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Ainda estamos aqui! 

André Luiz da Silva *
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Quem valoriza a cultura e a democracia certamente celebra a vitória de Fernanda Torres, a primeira atriz brasileira a conquistar o Prêmio Globo de Ouro — uma das maiores honras do cinema e da televisão — por sua magnífica interpretação no filme “Ainda Estou Aqui”. 

Curiosamente, a premiação ocorre na mesma semana em que celebramos a resistência da democracia e o fracasso dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Aqueles lamentáveis eventos materializaram o sentimento de uma parcela significativa da sociedade brasileira que, por ignorância ou negação da realidade, exaltava a ditadura e clamava por um novo golpe, através de intervenção militar. 

O filme nos transporta a um passado recente e sombrio, trazendo à tona a perspectiva das vítimas da ditadura e iluminando os impactos daquele período na sociedade. É interessante observar que as salas de cinema, com bilheterias concorridas, revelam a presença maciça de jovens que não vivenciaram esse momento histórico. Para eles, o filme representa uma oportunidade de ampliar o conhecimento sobre um capítulo doloroso do Brasil. 

As artes — em especial a música, o teatro e o cinema — desempenham um papel fundamental nos regimes democráticos, o que talvez explique por que são frequentemente combatidas. Mais do que mero entretenimento, a arte provoca reflexão. Ao narrar a história da família Paiva, o filme, dirigido por Walter Salles, nos transporta para aquele período, permitindo que sintamos, por alguns instantes, as dores, medos e incertezas vividas pelas vítimas do regime ditatorial. Não foram apenas artistas e críticos que aplaudiram o filme; grande parte da população mundial reverenciou a história contada. 

Rubens Beyrodt Paiva, engenheiro civil e deputado federal, teve seu mandato cassado. Agentes da ditadura invadiram sua casa e o prenderam. Ele permaneceu desaparecido por 40 anos, até que se confirmou que teria morrido, entre 20 e 22 de janeiro de 1971, vítima de tortura. A luta de Eunice Paiva, que viu o marido ser levado enquanto protegia seus filhos, reflete a de muitas outras mulheres — mães, esposas e filhas que perderam familiares após serem torturados, seviciados e agredidos fisicamente e mentalmente. Muitos corpos jamais foram localizados. 

O paradoxal é ver, em pleno 2025, parlamentares e membros da sociedade civil clamando pela pretensa liberdade para disseminar calúnias, mentiras e fake news. Esses mesmos indivíduos, que defenderam a frustrada tentativa de golpe, ignoram que, durante a ditadura militar (1964-1985), o Brasil enfrentou restrições aos direitos políticos, perseguição a opositores, censura e repressão. Agora, pedem anistia para os golpistas, tentando minimizar a gravidade da invasão aos prédios dos três poderes e de uma trama que previa o assassinato do presidente eleito, do vice e de um ministro do Supremo Tribunal Federal. 

A anistia de 1979 permitiu o perdão aos perseguidos políticos, resultando na liberação de mais de 100 presos e no retorno de mais de 2 mil exilados. Contudo, essa mesma lei também anistiou torturadores e repressores, gerando uma sensação de impunidade que persiste até hoje, alimentando os radicais contemporâneos. 

Em 8 de janeiro deste ano, o governo federal promoveu diversos atos, incluindo a devolução ao patrimônio público das obras de arte danificadas, um “abraço pela democracia” e a criação do Prêmio Eunice Paiva de Defesa da Democracia, destinado a reconhecer personalidades que se destacaram na proteção do Estado Democrático de Direito. 

Ao celebrarmos a conquista histórica de Fernanda Torres e relembrarmos o segundo aniversário da tentativa frustrada de golpe, precisamos continuar vigilantes contra novas tentativas de ruptura. Todos aqueles que defendem a democracia se unem para proclamar, com força e esperança: Ainda estamos aqui! 

 

* Servidor municipal, advogado, escritor e radialista 

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