Tribuna Ribeirão
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Mensurando Psicologia (6): Felicidade 

José Aparecido Da Silva* 

As pessoas buscam a felicidade por várias razões. Aristóteles raciocinou que felicidade é o objetivo último da vida porque “escolhemo-la por si mesma, e nunca por qualquer outra razão”. Em contraste, todas as outras aspirações, como, por exemplo, dinheiro, saúde, reputação e amizade, entre outros, são objetivos instrumentais perseguidos com o propósito de alcançar outros mais elevados, incluindo, nestes últimos, a felicidade. Logo, de acordo com Aristóteles, é racional que felicidade seja o objetivo final da vida. Uma vez alcançada, nela temos, concentrado, tudo o que queremos. Em adição, outros filósofos, explicitamente, ombrearam tal experiência prazerosa com bem-estar subjetivo e qualidade de vida. Muitos outros foram mais adiante, sugerindo que o principio de promover a maior quantidade de prazer para um maior número de pessoas deveria ser a pedra fundamental da moralidade. A literatura recente tem identificado e decomposto empiricamente três constituintes da felicidade: 1) prazer (ou emoção positiva), 2) engajamento e 3) significado. A primeira rota para uma maior felicidade é hedônica, ou seja, vinculada ao prazer, aumentando com as emoções positivas. A menção, durante um diálogo, de se estar feliz é o tipo de “felicidade” presente nesta rota. Dentro de certos limites, podemos aumentar nossas emoções positivas sobre o passado, cultivando a gratidão e o perdão, sobre o presente, fomentando a sabedoria e a obediência, e, também, sobre o futuro, cultivando a esperança e o otimismo. A segunda rota para a felicidade envolve a busca da “gratificação”.  

O elemento chave de uma gratificação é aquele que nos engaja completamente. Inserimo-nos nesta rota quando nos gratificamos em participar de uma grande conversação, consertar uma bicicleta, ler um bom livro, ensinar uma criança, tocar um violino e em realizar uma tarefa complexa no trabalho, ou mesmo, em participar de atividades políticas. Esta rota pressupõe que é preciso envolver-nos completamente nas mesmas para fomentar nossas potencialidades pessoais, tais como, a criatividade, as inteligências analítica e emocional, senso de humor, perseverança e apreciação da beleza e da excelência. Embora a busca de gratificações envolva, fundamentalmente, as nossas potencialidades, uma terceira rota para a felicidade origina-se do uso das mesmas para pertencer e colocar-se a serviço de algo maior do que a si mesmo; algo como conhecimento, bondade, família, comunidade, política, justiça ou um poder espiritual mais alto. A terceira rota é a do prazer que dá significado à vida. Ela fornece um propósito para esta e é um antídoto para a síndrome de inquietude até morrermos. Como mensuramos a felicidade? Sentimentos e emoções, assim como, julgamentos sobre casamento, amizade e trabalho, são reflexos fidedignos de reações humanas a eventos do cotidiano, os quais muito respondem pela felicidade. Em seu âmago, encontram-se componentes gerais, como, por exemplo, satisfação com a vida; com trabalho, casamento, religião e amizade; ou específicos, como, por exemplo, afetos positivos e negativos, existindo o primeiro por ocasião de elevada vivência de sentimentos agradáveis, e o segundo, quando da pouca vivência de sentimentos desagradáveis, que, tomados em conjunto, constituem a essência do bem-estar subjetivo. 

Estudiosos concordam, em geral, que felicidade pode ser mais bem avaliada considerando quatro indicadores, a saber: (1) Fisiológicos e Neurobiológicos, com o desenvolvimento de instrumentos que capturam ondas cerebrais. Porém, a mensuração da felicidade a partir destes indicadores tem se mostrado difícil porque aspectos cognitivos desempenham um papel importante no julgamento subjetivo da felicidade; (2) Comportamento Social Observável, uma vez que algumas ações comportamentais são mais comumente observáveis em indivíduos que se afirmam mais felizes, tais como empreendedorismo, amizades, filantropia; mas, tais ações podem também ser verificadas em pessoas ditas infelizes; (3) Comportamento Não-Verbal, uma vez que tem sido observada uma correlação moderada entre o grau de felicidade e gestos e/ou expressões faciais refletidas em comportamentos considerados felizes. Novamente, tais ações também podem ser vistas em pessoas consideradas infelizes, e (4) Auto-Registros Avaliativos, nos quais os próprios indivíduos avaliam o seu grau de felicidade. Embora considerados de natureza subjetiva, várias pesquisas têm revelado que as pessoas são capazes de consistentemente avaliar seu próprio grau de bem-estar subjetivo.  

Baseados nesta consistência e fidedignidade os julgamentos individuais, muitos pesquisadores estudam a temática Felicidade fazendo uso de, apenas, uma simples escala, cujo único item, muitas vezes, indagativo, como, por exemplo, “Como você se sente em relação à vida como um todo?”. As respostas podem ser dadas numa escala de 7 categorias, variando de agradável a terrível. Outro exemplo típico consiste em indagar, “Considerando todas as coisas, você diria que você é: muito feliz, feliz, ou não muito feliz”. Outras escalas são mais complexas, compostas por um número maior de questões, que contemplam tanto o afeto positivo, como o negativo, como, por exemplo, “De várias maneiras a minha vida está próxima do ideal” ou, “De uma forma ou de outra, tenho conseguido as coisas mais importantes que almejei na minha vida”. Porém, na última década, pesquisadores priorizaram, em seus estudos, o uso de escalas que, em suas opiniões, melhor avaliam sentimentos e emoções duradouros. Por exemplo, através de métodos de amostragem de experiências naturalísticas, os quais indicaram bem-estar subjetivo em momentos aleatórios do cotidiano, aplicados durante, aproximadamente, uma a quatro semanas, eles conseguiram gerar inúmeros escores mais válidos e precisos. Devido às suas múltiplas facetas, considerando centenas estudos e atém, também, minhas sete décadas de vida, sempre afirmo: “Felicidade é como as nuvens, sempre que buscá-las estarão em formato e intensidade diferentes, mas seu julgamento ao longo da trajetória da vida será sempre invariante”. Talvez, melhor dizer como Vinicius de Morais em A Felicidade: “felicidade é como a pluma, Que o vento vai levando pelo ar, Voa tão leve, Mas tem a vida breve, Precisa que haja vento sem parar”. 

Professor Visitante da UnB-DF* 

 

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