Tribuna Ribeirão
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Um prêmio camuflado 

Mouzar Benedito * 
 
Sinto-me muito honrado, mas não sei se sou merecedor. Fiz na época que tinha condições pra fazer, muitos jornalistas fizeram também. 
 
Tive a “sorte” de ter amigos presos políticos, o que me permitiu fazer visitas a eles e produzir matérias para o jornal “Em Tempo” ou simplesmente encaminhar para publicação material que saía dos presídios, clandestinamente. 
 
Ou fazer algumas coisas que os presos pediam como contatar pessoas, advogados. 
 
O prêmio foi ao jornal, por esse material todo. E segundo o editor, Flávio Andrade, “Rezende Valadares Netto (RVN)” é que tinha ganhado o prêmio, mas esse era um pseudônimo meu. 
 
Se assinasse as matérias com o meu nome, ficaria impedido de entrar em qualquer presídio político, como aconteceu com meu amigo Mário Augusto Jakobskind, que fez uma entrevista com Doralice Fernandes, num presídio, e publicou no “Versus”. 
 
A partir daí não permitiram mais que visitasse presos. então, para que eu pudesse continuar visitando presos políticos e fazendo matérias com eles, ou retirando coisas que eles produziam, pedi aos editores do “Em Tempo” que inventassem um pseudônimo qualquer para mim. 
 
Partiram pra gozação: ele é de Nova Resende, disse meu amigo Otacílio. Todo mineiro é maneiroso como o Benedito Valadares, acrescentou alguém, acho que o Paeco. 
 
Daí, veio Rezende Valadares e para dar um “charme” colocaram o Netto, com dois tt. 
 
Enfim, é isso: nem imaginava ganhar prêmio nenhum por isso nem dinheiro, fazia por militância política, sem ganhar nada. 
 
E veio o glorioso prêmio Vladimir Herzog. Eu nem me lembrava mais, até que encontrei o Sergião no Sindicato dos Jornalistas, ele me perguntou se eu tinha ganhado o prêmio Vladimir Herzog e me lembrei desta história, mas não sabia se era no primeiro ou no segundo ano da premiação. Com sua generosidade de sempre, o “Sergião” me deu essa importância desmerecida. 
 
O Prêmio Vladimir Herzog do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, tem o sentido de homenagear quem é contra isso, mas também de alertar para que não aconteça de novo. 
 
Está difícil, nos tempos atuais, alertar e fazer refletir um pouco onde milhões de pessoas agem como idiotas obedecendo ordens de novos mussolinis – até com formação escolar que os deveria fazer saber pensar por conta própria. 
 
Mas continuamos tentando. Temos a utopia de um mundo bom para todos, com todos vivendo bem, em paz, sem violências, sem ódio. Sonhos de malucos? Se for, gosto de ser maluco. 
 
 
* Jornalista mineiro, geógrafo, escritor com vasta obra e agraciado com diversos prêmios destacando o “Vladimir Herzog” de Anistia e Direitos Humanos 

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