A primeira edição do Festival Ribeirão Estado da Dança (Fred) estreou nesta sexta-feira, 8 de dezembro, e vai até domingo em vários espaços da região central da cidade. O evento tem como principal objetivo revelar a importância da dança, contemplando tanto modalidades clássicas como as novidades contemporâneas. A programação é gratuita e uma das atrações é o espetáculo “Kuarup”, com o Ballet Stagium, coreografia lançada há 40 anos, em 1977.
A renomada companhia estará às 17 horas deste sábado, dia 9, no calçadão da praça XV de Novembro, no coração de Ribeirão Preto. Em julho de 1977, “Kuarup” estreava no mesmo Teatro Municipal de São Paulo. Na época, o Ballet Stagium, fundado e dirigido por Márika Gidali e Décio Otero, fez um programa na forma de um jornal, em papel craft, tendo na capa os cinco primeiros parágrafos do “Manifesto Antropófago”, de Oswald de Andrade, de 1928.
Também trazia um pequeno texto de Décio Otero, dedicando “Kuarup”: “Para você, que nasceu aqui, que mora aqui, que gosta daqui”. Na parte interna, dizia que se tratava de um primeiro passo em um novo caminho “de um despojamento a ser continuado”. Tudo começou quando Décio ouviu a música do Xingu, três anos antes, e espantou-se com a sua complexidade. Deixou maturar por um tempo, e daí surgiu “Kuarup”, a sua 23° obra.
O estilista Clodovil Hernandes (1937-2009), convidado para refazer o figurino de outro balé, “Prelúdios”, ao saber do projeto de “Kuarup”, fez questão de colaborar. Para ele, parecia um “acidente parapsicológico”, pois, assim como outros que fizeram parte da equipe de produção (Cláudio Tapeceiro e Equipe Gráfica), também estava interessado na questão dos índios.
Os macacões que desenhou para os 16 bailarinos, com as cores da bandeira brasileira, propunham uma associação entre trabalhadores e índios, ligando as violências que atingiam a ambos – e a força dessa associação, que levou multidões aos teatros, parece atravessar os tempos, atando aquele Brasil que vivia na ditadura ao Brasil de hoje, cujos jornais continuam a estampar, 40 anos depois, violações e ações de extermínio a tribos indígenas na Amazônia e no Jaraguá, em São Paulo, para citar somente dois exemplos muito recentes.
“Kuarup” tem coreografia de Décio Otero e direção artística de Márika Gidali, e já foi dançado cerca de 400 vezes, por diferentes gerações de bailarinos. “Foi graças a uma parceria com a Secretaria Municipal de Cultura que conseguimos fazer essa remontagem porque, estranhamente, o projeto de celebração dos 40 anos de ‘Kuarup’ que enviamos para o ProAC (Programa de Ação Cultural), que incluía apresentações nas escolas, foi recusado”, contou Márika Gidali à Agência Estado, em julho.
Sobre a remontagem, destaca a experiência de trabalhar com bailarinos muito jovens. “É bem diferente ensaiar gente com 17 anos, que tem outros valores e vem do mundo dos festivais. Partimos da forma, levamos cada um a se jogar para dentro de si para construir o contexto, para depois, em cena, devolver o que brotou.” E Décio complementa: “É impressionante como atualmente os bailarinos pegam a coreografia tão facilmente, mas, para chegar à proposta do coreógrafo, ah… isso gasta um tempo bem maior. No caso de ‘Kuarup’, foi um caminho trabalhoso para perceberem porque se trata de uma obra clássica, digamos assim, da dança brasileira”.
Com curadoria de Cássia Navas, o Fred conta com apresentações, workshops e mesa redonda, tendo sempre a dança e os rumos do segmento como foco central. O festival ainda terá apresentações no Centro Cultural Palace (rua Duque de Caxias nº 322, Centro), no calçadão da praça XV de Novembro (Centro) e no Armazém Baixada (rua Duque de Caxias nº 141, Centro). O evento é uma realização do governo do Estado de São Paulo em parceria com a prefeitura de Ribeirão Preto.