Edwaldo Arantes *
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Na minha terra e meu tempo existiam formas peculiares de comunicação e informação, atuando no curto, médio e longo alcance.
No curto, o locutor da rádio em seus avisos e recados, maçã do amor, alto-falante da quermesse, rádio amador, telégrafo e o berrante.
No médio, tambor, fumaça, pombo-correio, as cadeiras nas calçadas ao entardecer, as notícias chegavam a cada conviva, depois aos primos, tios, amigos, agregados e conhecidos.
No longo, cartões com letras bonitas de cartilha, cartas em envelopes perfumados, subir a pé a ladeira até a agência dos Correios, despertar do cochilo o sonolento servidor, passar a goma arábica com o pincel, o selo molhado pela língua, receber o carimbo redondo com tinta preta e o som de um baque seco.
No curto, curtíssimo e imediato tínhamos a Luzia, era só comentar, não dispensando aquela velha máxima que desconfio nasceu em Minas.
Olha lá hein! Não conte a ninguém.
E a Luzia olhando de soslaio, fazendo cara de surpresa e remexendo nos “trens”, explica:
-“Vixe”, credo. Não sou de falar nada, já me viu por aí com a língua solta? Minha boca é um túmulo.
Dito e feito, chegava na horinha, faria corar os criadores dos Whatsapps, Tweets, Facebooks, Instagrans, Podcasts e um, já ultrapassado, de nome e-mail, quase em desuso, a novidade, IA – Inteligência Artificial.
Sendo artificial, cheira-me, falso, postiço, pretensioso, presunçoso, ludibriador, enganando como flor sem perfume.
A serventia da Luzia não chegava apenas aos interessados, bem como aos lugarejos, vielas, currutelas, arraiais, povoados, aldeias, longínquos rincões ou “onde o Judas perdeu as botas”.
Nada escapava de sua resenha, narrava de tudo, furtos, bailes, quermesses, procissões, colações de grau, Réveillons, Semanas Santas, Páscoas, férias, sufrágios universais, alcovas, namoros, noivados, casamentos, separações, doenças, velórios, nascimentos, batizados, aniversários, crismas e bodas de todas as jóias e metais.
A sua competência era tamanha que os óbitos chegavam aos velórios antes dos defuntos, surpreendia o vigário ainda de pijama, o leiteiro sorrateiro flertando com a Dolores, a Sinhá atrás do terço e da cortina, a chaleira apitando na trempe, a viúva soluçando ao travesseiro e o lampião ainda fumegante ao amanhecer.
O seu nível de informação era tamanho e eficiente que hoje faria despencar o Google, decorava os nomes de todos os enfermos, doenças, além dos diagnósticos, terror dos freqüentadores da “Ponte dos Amores”, “alcunha da zona do meretrício, pois para chegar necessário era transpor uma “pinguela”, sabia de cor e salteado os que possuíam “papagaios” nos Bancos com seus devidos valores e vencimentos.
Enviava as mensagens, checava o recebimento de acordo com as bocas falantes, após a disseminação já estava nas chamas do fogão a lenha, com aquela carinha de “nada sei”, solerte e jovial, jamais em tempo algum deixou queimar o feijão.
Minha vida antiga desprovida de parafernálias virtuais e tecnológicas repleta de sonhos, descobertas, serenatas, jabuticabas, lambaris, lagos, cachoeiras e serras, tudo calmo, bom e perfeito, como meu nome escrito a giz, na lousa negra do “Gymnasium Paraisense”:
* Agente cultural