada, mas em 2017 algumas modificações foram introduzidas para tirar da educação básica a pouca autonomia que os educandos haviam conquistado. Depreciam ao máximo a educação básica pública, para abrir o caminho da privatização.
A cidadania é a base de qualquer democracia, mas não se pode atingir a plena cidadania, sem uma educação básica pública de excelência, que consiga abarcar toda a população, esse é o ideário da verdadeira democracia. Mas no Brasil, um país com fortes raízes escravocratas, a cidadania não é plena. A “elite” branca, que está no poder a mais de quinhentos anos, nunca permitiu que o povo brasileiro pudesse ter uma educação básica com alto padrão de qualidade para todos, preferiu segmentar a cidadania, produzindo uma segregação baseada na condição social e na cor da pele. No Brasil, a exclusão social é um caso de sucesso, e para perpetuar este sucesso usam a analfabetização dos descamisados como um projeto para a exclusão.
A educação básica pública sempre esteve no centro das discussões, que tinham como objetivo a construção de uma Nação. No passado a qualidade da escola básica pública era exaltada, mas não era para o bico da grande massa trabalhadora, que via seus filhos abandonarem o ensino primário nos primeiros anos – bastava saber ler algumas palavras, e fazer as quatro operações matemáticas, e já estavam prontos para ir trabalhar, pois precisavam ajudar na renda familiar. O tempo passou, e a modernidade trouxe novos desafios para o País, e neste contexto a educação básica como direito de todos ganhou evidência.
A escola do século 20 tinha um formato fabril, com todas as suas peculiaridades, e neste ambiente a cidadania não era debatida, o que valia era a disciplina rígida. Todas estas indas e vindas que a educação básica pública foi submetida, não criou como sonhou o grande educador Paulo Freire, um sujeito autônomo, que ao estudar um texto reinventa, recria e reescreve, apenas aceita a vontade do opressor, e a escola do século 21 não conseguiu ainda se livrar dos modelos ultrapassados do século 20. Saímos de uma educação repressora e violenta, onde castigos físicos e psicológicos eram corriqueiros. Havia uma ferramenta medieval chamada palmatória, que deixava as mãos dos alunos inchadas. Com a Promulgação do Estatuto da Infância e do Adolescente (ECA), que afirma que as crianças e adolescente são sujeitos que gozam de todos os direitos inerentes a pessoa humana, o caminho complicou – e a partir dai caminhamos do oito para o oitenta.
A escola básica pública é o alicerce da cidadania, acontece que não houve a transição da escola velha do século 20, para a escola acolhedora que educadores do século 21 propuseram. O mundo evoluiu tecnologicamente, e a meninada se apoderou desta tecnologia, acontece que a maioria dos professores permaneceram no século 20 – ai o choque foi inevitável. Uma reportagem publicada esta semana, mostra o desabafo de uma professora da rede pública de São Paulo. “Est[á um inferno dar aula para seu filho. Não dá para para negociar com 30 ou 40 crianças ao mesmo tempo. Precisa ter respeito ao próximo, de igualdade”. O não cumprimento das leis acaba gerando esta situação. O capítulo educação da nossa Constituição traz em seu escopo a solução para estes conflitos que acontecem no chão da escola pública. É só cumprir a lei!
* Pedagogo, líder comunitário e ex-conselheiro da Educação