Nascido em Pontal, cidade que fica cerca de 38 km de Ribeirão Preto, Elton de Almeida, de 33 anos, mora hoje em Los Angeles, nos Estados Unidos, e atua como roteirista para serviços de streaming como Globoplay e Netflix e produtoras como Maria Farinha Filmes, LB Entertainment, Kondzilla, Paris Entretenimento e Conspiração. Elton conta que o audiovisual é um sonho desde a infância, quando a mãe vendedora da Natura ganhou uma câmera filmadora numa ação de marketing da empresa. Depois virou realidade com a graduação pela ECA-USP.
“Primeiro, eu quis ser escritor de livros. Com a chegada da câmera em casa, comecei a filmar os aniversários das minhas primas, casamentos, lugares no meu bairro e, então, a fazer os meus curta-metragens”, conta Elton. Pontal é uma cidade de pouco mais de 50.000 habitantes, conhecida pela tradição no agronegócio, setor que não estava nos planos de Elton. “Por causa da minha classe social, um menino negro e gay, o que o mundo via como possibilidade para mim era limitado. Eu sempre sonhei muito alto e parecia que no interior não cabiam os meus sonhos”, diz
Segura Essa Pose – O trabalho mais recente de Elton como roteirista, “Segura Essa Pose”, estreou recentemente no Globoplay e fala exatamente de jovens que encontram na arte novas possibilidades. A nova série mistura documentário e reality show para retratar a emergente cena ballroom no Rio de Janeiro, frequentada por jovens LGBTQIAPN+, negros e periféricos, em grande parte.
“A série fala de pessoas em situação de vulnerabilidade que encontram umas nas outras apoio financeiro, emocional e trabalhista e mostra as relações dessas pessoas, tanto com as famílias quanto com a religião, entre outros temas. O mais bonito são os personagens jovens que estão, por exemplo, na faculdade e querem seguir carreiras que não seriam a princípio pensadas para eles pela sociedade. Penso na população trans que, há uns anos, não tinha quase nenhuma possibilidade de emprego e em como isso está mudando”, diz Elton.
Produção -Hoje, o roteirista busca escrever histórias que trazem as experiências e vivências dele para o audiovisual. “É importante ter autenticidade para além da representatividade e da diversidade”, afirma ele. Mas nem sempre isso foi simples. Ao chegar em São Paulo, para estudar Cinema, ele sentia que precisava se adequar a um certo padrão e pensar um certo tipo de histórias para pertencer – histórias da cidade e das classes dominantes. “Agora, entendo que existem muitas histórias que não foram contadas e que eu posso contar as histórias que me cabem, inclusive as histórias da onde em vim. Foi assim também que fiz as pazes com o interior”, diz ele.
Trabalhos passados de Elton dignos de nota são a série Lov3 (da Prime Video) – que ganhou o prêmio de melhor roteiro de comédia da Associação Brasileira de Autores Roteiristas, a Abra – e a série Samantha! (da Netflix). “Escrever Lov3 foi muito legal porque é um tipo de comédia diferente do que se costuma fazer no Brasil e é uma série muito LGBTQIAPN+ e sobre outras formas de relacionamento”, diz ele.
Projetos– Para os próximos meses, Elton deve ter entre os trabalhos lançados três longas-metragens e uma série – entre eles, uma adaptação de um romance ganhador do prêmio literário Jabuti (longa), uma adaptação de uma história em quadrinhos do escritor Marcello Quintanilha (longa) e uma adaptação de um livro de contos (série). O quarto projeto, o longa Corpo Estranho, é idealizado por ele e ganhou um edital do Programa de Ação Cultural, o ProAC. Nele, Elton atuará como roteirista e diretor. “É um roteiro que se passa na minha cidade natal e na região de Ribeirão Preto em geral, minha homenagem às minhas raízes”, conta ele.
Coprodução Brasil/Estados Unidos – Durante a pandemia, em 2020, Elton voltou a morar em Pontal para ficar perto dos pais que estavam no grupo de risco para Covid. Durante esse tempo, vivendo na região novamente, surgiu a ideia do filme, Corpo Estranho. “É um filme que se passa em 2005, em Pontal e Ribeirão Preto, e fala sobre um jovem negro gay assumido que está em busca de amor e de comunidade, querendo poder viver a sua sexualidade abertamente num tempo em que o preconceito e a homofobia eram ainda mais latentes”, explica.
Ele escreveu o projeto do filme quando estava em Pontal. O roteiro foi escrito quando ele já estava em Los Angeles e a intenção é filmar nos próximos dois anos, sendo uma coprodução entre Brasil e Estados Unidos.
“É um projeto que não teria nascido se eu não tivesse voltado a morar na região e visto como as coisas mudaram e evoluíram desde então. Pontal foi a primeira cidade do Brasil em que um juiz deu ganho de causa a alguém que fez um processo contra homofobia, por exemplo. Isso foi histórico na cidade. Nas últimas eleições municipais, a vereadora mais votada em Pontal foi uma mulher trans”, conta.
Elton veio para o Brasil em fevereiro deste ano e passou a maior parte do tempo em Ribeirão Preto. “Agora, vou voltar para o Brasil em setembro e também vou passar alguns meses em Ribeirão e Pontal e usar esse tempo para aprofundar a pesquisa do longa e fazer reuniões e conseguir parcerias”, declara.
Mestrado – Desde 2021, o roteirista reside em Los Angeles, para onde se mudou para cursar um mestrado em Roteiro pelo The American Film Institute com a bolsa Fulbright. “Vir para os Estados Unidos é e não é o que eu esperava. É fascinante estar numa cidade em que a indústria do cinema é uma das principais indústrias, em que todo mundo está pensando cinema. E a cidade é muito diversa e existe uma luta para que isso esteja representado no audiovisual e nas pessoas que fazem o audiovisual. Além disso, para os americanos, o tema da comunidade é caro. Aqui, encontrei muitas pessoas latinas, negras e queer pensando cinema e querendo produzir conteúdo sobre a gente, para a gente e pela gente. É inspirador”, finaliza Elton.