Tribuna Ribeirão
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Discricionariedade administrativa 

Sérgio Roxo da Fonseca *  
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Taís Costa Roxo da Fonseca ** 
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No final do século XIX, na área do Direito Administrativo, surgiu na Europa a ideia segundo a qual deveria existir um elenco de regras legais, cuja aplicação pela a Administração Pública, não estariam submetidas ao controle do Poder Judiciário. Essas normas estariam planificadas num âmbito batizado como “normas discricionárias”. 
 
Antes do século XIX os países europeus, quase todos, eram administrados pelos reis e, na sua ausência, pelos seus parentes mais próximos. Dizia-se em latim “rex est lex” (o rei é a lei).  
 
Especialmente após o êxito da Revolução Francesa, o lema foi substituído pela sua inversão: “lex est rex” (a lei é o rei). Mas então onde estaria o campo da discricionariedade, identificado como uma área jurídica hermeticamente trancada (pelo deus grego Hermes) impedida de qualquer controle pelo Poder Judiciário? 
 
O grande mestre da Faculdade de Coimbra, Afonso Rodrigues Queiró destacou que as leis podem ser elaboradas ou pela linguagem técnica ou pela linguagem simples do povo.  
 
Exemplo da linguagem técnica: para ser candidato à Presidência da República no Brasil o candidato tem que ter no mínimo 35 anos. A aplicação desta regra permaneceria sob o controle do Judiciário. 
 
Ao contrário, é possível que haja uma lei estabelecendo que para ser servidor público, o candidato tem que ser “bom pai de família”. Esta dicção normativa usa expressão da linguagem vulgar, razão pela qual não poderia ser controlada pelo Judiciário (Os limites do Poder Judiciário das autoridades administrativas; Coimbra:Boletim da Faculdade de Direito,vol. XLI p. 84, 2001). O grande mestre publicou vários textos sobre o tema. 
 
Nos dias de hoje, a tendência é negar a existência da discricionariedade administrativa, submetendo, pois, todas as normas jurídicas e sua incidência ao controle do Poder Judiciário. 
 
A Constituição Brasileira coloca-se contra a existência de normas e de atos discricionárias, nos precisos termos do inciso II, do seu art. 5º, que define que ninguém poderá ser impedido de fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão quando houver texto legal proibitivo. 
 
Daí se extrai que os membros da sociedade civil podem fazer tudo o que quiserem, menos violar qualquer lei. 
 
Ao contrário as autoridades públicas (do Executivo, do Judiciário e do Legislativo) estão proibidas de restringir o comportamento de qualquer homem ou de qualquer mulher, membros da sociedade civil, salvo se houver uma lei autorizando. 
 
Merece ser registrado que o importantíssimo preceito constitucional, por vezes, é atropelado no Brasil. 
 
Ainda recentemente alguns partidos políticos ajuizaram perante o Supremo Tribunal Federal mandados de segurança contra a conduta do presidente da Câmara dos Deputados, que mantinha engavetados mais de cem requerimentos de abertura de processos de impeachment contra o então presidente da República. 
 
O texto foi indeferido de plano pela ministra do Supremo Tribunal Federal, declarando em seu despacho que, como não existe norma legal fixando prazo para a execução do ato, o presidente da Câmara Federal poderá livremente fixá-lo.A decisão da Suprema Corte violou claramente o inciso II, do art. 5º da Constituição.  
 
Se não existir norma fixando o prazo para o exercício do poder, não existe poder para a sua fixação; portanto o ato administrativo deve ser imediatamente editado, o que não ocorreu. Os requerimentos provindos do Poder Legislativo perderam definitivamente seus efeitos jurídicos. 
 
* Advogado, professor livre docente aposentado da Unesp, doutor, procurador de Justiça aposentado, e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras 
 
** Advogada 

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