Por: Adalberto Luque
Madrugada de 2 de junho de 2024. Ruan César Godói, de 22 anos, chega a um estacionamento na avenida Jerônimo Gonçalves, Centro de Ribeirão Preto. Tinha acabado de trabalhar como assistente de um grupo musical, que havia se apresentado em espaço cultural da região.
Pouco antes, houve uma briga no estacionamento. Um manobrista do estacionamento se desentendeu com dois clientes supostamente e entraram em luta corporal. Depois os dois clientes foram embora.
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Voltaram 20 minutos depois. Por uma triste coincidência, o manobrista e Ruan usavam roupas parecidas. O homem que havia lutado com o manobrista desce de uma moto e caminha na direção de Ruan. Dispara contra ele e foge.
O jovem cai, atingido por um disparo na cabeça. Foi levado para o Hospital das Clínicas – Unidade de Emergência e teve morte cerebral dois dias depois.
Enquanto o corpo de Ruan estava sendo velado, o autor do disparo foi preso. Em um mês, os dois envolvidos estavam atrás das grades e o caso havia sido esclarecido. A certeza é que Ruan estava no lugar errado, na hora errada, com a roupa errada e morreu por engano.
Queda histórica
A agilidade no esclarecimento da autoria e na prisão dos envolvidos é um dos fatores que vem contribuindo para a queda no número de homicídios em Ribeirão Preto. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP), a cidade registrou 33 vítimas de homicídio em 2024.
Uma vítima a menos que no ano anterior e mantendo a tendência de queda. Desde 2021, quando foram registradas 56 mortes por homicídio, vem havendo redução. Foram 52 em 2022 e 34 em 2023.
É o menor número da série histórica. A SSP divulga os dados estatísticos de criminalidade desde 2001 e, justamente em seu primeiro ano, foi registrado o recorde de homicídios: 181 pessoas morreram, uma a cada dois dias daquele ano.
E antes de 2023 e 2024, somente em 2008 o número de homicídios ficou abaixo de 40, quando ocorreram 39 casos. Nos demais, oscilou entre 45 e 60 homicídios por ano. Somente nos dois primeiros anos da série histórica, 2001 e 2002 é que ficou acima de 3 dígitos: 181 e 162, respectivamente.
Execução
Noite de domingo, 4 de fevereiro de 2024. A publicitária Dayane Isabel Roncari, de 33 anos, conversava com uma amiga na calçada de uma casa, na rua Alberto de Oliveira, Jardim Maria Goretti, zona Oeste de Ribeirão Preto.
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Dois homens chegam em um carro preto, encapuzados. Ao se aproximarem, gritaram “polícia” e começaram a disparar. A perícia contou pelo menos 30 cápsulas de calibre 9mm.
A vítima foi morta com tiros na cabeça, braços, pernas, peito e seios. Morreu antes que pudesse ser socorrida. Os atiradores fugiram em seguida. A amiga de Dayane nada sofreu.
Dayane já havia sido presa em 2018, ao se envolver em no atropelamento de um casal em uma motocicleta Honda Biz, na Avenida Luiz Galvão César, Parque das Andorinhas, zona Oeste da cidade. Aguardou a chegada da Polícia Militar e teria dito que foi um acidente.
Porém, testemunhas disseram que ela atropelou a mulher que seguia com o condutor da moto duas vezes. Ester Lisboa Ribeiro Santos, de 18 anos, morreu na hora. A moto e o capacete usado pela vítima fatal eram de Dayane. O condutor era Wendell Souza de Almeida, ex-namorado da mulher que atropelou os dois.
Testemunhas disseram que ela teria brigado com o condutor, mesmo muito ferido e caído no asfalto. Wendel foi levado para o hospital em estado gravíssimo. Ele acabou sobrevivendo. Apesar da alegação da defesa de que foi um acidente, Dayane ficou por seis meses até conseguir um habeas corpus e responder em liberdade.
Em 16 de junho de 2021, o ex-namorado Wendell, já recuperado do acidente, foi executado a tiros. O rapaz, de 29 anos, estava na calçada em frente sua casa, na Rua Artur Fracadosso, Parque das Figueiras, zona Norte de Ribeirão Preto. Conversava com dois amigos.
No dia 17 de março de 2022, Carlos Augusto Roncari, de 27 anos, irmão de Dayane, foi morto a tiros. O rapaz seguia pela Rodovia Antônio Duarte Nogueira (SP-322), o Anel Viário Sul quando, próximo à Avenida Patriarca, foi morto a tiros.
A polícia não descarta que possa haver ligação entre os casos. Nenhum deles foi totalmente esclarecido até hoje.
