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Bolas, boleiros e causos

Causos de boleiros são de uma preciosidade sem tamanho. Música e futebol sempre foram parceiros, e como transitei – e transito – no meio, vou armazenando e revisitando causos bem humorados que coloco no papel. Certa noite, assistindo ao programa “Cartão Verde” da nossa TV Cultura, o convidado da vez era Serginho Chulapa. Papo vai, papo vem, o nome de Sócrates foi mencionado e Vladir Lemos, âncora do programa, perguntou ao polêmico camisa nove como havia conhecido o Doutor, uma vez que eram grandes amigos.

Serginho disse que foi num jogo entre o Botafogo F.C. de Ribeirão Preto e São Paulo, no Morumbi. Sócrates já era o grande destaque do time e causava preocupação ao técnico adversário, que deu ordens para Serginho quebrá-lo logo de cara. O camisa nove foi protagonista de uma cena que deu o maior rebu no futebol paulista, aqui no Estádio Santa Cruz, quando jogava pelo Tricolor da capital. Por não concordar com marcação do “bandeirinha” das gerais, foi lá e deu-lhe um bico na canela, daqueles de ponta da chuteira que dói lá na alma.

O “bandeira” saiu manquitolando e Serginho foi expulso, recebendo rigorosa punição que o deixou fora da Copa do Mundo de 1978, na Argentina. Voltando ao técnico que lhe deu a ordem, Serginho, que adorava uma confusão, disse: “Deixa comigo, vou dar no meio dele e vou fazê-lo tremer na base.”

O São Paulo já estava em campo quando o Botafogo entrou, Serginho ficou só observando sua vítima. Assim que o time do Botafogo fez aquele tradicional gesto de cumprimentar o público, Sócrates se desvencilhou do grupo e foi em direção a Serginho, que ficou olhando aquele magrelo chegando perto. Sócrates, com toda a educação, lhe estendeu a mão e disse ser seu fã.

Os outros jornalistas esportivos que faziam parte do programa ficaram esperando Serginho continuar a história, e ele disse: “Como é que eu vou quebrar um cara educado como ele? No nosso primeiro contato ele foi um gentleman, O que fiz no momento foi o que meu coração mandou, dei-lhe um abraço tão apertado que até esqueci as ordens do chefe. Naquele momento nascia uma amizade tão linda que só eu sei o quanto me faz falta”.

Quem é muito grato ao Sócrates é o ponta direita revelado pelo Botafogo, Paulo Cesar Camassutti, o nosso PC. Ele conta que quem o levou para o Corinthians foi Sócrates. Quando chegou ao Parque São Jorge ficou meio perdidão, e Magrão lhe deu todo o apoio. Paulo Cesar, uma noite no Empório Brasília, lembrou que foi jogar com Rivelino – não me lembro do jogo –, só me lembro de que ele disse, de estar maravilhado, mal acreditava estar ali, ia jogar com seu ídolo.

O eterno camisa 10, o velho Riva já o conhecia e o chamou num canto e falou: “Garoto, sei que você tem muita velocidade, fique ligado em mim, quando a bola estiver comigo, saia correndo em diagonal que eu vou bater de três dedos e te deixarei na cara do gol.” PC diz que deitou e rolou nesse jogo.

Por falar em Sócrates, numa tarde eu estava com o cineasta Fernando Kaxassa no Empório Brasília, esperando pelo Magrão que nos apanharia para irmos a uma festa. Quando ele encostou o carro, notamos que as laterais do para-choque dianteiro estavam raspadas demais e tiramos um sarro dele, que de calcanhar devolveu pra mim porque Kaxassa não dirige: “Buenão: quero ver o seu carro quando você for morar em um prédio com garagem subterrânea e você chegar travado as quatro da manhã, duvido que seu para-choque se salva”. Não demorou muito e hoje meu carro tem a mesma avaria do dele.

Sexta conto mais.

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