Tribuna Ribeirão
Cultura

Brasileiro de dois mil anos

A reconstrução digital da face de um homem que viveu em terras cariocas há cerca de dois mil anos foi apresen­tada nesta quinta-feira, 22 de março, por pesquisadores do Setor de Antropologia Biológi­ca do Museu Nacional (UFRJ) e da Faculdade São Leopoldo Mandic, no Rio de Janeiro. “O projeto contribui para que haja um contato maior entre a po­pulação atual brasileira com os habitantes que viviam há dois mil anos atrás em terras cario­cas”, conta Paulo Miamoto.

Ele é professor das Disci­plinas de Odontologia Legal e Anatomia da Faculdade São Leopoldo Mandic e responsá­vel pela parte tecnológica da reconstrução facial. O traba­lho foi realizado a partir de um esqueleto em bom estado de preservação encontrado por arqueólogos do Museu Nacio­nal, na década de 1980, em escavações no sítio Sambaqui do Zé Espinho, localizado na região de Guaratiba, Zona Oes­te da cidade do Rio de Janeiro.

Além da aproximação fa­cial foi realizado um estudo osteobiográfico detalhando al­guns aspectos sobre quem era e como viveu este indivíduo. Tal es­tudo consiste na reconstrução das características como sexo, idade e estatura, assim como obter algu­mas informações sobre doenças e atividades físicas. O estudo ana­tômico do crânio permite estimar a posição e aspecto das estruturas da face, como os músculos, olhos e nariz. A técnica de aproximação fa­cial consiste em basear-se nestas informações para que seja produ­zida uma imagem compatível com a aparência em vida do indivíduo.

“Para reproduzirmos o ros­to foi feita uma réplica virtual do crânio a partir de fotografias com câmera digital. As imagens fo­ram processadas obtendo o crânio 3D. Estruturas anatômicas foram modeladas virtualmente e por fim recobertas com uma camada de pele que se adapta sobre o conjun­to, respeitando a interação entre as partes ósseas e moles. O pro­cesso termina com o acabamento, que adiciona detalhes à face, como marcas de expressão, cabelos e iluminação”, explica Miamoto, da Faculdade São Leopoldo Mandic.

Não há nenhuma relação direta entre o indivíduo escavado no sí­tio Zé Espinho e a Luzia. Ambos os remanescentes esqueléticos estão associados à ocupação an­terior a chegada dos Portugueses no Brasil e fazem parte do acervo do Museu Nacional. A Luzia foi encontrada na região de Lagoa Santa, Minas Gerais, e teria vi­vido por volta de onze mil anos atrás. Já o indivíduo do Zé Espi­nho, além de ter vivido na região da cidade do Rio de Janeiro, a datação que temos dele seria por volta de dois mil anos antes do presente, ou seja, ele viveu alguns milhares de anos depois da Luzia, em uma região diferente.

Batizado de Ernesto de Guaratiba, o nome é uma ho­menagem à localidade do sítio arqueológico e a Ernesto Salles Cunha, docente de Odontologia da Universidade Federal Flumi­nense que dedicou grande parte de seus estudos a paleopatologia dos sítios de sambaqui do litoral brasileiro. A nomeação foi decidi­da em uma votação aberta com alunos matriculados no curso de Fundamentos de Aproxima­ção Facial, promovido pelo Pro­grama de Pós-Graduação em Arqueologia do Museu Nacional.

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