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Conceitos psicológicos na análise de obras de arte (1)

Na criação da obra de arte, especialistas entendem que o autor ultrapassa aspectos superficiais e aparentes da vida cotidiana, alcançados através de perspectiva histórica e sociológica, em busca do que, expresso acerca da condição psicológica humana, continue válido em situações muito diversas. Neste contexto, contribuições significativas da psicologia contemporânea, tais como, a descrição do comportamento e da experiência interior do indivíduo como atividade espontânea, a continuidade entre os diferentes graus de solução de problemas e de capacidade criadora e a tentativa de interpretar a vida inconsciente através de forças dinâmicas são recursos relevantes para esta buscar explicar a criação e a permanência da obra literária.

Todavia, a aplicação de conceitos psicológicos numa análise de obra de arte deve orientar-se pelas possibilidades de explicações que estes apresentem para tal tarefa, ou seja, pela aplicabilidade desses conceitos como recursos ao entendimento do pensamento produtivo, sem que se esqueçam suas limitações. Considerando a relação organismo-ambiente, a relação vida afetiva e vida intelectual e a relação dos processos inconscientes, especialistas ponderam conceitos fundamentais da teoria de Freud, Jung e dos gestaltistas, respectivamente, para esclarecer em que medida esses conceitos são úteis para a descrição de processos de pensamento produtivo e/ou análise de texto e de leitores.

Em Freud, definindo “libido” como vida mental caracterizada pela busca do prazer, do amor (Eros) e afastamento da dor e da morte (Tânatos), bem como, “Id” como a arte mais profunda e primitiva da personalidade e “Ego” como a parte da personalidade em contato com a realidade, Leite indica estes conceitos como referenciais dos quais se podem partir focalizações para análises literárias entre organismos e ambientes. Neste caso, a permanência de sentimentos ou acontecimentos infantis na vida mental e comportamental do adulto, assim como, a evolução de conflitos emocionais e afetivos em continuidade histórica, com repressão dos instintos proporcional a intensificação neurótica, são aspectos relevantes para abordagem de histórias individuais e histórias culturais, respectivamente.

De modo similar à teoria freudiana, tais manifestações, na literatura, também são apenas “formas diferentes de conflitos iguais”, numa civilização em que a “neurose”, muitas vezes, é a forma alternativa para expressão de conflitos criadores, os quais, se barrados, enviesam-se por anormalidades e conflitos de expressão. Edgar Allan Poe, por exemplo, adotado, juntamente com os irmãos, por prósperos negociantes em Baltimore, ao manifestar interesse pelo pensamento produtivo em detrimento da lucratividade de negócios, angariou o desgosto do pai adotivo, que o queria um continuador da prosperidade familiar, crescendo com o sentimento de que era rejeitado como escritor, o que, não poucas vezes, influenciou diretamente sua obsessão pela temática do sofrimento causado pela morte.

Por sua vez, estudo que analisa o que é fato e o que é fantasia na sanidade de Poe, pontua desordens psicológicas, biológicas e socioculturais humanas, como ansiedade, somatização e dissociação, entre outras, que, encontráveis em todas as culturas, e nos mais diversos tempos, ainda que não assim nomeadas, permitem ao leitor observar serem capazes de uma repressão cada vez maior dos instintos, conhecida de antropólogos e sociólogos nos estudos de processos civilizatórios de ajustamentos.

Entretanto, o fato de a teoria freudiana repousar na interdependência entre vida afetiva ou emocional e vida racional, característica contraditória à crença contemporânea, que supõe continuidade entre ambas, bem como, de racionalizar os problemas apresentados pelo homem em seu ambiente para mostrar a origem emocional e conflituosa dos processos do pensamento humano, desmascara e destrói as ilusões humanas, sejam elas religiosas, sentimentais ou artísticas, fato este que a limita na análise do pensamento criador. No contexto dessa teoria, o conceito de “inconsciente”, ligado dinâmica e continuamente à consciência numa relação causa-efeito, e a tentativa freudiana de traduzi-lo para termos inteligíveis, foi considerado uma das contribuições mais significativas que a psicologia concedeu à literatura, principalmente para aqueles que, à semelhança dos românticos alemães, preocupavam-se com “os aspectos noturnos e doentios da personalidade humana”.

Entretanto, à medida que sua comprovação experimental foi aproximando-se de critérios cada vez mais científicos de verificação, e tornando-se mais aceita pelos cientistas, sua tendência de identificar os mesmos conflitos em todas as obras de arte tornou-a reducionista e menos aceita por escritores e críticos de arte.

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