Tribuna Ribeirão
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Praça 7: lembranças e andanças 

José Antônio Lages * 
 
Eu me lembro, eu me lembro! Recém-chegado a Ribeirão Preto no final dos anos 80, a minha estreia neste tão bucólico espaço foi levar meus alunos do COC para aulas a céu aberto. Eu ficava no coreto e eles sentados na calçada. A praça é nossa! Já dizia o programa humorístico. Estávamos ali para confirmar. Foram apenas alguns sábados, contando as histórias que caiam no vestibular, mas que, tenho certeza, marcaram a alma daquelas garotas e garotos. Depois de tanto tempo, fico imaginando como era gostoso para todos nós sair do espaço controlado da sala de aula para, entre árvores e passarinhos, navegar pelas ondas da aprendizagem. 
 
Em Ribeirão, as praças centrais tem muito a ver com cemitérios (!) Na Praça 7 de Setembro, que já foi chamada de Aureliano de Gusmão, não foi diferente. Voltamos às origens históricas da cidade. Por ali também existiu um cemitério, não exatamente na praça, mas no quarteirão que a separa da Av. Independência. Saiu dali para a Saudade. A sanha do higienismo chegava por aqui também no final do século XIX e levava os mortos para longe, mas levava também os vivos pobres para além-rios. E isso era matéria de História. Assim foi se configurando a nossa malha urbana ao sabor das tendências e das classificações sociais. Muitos arranjos e desarranjos que fizeram Ribeirão ser o que é hoje. 
 
Praça já foi chamada de largo, já foi jardim. Acabou ficando praça para comprovar mais uma influência do eurocentrismo que chegou forte por aqui na belle époque caipira, como dizia o saudoso José Evaldo Doin. Mas praça sem árvores não é praça. E a Praça 7 as tem em profusão. A natureza ali se faz exuberante. Um sem teto construiu sobre uma delas a sua morada. Deixou de ser sem-teto! Lembro que alguém já quis construir um lago artificial no meio da praça. Não deu certo. Já colocaram ali um kit academia ao ar livre. Intervenções que pouco ou nada tem a ver com o sentimento de praça. Porque praça é, antes, de tudo, um sentimento. 
 
Praça nos faz também pensar em arte. E a Praça 7 carrega um histórico das artes. Continua sendo das artesãs e dos artesãos nos sábados. Já teve uma presença maior. A praça une a natureza e a poiésis criativa e imaginativa de todos nós. Os artistas humanizam a praça. E o coreto está ali como testemunha. O chorinho já voltou e, nas sextas-feiras, a 7 passou a ser mais um lugar da cultura em todo lugar. Sem dúvida, as praças clamam por políticas públicas. Está dando certo! Tempos vão, tempos vêm, e a praça continua sendo o lugar de fazer e transmitir a arte do conhecimento, da expressão e do prazer. Praça, natureza e artes – combinação mágica que nos faz rejuvenescer! 
 
A praça também é espaço de trocas. Mas foram assim que surgiram as primeiras cidades modernas, então chamadas de burgos ao final da Idade Média europeia. A nossa 7 também é uma praça comercial. Seu entorno é pontuado por um comércio bastante conhecido dos ribeirão-pretanos. Tem ali o sorvete saboroso da moçada. Na esquina, uma das padarias mais tradicionais da cidade. Em frente, um restaurante bem avaliado onde eu sempre vou com a família. Mas tem um peixinho delicioso em uma outra esquina. E me lembro bem que comemorei um dos meus nivers com os amigos e amigas em um outro restaurante. 
 
As praças também são motivo de controvérsias. A Praça 7 já foi ou continua sendo. População em situação de rua costuma improvisar nela alguma acomodação e transformar em sua “casa. Triste drama social que se torna agudo nas crises sazonais. Quem mora no entorno se incomoda e cobra providências das autoridades. Ribeirão carece de políticas sociais. Eu me lembro, quando era membro do Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural (CONPPAC), que nos chegou a proposta de construir na Praça 7 um posto policial. Não combinava. Acabou sendo construído um equipamento que mais parece um abrigo para os desavisados. Mais um problema que uma solução. Se a praça é do povo, o povo leva para ela as suas contradições. 
 
Todas essas lembranças e andanças me retornaram agora por participar do projeto Oficina Andante da querida amiga Daniela Penha. Nos três últimos sábados, passeamos por três praças entre memórias, vivências e afetos. E a última foi justamente a 7. Foi a oportunidade para escrever este artigo. Obrigado, Dani, por nos oportunizar este momento de carinho, aconchego e identidade com a nossa querida Ribeirão! 
 
* Consultor técnico-legislativo e ex-vereador em Ribeirão Preto (Legislatura 2001-2004) 

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