Tribuna Ribeirão
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No caminho da Lua 

In memoriam de Paulo Tupinambá

Luiz Paulo Tupynambá * 

www.tupyweb.com 

 

“Olha a Lua/parece que acaba/mas continua” – Haikai de Eveyn Heine – www.divertudo.com.br

A Apollo 17 pousou na Lua em 7 de dezembro de 1972 e foi a última nave estadunidense que alunissou até a quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024. Nessa data, após algumas tentativas infrutíferas, uma nave, parte da missão conjunta entre a NASA e a empresa Intuitive Machines, finalmente tocou o solo lunar. O módulo Odysseus alunissou próximo ao seu alvo, na borda da cratera Malapert A. Esta cratera, localizada a cerca de 300 quilômetros do polo sul lunar, é suspeita de armazenar uma grande quantidade de água congelada em suas profundezas que nunca foram expostas à luz solar.

No entanto, sempre há um “mas” quando se tenta realizar uma missão como essa. A Odysseus acertou o alvo, mas teve problemas no pouso, ficando praticamente de cabeça para baixo. Rapidamente perdeu a comunicação com a Terra. Com isso, os seis projetos de pesquisa que carregava foram comprometidos e, menos de uma semana após o pouso, a NASA confirmou o abandono da missão. Não há como a pequena nave se reorientar e retomar o envio de dados. Além disso, em breve essa região lunar entrará na “penumbra solar”. A ausência de radiação solar faz com que a temperatura no solo fique tão fria que seria impossível realizar qualquer experimento. Muita celebração para pouco resultado.

Enquanto a NASA e seus parceiros repensam seus fracassos – só neste início de ano foram dois: em janeiro com a nave Peregrine e agora com a Odysseus – vamos explorar o grande objetivo econômico e estratégico das renovadas missões lunares, o Hélio-3. Este material é um isótopo do gás hélio, composto por dois prótons e um nêutron em seu núcleo atômico. Seu potencial como gerador de energia é enorme e sua exploração compensaria, com folga, qualquer custo para extraí-lo e processá-lo na superfície lunar. Mas o que faz do Hélio 3 o “queridinho” da nova era espacial?

O Hélio-3 na Lua é resultado de reações nucleares causadas pelo vento solar e raios cósmicos. O regolito (solo) lunar, rico em minerais, absorve esses elementos e os transforma em Hélio-3. Estima-se que existam milhões de toneladas dele no regolito lunar. E mais, na Lua, o Hélio 3 é encontrado superficialmente, o que facilita muito sua mineração e operação.

Para se ter uma ideia da importância do Hélio 3 e do porquê ele é considerado o combustível do futuro, saiba que uma tonelada de Hélio-3 produz três vezes mais energia que a mesma quantidade de carvão mineral. Com a vantagem de não gerar gases de efeito estufa ou poluentes. Uma tonelada de Hélio 3 gera aproximadamente 18 gigawatts-hora (GWh). Em termos mais práticos, 18 GWh de energia seria suficiente para: 

  • Abastecer uma cidade de 100.000 habitantes por mais de um ano;  
  • Alimentar um carro elétrico por mais de 2 milhões de quilômetros;  
  • Manter uma lâmpada de 100 watts acesa por mais de 200 anos. 

O processo de obtenção de energia com Hélio 3 é a fusão nuclear. Ainda não temos nenhuma tecnologia consagrada para realizar a fusão nuclear, mas estamos perto disso. Para um avanço tão grande em termos de economia e proteção ambiental, dez ou quinze anos podem significar rapidez e não demora.

A água é de vital importância para qualquer tentativa de estabelecer uma colônia mínima na superfície lunar, seja ela estadunidense, chinesa, indiana, russa ou de qualquer outra nação. Se tivermos à disposição água para consumo e para a extração de oxigênio que possibilite criar atmosfera respirável nas bases lunares, além da disponibilidade de energia em abundância gerada pela fusão nuclear do Hélio 3, a exploração da superfície lunar se torna viável. Foguetes para viagens mais distantes poderiam ser montados e abastecidos na Lua, com o combustível gerado pela extração de hidrogênio, tanto da água quanto do Hélio 3. Assim, teríamos combustível para as viagens necessárias, economizando peso e tamanho das naves que fariam uma ponte entre Terra e Lua, levando Hélio 3 para ser usado como combustível limpo em nosso planeta e trazendo, no retorno, alimentos, equipamentos, suprimentos e pessoal de rotação para a Lua.

Um mapa com a distribuição de Hélio 3 na superfície lunar foi feito pela sonda chinesa Chang’e 1 em 2007. Mostra a presença do isótopo em um largo cinturão na região central do satélite, mas não na região dos polos. Nas extremidades da Lua está concentrada a água congelada que permitirá a exploração comercial e científica do satélite em um futuro próximo. Dizem que o interesse no Hélio 3 e seu potencial de gerar lucros no futuro é tão grande que em dez anos haverá um congestionamento na rota Terra-Lua. Prepare-se para pagar o PedageX, pois Elon Musk está na parada.

Piadas à parte, parece ser irreversível essa tendência em acelerar a exploração mineral da Lua, com a perspectiva de conseguirmos fontes de energia mais eficientes e não poluentes. Sem contar todas as evoluções tecnológicas que sempre acompanham o desenvolvimento da exploração espacial. Porém, sinaliza, também, que onde tem interesse econômico e estratégico, tem presença militar das potências interessadas. Sempre foi assim, das pirâmides à Roma, de Constantinopla à Washington, nada mudou. E vai ser uma pena, pois a nossa querida Lua vai acabar se tornando um imenso entreposto comercial e militar.

Semana que vem vou falar do SAF. Não é imposto, nem lei. É coisa boa para a região.

* Jornalista e fotógrafo de rua 

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