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Bar, doce bar

Nas viagens que fiz ao Rio de Janeiro com minha primeira-dama, fomos pelo Sesc e ficamos hospedados no hotel da própria instituição. Está localizado numa área privilegiada de Copacabana, a uma quadra da famosíssima Avenida Atlântica, que beira a mais famosa praia do mundo. Sou apaixonado por aquele pedaço de Brasil, e após os passeios culturais organizados por eles, aproveitava para conhecer os bares que povoam a área – e olha que são muitos.

Ali está o famoso “Beco das garrafas”, um bar da época da Bossa Nova, hoje revitalizado. Era um tempo em que os músicos, que depois ganharam projeção nacional, tocavam por quase nada de grana. O “Beco das Garrafas” ganhou este nome porque casais saíam do bar eufóricos e exageravam nas carícias, daí os moradores dos prédios, incomodados com o barulho, mandavam ver garrafas lá de cima.

Perto do Sesc Copacabana mora um casal amigo que amamos muito, ela é de Ribeirão Preto e ele, do Rio. Todas as vezes em que estivemos lá, eles nos levaram até os bares. Na última visita, fomos para a Lapa, zona boemia, cheia de bares e conhecemos o “Carioca da Gema”, bar onde se canta e toca o samba raiz. Adorei.

Em janeiro último, eles estavam de férias e vieram pra Ribeirão Preto. Saímos com outros amigos e, papo vai, papo vem, começamos a falar de um bar que fica em Copacabana, numa rua transversal à Avenida Atlântica, já perto do Forte. É o “Bar Bip-Bip”, considerado o menor do Rio de Janeiro, mas todo artista que se preza tem que picar cartão ali. Com orgulho, o dono, um português de nome Alfredo, fala dos nomes que já deram canja ali.

O “Bip-Bip” tem uma característica toda sua: a casa não tem garçom, não tem belisco, só cerveja que você mesmo pega, marca e paga ao sair. Alfredo garante que nunca levou o “cano”. Outra coisa, os instrumentos (violões e cavaquinhos) são acústicos. Pandeiro? Só se o pandeirista for educado e tocar baixinho. Tamborim é tocado com os dedos. Não tem microfones. Palmas? É proibido bater palmas por causa do barulho. Para elogiar os artistas, só estalando os dedos. Tudo isso porque ele quer viver bem com seus vizinhos, afinal, está ali faz muitos anos.

Como no “Bip-Bip” tudo é apertado, o banheiro não foge à regra. Passando por lá precisei usá-lo e foi jogo duro, é menor que banheiro de avião, mas funciona (heheheeh). Ganhei do sambista carioca Moacyr Luz um livro de como sobreviver nos botequins do Rio de Janeiro. Pois bem, Moacyr Luz, numa entrevista ao Jô Soares, disse que certo dia no “Bip-Bip”, entrou um jovem casal, o bar estava vazio, passou pelo Alfredo que estava sentado numa mesinha na porta e se acomodaram no meio do boteco, esperando pelo garçom que não vinha.

O tempo foi passando, passando, e o Alfredo, que nunca foi um sujeito bem humorado, ficou lá, na dele, até que o rapaz perguntou educadamente: “Moço, aqui não tem garçom?” Alfredo disse: “Não, não tem não, o que você quer?” E o jovem: “Cerveja”. “Então pegue lá no freezer”, respondeu Alfredo. “E quem recebe (a conta)?”, indagou o rapaz. Alfredo, já com o humor alterado, disse: “Você nem bebeu e já quer pagar? Pague pra mim depois tudo que você consumir…”

“Eu também que queria algo para beliscar”, disse o jovem, “tipo queijo em cubos ou salame”. Alfredo disse: “Não tem beliscos, se quiser só temos salgadinhos em saquinhos e estão aí perto de você, pendurados, escolha o que quiser, pegue e marque”. O rapaz achou tudo muito estranho, mas adorou a situação, até então inédita para ele. Moacyr Luz disse que o jovem casal desfrutou o máximo do pequeno bar, saindo de lá íntimo do português Alfredo.

Adoro bate-papo de bar, estou meio fora de forma atualmente, mas ainda não joguei a toalha. De vez em quando dou minhas escapadelas, principalmente quando os amigos Berimbau, Peruca do Pandeiro e Bacon agitam uma roda de samba, com saideiras sem fim. Tudo isso me lembrou o samba que compus com Sócrates, “Bar, doce bar”.
Sexta conto mais.

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