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A Colômbia e sua Literatura (22): Soledad Acosta 

Rosemary Conceição dos Santos* 

 

De acordo com o jornal El País, este perfil faz parte da reportagem Esquecidas pela história na América, uma série especial que resgata as histórias de seis mulheres à frente de seu tempo que, apesar do pioneirismo, foram desvalorizadas pela sociedade na época em que viveram. Nele, afirma-se que, Soledade Acosta (1833-1913), nascida na capital colombiana, foi, aos 12 anos, morar no Canadá, de onde seguiu para Inglaterra, Peru e em Paris, onde esteve em três épocas diferentes. Ao voltar à Colômbia, se casou com o político e escritor José María Samper, com quem teve quatro filhas. “Apesar da mal-intencionada e falsa piada “Soledad nas costas de Samper”, para dizer que sua carreira e notoriedade se deviam ao seu marido, seu casamento desafiou as convenções da época. Do seu modo, ela constitui em sua obra e em sua vida um precedente de certas premissas igualitárias que, com o tempo, os movimentos feministas conquistariam”, diz a biografia que está em Recuerdos de Santafé (Lembranças de Santafé), editada por Antonio García Ángel, na coleção de circulação gratuita Libro al Viento (Livro ao Vento), da Prefeitura de Bogotá. 

Viajante contumaz, Soledad Acosta “Era uma mulher culta e cosmopolita, de classe privilegiada, que havia viajado pelo mundo e sabia vários idiomas”, conta a escritora Pilar Quintana em seu prólogo para uma próxima reedição de El Corazón de la Mujer (O Coração da Mulher). “Fundou cinco revistas, refletiu sobre o papel da mulher na sociedade, defendeu sua educação e trabalho intelectual e abriu o caminho às escritoras colombianas, em uma época em que se acreditava que as mulheres deviam se dedicar exclusivamente à família e aos trabalhos domésticos. Essas ideias liberais, precursoras do feminismo, conviviam nela com outras mais conservadoras e de tradição religiosa, já que era uma católica devota”, detalha a autora de La Perra (A Cachorra). Suas histórias, diz Quintana, “transcorrem em uma Colômbia convulsionada pela guerra, em fazendas, aldeias, cidades médias e em uma Bogotá ainda salpicada por elementos mais próprios do campo e da natureza”. 

Foi jornalista da primeira à última linha que escreveu ao longo de quase 60 anos, frisa Isabel Corpas de Posada, uma de suas biógrafas. Foi quando, em 1859, enviou de Paris ao jornal Biblioteca de Senhoritas seu primeiro texto com notícias da atualidade, e nos anos seguintes quando outros jornais de Bogotá e Lima publicaram suas ‘correspondências’, as crônicas jornalísticas da época. Também quando saíam seus romances por capítulos nos jornais de Bogotá, e seus textos, publicados em revistas colombianas e europeias, nos últimos anos do século XIX e nos primeiros do XX. Para a biógrafa, Soledad Acosta foi uma transgressora dos limites tradicionais entre o feminino e o masculino, que prendiam a mulher no espaço doméstico e a impediam de ter uma voz pública. 

Esta colombiana, segundo seus biógrafos, se atreveu a tomar a palavra. Sua pena veio com tudo. Com uma longa lista de pseudônimos que incluíram Bertilda, Andina e Aldebarán, escreveu dezenas de romances, contos, crônicas, estudos sociais, tratados de história e obras de teatro. Foi reconhecida por seus contemporâneos, mas, após sua morte em Bogotá, seu nome desapareceu por décadas. “Una Holandesa en América” (Uma Holandesa na América) é talvez seu romance mais importante, o que marca sua maturidade e um dos mais importantes da literatura hispano-americana do século XIX, diz Carolina Alzate, professora de literatura da Universidade de Los Andes. Suas protagonistas, a holandesa Lucía e sua amiga, a colombiana Mercedes (alter ego da autora), “são mulheres fortes que já não morrem de amor e que desenham seus próprios destinos”, afirma Alzate em seu prólogo. A obra, além disso, “entra no debate com a maneira que o romantismo imaginava as mulheres e o lugar que dava a elas somente como amadas”, diz a professora ao EL PAÍS. Em sua dezena de romances anteriores, Soledad Acosta “consegue explorar o que significa ser uma mulher que quer escrever e contribuir à construção de nação, que era o projeto de toda a sua geração, mas era eminentemente masculino”. 

Em sua meia-idade, Soledad Acosta de Samper obteve diversas distinções como membro honorário da Academia Colombiana de História. Continuou escrevendo e publicando até sua morte em 17 de março de 1913, prestes a completar 80 anos. Depois permaneceu esquecida durante a maior parte do século XX. Mesmo tendo muitos leitores em sua época, “foi silenciada, invisibilizada, ignorada, por ser mulher”, conta a biógrafa Corpas de Posada. Os leitores especializados não a incluíram nas antologias. “Essa geração de mulheres não soube ler a si mesma, não soube entender-se, e quando morreram foi quase como se não houvessem existido até que a partir dos anos oitenta as feministas souberam como lê-las, e graças a elas chegamos a essas autoras”, acrescenta a professora Alzate. Essa redescoberta ganhou impulso quando o Ministério da Cultura declarou 2013 como “Ano Soledad Acosta de Samper”, pelo centenário de sua morte. Também foi colocada em andamento uma biblioteca digital que tem hoje 620 títulos. Mas ainda está longe de ser reconhecida como os autores homens de sua época que tiveram uma trajetória equiparável à sua. 

Professora Universitária* 

 

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