Tribuna Ribeirão
Polícia

À ‘caça’ de tiroteios sem sair de casa

Por Marcio Dolzan

Quando não está trabalhando em uma plataforma de petróleo em alto-mar, Benito Quintanilha, de 40 anos, passa até 14 horas imerso em informes sobre a violência do Rio, recebidos de uma rede de informantes. Ele é um dos quatro responsáveis pelo aplicativo Onde Tem Tiroteio (OTT-RJ), que faz alertas, quase em tempo real, sobre os pontos na região metropolitana onde há troca de tiros ou incêndio de ônibus. E a mensagem é direta: evitem a área.

Os alertas são enviados via redes sociais diretamente pelo aplicativo, que pode ser baixado em telefones celulares. Segundo dados dos responsáveis pelo projeto, mais de 4,5 milhões de pessoas chegam a receber as mensagens nos dias de pico. O serviço, gratuito, funciona todos os dias da semana, de forma ininterrupta. Os responsáveis se revezam em um esquema de plantão e trabalham com uma rede de informantes para checar os alertas.

“A ideia surgiu em 2015 quando vi pela televisão a morte de uma pessoa no Complexo do Alemão. Aí pensei: por que não criar um meio de ajudar as pessoas a se locomover no Rio?”, conta Quintanilha. “O Rio é uma das poucas cidades do mundo em que você tem tiroteio quase todo dia; a cada duas horas há um confronto armado.”

O Estado acompanhou algumas horas de um dos plantões de Quintanilha. Ele mora em um condomínio fechado no populoso bairro de Campo Grande, na zona oeste do Rio. O conjunto de casas é tranquilo e silencioso. É quase uma ilha em uma das áreas que registram um dos maiores índices de violência da capital fluminense.

“Criei uma página no Facebook e, num primeiro momento, eu só alertava as pessoas do meu feed. Depois, chamei três amigos para ajudar e nós criamos um corpo, padronizamos, fizemos um aplicativo que se tornou o que é hoje”, diz.

Além de Quintanilha, o projeto conta com a participação de Dennis Coli, que tem uma empresa de desenvolvimento de software; Marcos Vinícius Baptista, professor de Física; e Henrique Caamaño, consultor de logística. Ou seja, nenhum deles tem formação ou atua na área de segurança pública. “O sociólogo e o especialista em segurança têm boas intenções, mas é na teoria. Na prática, a dinâmica é outra. Morei numa área de risco, em Cavalcanti (bairro pobre da zona norte). Sei como funciona”, diz o criador do projeto.

Em um plantão, Quintanilha afirma receber cerca de 70 mensagens por dia acusando tiroteios em diferentes pontos da região metropolitana. Em geral, menos de 20 se confirmam por meio da checagem.

Para o trabalho de filtragem, o grupo criou uma rede, formada por milhares de pessoas espalhadas nas mais diversas regiões da cidade – os chamados “núcleos”. Ao receber um alerta de tiroteio na Cidade de Deus, por exemplo, os responsáveis entram em contato via WhatsApp ou aplicativo por rádio para confirmar o fato com colaboradores que moram na região. Assim que recebem a confirmação, eles enviam o alerta: evitem a região.

Estatísticas. O OTT-RJ também resulta em estatísticas. Como o levantamento divulgado na semana passada que apontou que, de 1.º de janeiro até as 13 horas de 23 de fevereiro deste ano, foram registrados 795 tiroteios no Rio. São quase 15 confrontos armados por dia.

O grupo não tem nenhum tipo de apoio financeiro. Ao contrário, os quatro já gastaram cerca de R$ 10 mil com registro de marca, desenvolvimento de software e manutenção de domínio. “A recompensa é ajudar o outro. Temos muito feedback de gente que diz que desviou a rota e evitou tiroteio por causa do aplicativo”, afirma.

Questionado se não tem medo de virar alvo de bandidos, ele demonstra tranquilidade. “Trabalhamos com alertas, não com denúncias.”

Consolidado no Rio, o OTT começa a operar em São Paulo. O grupo criou uma página no Facebook (OTTSP) e deve iniciar o envio de alertas até o fim do ano. “Estamos formando os grupos de WhatsApp em São Paulo. Vamos atender primeiro a capital e, depois, expandir”, diz Quintanilha. “Queremos é formar até o fim do ano uma rede com 500 mil pessoas e, até o final de 2019, na faixa de 4 milhões.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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