Região mais violenta
O bairro onde Dayane foi executada pertence ao 6º Distrito Policial (DP). A região atendida pela delegacia foi a mais violenta em 2024, em relação a todos os oito DPs da cidade.
Foram nove homicídios em 2024 e sete em 2023. Antes na liderança do ranking com 10 casos, a área atendida pelo 5º DP, no Ipiranga e zona parte da Norte, teve uma redução expressiva: 50% menos homicídios. Foram cinco em 2024, o que deixou o DP na quarta posição, atrás do 2º DP (Campos Elíseos) com sete e 3º DP (Vila Tibério) com seis.
Demais crimes contra a vida
Se os homicídios na cidade tiveram uma leve queda em 2024, o mesmo não se pode dizer dos casos de tentativa de homicídio. A cidade registrou alta de 13,2% em 2024. Foram 60 tentativas, contra 53 no ano anterior.
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Os latrocínios (roubo seguido de morte) também aumentaram de três em 2023, para quatro em 2024. Um deles foi o do policial militar aposentado, Dariê Alves Tremura, de 63 anos. Ele e seu enteado Rafael Bernardes de Farias, de 36 anos, recolhiam um malote em um posto de recarga de cartões do transporte coletivo, na Rua Tibiriçá, quase esquina com Rua Américo Brasiliense, Centro de Ribeirão Preto.
Três assaltantes se aproximaram e trocaram tiros com os dois. Dariê morreu pouco depois, quando era atendido em um hospital. Rafael se recuperou. Um dos assaltantes foi ferido, fugiu e acabou preso no dia 12 de dezembro no estado do Paraná, 10 meses depois do crime.
Estupros
Fechando as estatísticas de crimes contra a vida, os casos de estupro de vulnerável tiveram redução de 13,3%. Retrocedeu de 135 em 2023 para 117 em 2024. Os estupros de mulheres não vulneráveis, todavia, aumentaram de 57 ocorrências em 2023 para 60 em 2024.
No total dos dois tipos de estupro, a cidade teve queda de 7,8%. Em 2024 foram 15 casos a menos que em 2023. Ainda assim, um número preocupante.
Homicídios e estupro com quedas. Tentativas de homicídio e latrocínio com altas. Indicadores relativamente estáveis ou, mesmo em redução, não apaga a dor de quem perdeu alguém morto por outra pessoa. Nem que quem foi vítima de violência sexual ou doméstica. São cicatrizes que não desaparecem.
Crimes contra a vida são prioridades
A SSP informou que dois dos quatro crimes relatados já foram esclarecidos. “A 3ª Delegacia de Investigações sobre Homicídios da Divisão Especializada de Investigações Criminais (DEIC) de Ribeirão Preto informa que os crimes ocorridos em fevereiro [Tremura] e junho [Ruan] do ano passado foram rapidamente elucidados, resultando na identificação e prisão dos autores. As diligências para a sua localização seguem em andamento. Em relação aos demais casos, as equipes seguem empenhadas na análise de todas as hipóteses e na verificação de informações que possam levar ao completo esclarecimento dos fatos.”
A Secretaria acrescentou que o combate aos crimes contra a vida é uma das prioridades da atual gestão. “Deste modo, a SSP monitora continuamente os indicadores para o desenvolvimento de políticas públicas de enfrentamento e reorientação do policiamento nas ruas”, aponta.
A SSP acrescenta que tem investido no fortalecimento das instituições para garantir respostas cada vez mais rápidas e eficazes à população. “Em 2024, o Estado registrou os menores números de casos (2.485) e vítimas (2.594) de homicídios dolosos em 24 anos, alcançando a menor taxa desde 2001, enquanto no interior as ocorrências de mortes intencionais recuaram 3,3%”, conclui.
Quem matou o empresário do Porsche?
Luiz Cláudio Mazzuca Filho, empresário de 35 anos, foi executado na noite de 29 de setembro de 2022. Quase dois anos e meio depois, o crime continua sem esclarecimentos.
Dono de bares e revendas de automóveis de luxo, Mazzuca Filho havia acabado de sair de uma academia de ginástica no Jardim Nova Aliança Sul, zona Sul de Ribeirão Preto. Estava com a namorada e entrava em seu carro, um Porsche avaliado em mais de R$ 1 milhão.
Um carro para atrás e descem dois homens, que efetuam diversos disparos. O empresário foi atingido por sete tiros disparados por uma pistola 9 mm e um fuzil 5.56 e morreu na hora.
Várias hipóteses foram levantadas: envolvimento do crime organizado, de traficantes, de desafetos. Mas nada ficou comprovado e autoria e motivação do crime permanecem desconhecidos.