Luiz Paulo Tupynambá *
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Parlamento Europeu: 704 cadeiras. Eleições (todas as cadeiras em disputa) de 6 a 9 de junho.
Hoje, a União Europeia tem 27 países-membros, com diferenças linguísticas, culturais, históricas e econômicas significativas. Essas diferenças se acentuam, dependendo do movimento político que domina determinada nação na época das eleições gerais europeias. Neste ano de 2024, estamos assistindo ao recrudescimento dos partidos e das ideias da direita e, em alguns casos, também da extrema-direita populista.
Não se pode afirmar que o fascismo ou mesmo o nazismo fazem parte desse crescimento, mas a cartilha nacionalista, patriótica e anti-imigração com certeza está presente. Se será a sementeira para futuros desvarios de dirigentes populistas que tentarão repetir fórmulas dominantes do passado, é conversa para outro artigo. Essa legislatura da União Europeia (2019-2024) terminou em fevereiro após conseguir muitos avanços, apesar de ter enfrentado muita coisa.
A primeira foi a autodefecção do Reino Unido (o Brexit), que abandonou a União Europeia em 31 de janeiro de 2020. Foi um duro golpe no Eurocentrismo, que machucou economicamente os dois lados e despertou uma animosidade adormecida entre os “ilhéus” e os “continentais”. Logo em seguida, veio a pandemia da Covid-19, com toda a sua crueza e impacto impressionantes na economia mundial. Isso numa região do mundo que já enfrentava a crise dos imigrantes fugitivos das guerras e da fome no norte da África, no Iraque e na Síria. Quando pareceu que o fim da pandemia e a diminuição da imigração ajudariam na melhoria das coisas, uma ameaça secular surgiu no leste: a Rússia, travestida em “democracia salvadora do mundo”, comandada pelo “czar” da KGB, Vladimir Putin. A guerra declarada contra a Ucrânia, que os mandatários russos achavam que duraria algumas semanas, completou dois anos em fevereiro e não tem perspectivas de um final em breve.
A Europa continua dependente do petróleo e do gás russos para suas indústrias, transportes, geração de energia e calefação de suas cidades durante o inverno. Essa euro dependência faz com que Putin tenha uma espada econômica pesando sobre uma Europa que tem hoje um ambiente favorável ao crescimento da extrema-direita que, em sua maioria, é simpática ao ditador russo e sua agenda nacionalista e moralista.
Pesquisas indicam que, nas eleições de 6 a 9 de junho, o Partido Popular Europeu (PPE) de direita, ligado à Democracia Cristã, que já é o maior bloco do Parlamento Europeu, conquiste mais algumas cadeiras. Porém, o crescimento mais esperado é do Identidade e Democracia (ID), de extrema-direita, que deve desbancar os liberais do Renova Europa como o terceiro maior bloco do parlamento europeu (não confunda com os “liberais” daqui, que, na verdade, são da extrema-direita). Também pode tirar vagas do bloco SD, Socialistas e Democratas (estes da social-democracia), enquanto os Verdes deverão manter ou ter pequenas perdas no número de deputados. A coalizão dominante entre 2019 e 2024, formada pelo PPE e pelo SD, por enquanto não parece ameaçada, mas muita água vai rolar debaixo das pontes dos rios Danúbio, Sena e Dnieper até lá. Localmente, a extrema-direita deve se fortalecer na França, Itália e Espanha, como já aconteceu nas eleições locais na Dinamarca e em Portugal.
Isso reforça a força política de líderes como Viktor Orbán, da Hungria, que pregam uma União Europeia esvaziada, sem alianças obrigatórias e regulações continentais. Como ele, Andrzej Duda e outros presidentes e mandatários de países menores enxergam França e Alemanha como duas potências econômicas e militares, que atuam em primeiro lugar para defender os seus próprios interesses, deixando os interesses dos países menores em segundo plano. Esse tipo de ressentimento gerou o euroceticismo, que não prevê futuro na União Europeia. E não veem com maus olhos uma aproximação com a Rússia, que pode lhes proporcionar certa independência no fornecimento de energia, metais e alimentos, sem precisar passar pelo carimbo europeu. Para esses líderes, Putin é um populista como eles e a conversa fica mais fácil. Mas todos eles sabem que ficar amigo de Putin é o mesmo que abrir a jaula do leão. Ou a do urso, no caso russo.
E ainda tem o fator “Trump”, que ameaça mudar todo o cenário político-militar na Europa com uma canetada só. Uma vitória de Trump na eleição presidencial estadunidense pode ser o fim da obrigatoriedade dos Estados Unidos na defesa automática de outros membros da OTAN. Trump afirmou há algum tempo que não gastaria um centavo para defender países-membros da organização militar que não comprometessem gastos em defesa de, pelo menos, dois por cento de seus orçamentos nacionais. Trump defende o não cumprimento de acordos com a UE, que considera desfavoráveis aos Estados Unidos. Prefere as relações comerciais de nação a nação. Oferecerá vantagens comerciais para bloquear o avanço econômico chinês na Europa Central. Mas, sua atitude mais esperada é relacionada à Rússia. Pelo que falou até agora, vai forçar a barra para que os ucranianos entreguem o jogo, via cortes financeiros (até mesmo totais) na ajuda militar e comercial ao país.
Enfim, no futebol, junho é mês de Eurocopa e julho tem Olimpíadas em Paris. Tudo lindo no verão europeu. Mas, na vida real pode ser o verão do início do fim da União Europeia. A ver.
* Jornalista e fotógrafo de rua