Tribuna Ribeirão
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Mensurando Psicologia (9): Medo 

José Aparecido Da Silva* 

 

Como descrevemos alhures, ansiedade refere-se a um estado psicológico em que a pessoa se sente desconfortável, e preocupada, devido às circunstâncias ambíguas, isto é, ansiedade se refere a sentimento gerais de desconforto e inquietude em relação a uma forma de ameaça ou perigo não especificada, difusa, incerta e freqüentemente sem forma. Devido à natureza ambígua do estímulo provocando ansiedade, a pessoa fica incerta sobre como agir; uma vez que a natureza e lugar da ameaça são obscuros. A resposta comportamental da pessoa para estímulos ambíguos pode ser desproporcional em relação à ameaça real. Ansiedade freqüentemente tem um pronunciado elemento social. Como seres sociais, muitas de nossas preocupações envolvem como os outros no vêem e nos criticam. 

Contrastando, medo refere-se a uma resposta comportamental e fisiológica adaptativamente intensa para a ocorrência de um estímulo específico identificado (por exemplo, um animal perigoso). O fato de o perigo ser real e endereçado, a pessoa se sente impelida a agir, com o medo sendo “uma chamada para a ação”: ficar paralisado, lutar ou fugir. Nos escritos sobre o assunto, a distinção parece muito clara. Mas, na prática, há uma considerável intersecção entre medo e ansiedade. Ambos compartilham um número de elementos altamente similares, incluindo reações cognitivas a uma ameaça ou perigo no ambiente, sentimentos de preocupação e apreensão, desconforto e tensão, fortes manifestações somáticas e reações do sistema nervoso, bem como, sensação de que algo ruim está para acontecer, com a urgência de fazermos algo sobre isso (escapar, atacar etc). 

Cumpre lembrar que medo e ansiedade também são creditados como sendo valores adaptativos do organismo. A seleção evolutiva dessas emoções levando o ser a identificar, perceber e agir adaptativamente a situações potencialmente perigosas no ambiente imediato. Por tudo isso, as implicações da ansiedade, afetando inúmeras ações do cotidiano, tornam imprescindível seu conhecimento nas ações do dia a dia. 

Dados recentes têm revelado que os três maiores eventos de saúde mental que têm grassado e afetado a população brasileira e, também, em outras nações do mundo, são a depressão, a ansiedade e o estresse, especialmente entre os jovens adultos. Há também inquéritos revelando que seis em cada dez jovens na faixa de 15 a 29 anos revelaram ter sentido ansiedade nos últimos 12 meses. As causas são variadas, mas alguns estudos destacaram o uso intenso dos smartphones, bem como as crises pandêmicas, econômicas, sociais, desastres naturais, etc. Medo de infecção e medo de ficar doente, no tempo da pandemia da Covid-19, foi persistente nas mentes das pessoas de quaisquer nacionalidades, em adição ao fluxo contínuo de noticias e informações relacionadas à COVID-19 por meio da mídia social, escrita e televisiva, com hipóteses supondo que o medo da infecção foi altamente associado com ansiedade e estresse e, em menor extensão, com depressão. Além do mais, depressão, ansiedade e estresse também têm sido associados com comportamentos de saúde negativos, tais como, o fumar, o abuso de substâncias, a inatividade física e a ideação suicida. 

Neste contexto, inúmeros pesquisadores têm mensurado, através de escalas apropriadas, o medo da população em ser contaminada pela Covid-19. Dentre as escalas utilizadas para tal, uma delas, a FCV-19S (Fear of COVID-19 Scale) foi traduzida em diferentes línguas, mostrando-se psicometricamente adequada em termos dos indicadores de validade e fidedignidade. Constituída de sete itens, com cinco categorias de resposta, variando entre 1=discorda fortemente a 5=concorda fortemente, traz como soma de seus escores uma pontuação total que varia de 7 a 35, onde o escore mais elevado expressa maior medo da Covid-19. Estudos investigaram realizaram a invariância, entre culturas, da mensuração da escala de medo da Covid-19 em sete países latino-americanos, a saber: Colômbia, Equador, El Salvador, México, Paraguai, Argentina e Uruguai. 

01Globalmente, os achados das principais comparações entre estas nações indicam que a escala de medo FCV-19S foi um instrumento auto-aplicado, válido e fidedigno para mensurar o medo da Covid-19 em grandes amostras deste grupo de sete países latino americanos. Os resultados sugerem que dois fatores relacionados, a saber, emocional e fisiológico, ajustam-se apropriadamente em todos os países latino-americanos estudados, suportando a hipóteses de que o medo da Covid-19 é um construto multidimensional. Em outras palavras, as análises específicas sobre a invariância da mensuração comprovam que as populações da Colômbia, Equador, El Salvador, México, Paraguai, Argentina e Uruguai conceituam o medo da Covid-19 na mesma estrutura bidimensional: dimensão emocional e dimensão fisiológica. 

 

Professor Visitante da UnB-DF* 

 

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