Tribuna Ribeirão
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O presente do passado 

Sérgio Roxo da Fonseca *
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Taís Costa Roxo da Fonseca **
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É possível e necessário ter o passado habitando o presente na medida em que a nossa memória guarde os sinais dos sons daqueles eternos sorrisos como também o clarão do sol que iluminou nossos passos. Possivelmente são aqueles mesmos que no presente dão sonoridade a nossa alma e ressuscitam a todo momento as imagens que insistem em  permanecer passeando pelos caminhos da nossa memória.

Não havia muitos automóveis rodando pela Rua General Osório. Na Praça XV, na face defronte da Visconde do Inhaúma, permaneciam estacionados os “carros de praça”, pretos, puxados por cavalos, exatamente como nas principais cidades do mundo.

Os carros de praça eram contratados por familiares para atravessar as ruas e ruelas da cidade, conhecendo e reconhecendo cada canto e todos os recantos da grande e eterna cidade. Os carros de praça rodavam até mesmo para longe do centro, alcançando até mesmo os cantos do cemitério. Com a multiplicação dos automóveis, os carros de praça deixaram de existir na nossa cidade que assim se afastou do estilo das tristes e antiquíssimas Nova Iorque e de Viena, estas duas consideradas então caipiras.

Há duzentos metros abaixo a Visconde do Inhaúma alargava-se, criando os braços da Praça Tiradentes, onde permaneciam as carroças, puxadas por cavalos, aguardando a sua contratação para transportar mercadorias de um lado para o outro dos cantos urbanos. Os cavalos, ao final dos dias eram banhados no ribeirão exatamente onde hoje a Avenida Independência, cruza com a Francisco Junqueira. O local era conhecido como o “lavador”, ali acabava a cidade. E os cavalos assim podiam tomar banho sem ofender a castidade da vizinhança.

No meio da tarde, o centro da cidade era banhado pelo perfume da torrefação do Café Biagini. No início e no final dos dias ouvia-se a sinalização insistente feita pelas cervejarias, comunicando que ou a jornada estava iniciando ou se encerrando. O meio da noite era sacudido pelos “carroções”, puxados por cavalos, empurrando a sujeira dos dias para as sarjetas da noite que era cortada pelo automóvel preto e branco da polícia, conhecido como “pinguim”.

Antes de o sol nascer os caminhões conduziam pedras de gelo, colocadas na frente das casas que porventura tinham uma geladeira. .

Por volta das 12,00 horas o Nakamura, com sua corneta, vendia os deliciosos bastões “guaranis”. Logo depois os carros amarelos transitavam vindo da Saldanha Marinho vendendo os sorvetes de coco queimado.

Mas se o sol desaparecia, a Praça XV recebia um dos seus mais notáveis frequentadores. Tinha pouco mais de um metro e meio de altura. Vestia sempre terno branco e usava chapéu até durante a noite. Era conhecido como ”Mil e Hum” ou mesmo “1001”, apelido inspirado na falta de dentes exibidos pelo seu permanente sorriso. Era o rei do carnaval de rua.

Nas proximidades do Pedro II, numa cadeira posta na calçada de fronte de uma barbearia, o insuperável Valdemar engraxava os sapatos da população masculina.

O único ator de cinema, festejado por todos que aqui chegavam, era a onça do bosque que, segundo era dito e sobredito, havia contracenado com a atriz Vanja Orico no famoso filme sobre “Lampião”.

A última estação de trem, o principal meio de acesso para São Paulo, tinha como nome de batismo “Gaturamo”, que infelizmente foi substituído por Vila Bonfim. Em Paris, ao lado do mais famoso museu do mundo, o Louvre, há um bairro chamado “Brejo”, ou seja, “Marais”. Ao que se sabe nunca ninguém tentou substituir o seu nome histórico.

O passado ainda está no nosso presente? Ou o presente ainda permanece no nosso passado? Difícil saber.

* Advogado, professor livre docente aposentado da Unesp, doutor, procurador de Justiça aposentado, e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras

** Advogada 

 

 

 

 

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