Tribuna Ribeirão
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Com a palavra, o presidente do Conppac 

O atual presidente do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Conppac) de Ribeirão Preto é o advogado Lucas Gabriel Pereira  (Alfredo Risk)

Desde que assumiu a presidência do Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural de Ribeirão Preto (Conppac), em abril de 2022, o advogado Lucas Gabriel Pereira, deu maior visibilidade ao órgão graças às várias propostas viabilizadas em favor da preservação dos patrimônios culturais. Entre elas, a criação da reserva técnica, para guarda do acervo dos museus Histórico e do Café e a proteção ambiental das árvores de avenidas, como a Costábile Romano, consideradas patrimônios culturais.  

Ao Tribuna Ribeirão ele fez um balanço de sua gestão que termina no começo de abril. O Conppac é um órgão de caráter consultivo e deliberativo composto por 21 cadeiras, divididas em forma tripartite, com representantes do poder público, da sociedade civil indicada e da sociedade civil eletiva. As eleições para o biênio 2024/2026 serão realizadas em março. 

 

Tribuna Ribeirão – O senhor está terminando o seu mandato como presidente do Conppac. Que avaliação faz de sua gestão? 

Lucas Gabriel Pereira – Tomamos posse em um momento de turbulência, saindo da pandemia covid-19. Enfrentávamos críticas da imprensa e da Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (Acirp). Defendemos as prerrogativas do Conselho e ampliamos o diálogo e a conscientização da preservação do patrimônio cultural.  

 

Tribuna Ribeirão – Como avalia a construção da reserva técnica – prédio para guardar e conservar o acervo – dos museus do Café e Histórico durante a reforma e restauro deles? 

Lucas Gabriel Pereira – Após assumir à presidência, me deparei com o projeto de intervenção nos museus, e da construção da reserva iécnica. O projeto inicial autorizado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) pretendia construir um prédio “elefante branco” entre os museus e felizmente conseguimos mudar isso. Após o Condephaat terceirizar as análises do corpo técnico, decaiu substantivamente a qualidade de suas análises. O Condephaat se tornou um órgão mais político do que técnico. Embora toda decisão técnica, também seja política, nem toda decisão política é técnica, quando falamos da criteriosidade necessária para deliberar processos. Nesse campo, não há isenção. Toda intervenção na área de patrimônio cultural prescinde de uma análise multisetorial dos órgãos públicos.  

 

Tribuna Ribeirão – Sua gestão tem tombado árvores de importantes avenidas da cidade. Por quê? 

Lucas Gabriel Pereira – Ribeirão Preto é uma cidade com baixa umidade do ar e qualidade semelhante ao deserto. Promover e divulgar à proteção ambiental no âmbito do patrimônio cultural, reforça o coro no sentido de buscarmos melhorarias na qualidade de vida e bem-estar dos munícipes. Foram décadas para criar os corredores como os das avenidas Nove de Julho, Costábile Romano e Treze de Maio que fazem parte da história da cidade e de nossa população. Na avenida Independência, infelizmente, deram fim as árvores. 

 

Tribuna Ribeirão – O prédio do Hotel Brasil foi colocado à venda em leilão pela Justiça três vezes em menos de um ano sem ter nenhum interessado. A que o senhor atribui o desinteresse em adquirir o prédio? 

Lucas Gabriel Pereira – Vários. O valor do imóvel levado à leilão torna surreal surgir um arrematador. Fui o primeiro a fazer a radiografia jurídica para resolução do caso. Enviamos proposta ao governador do Estado de São Paulo porque nossa proposta de adjudicação compulsória do Hotel não demandava o dispêndio de um real. Imaginou se houvesse? 

Recuperar o Hotel Brasil não resolve todo o problema. A área está degradada socialmente. É imprescindível um projeto de intervenção urbanístico no entorno. Se o poder público não assumir a parcela maior de responsabilidade, a classe empresarial não irá fomentar investimentos, porque não vai assumir o risco sozinha.  

Tribuna Ribeirão – Como o senhor avalia a administração municipal em relação a preservação do patrimônio cultural da cidade? 

Lucas Gabriel Pereira – Existem bônus e ônus. A criação da reserva técnica dos museus é um dos bônus. Já as várias licitações malsucedidas que oneraram as finanças municipais, como a falta de planejamento da recuperação da avenida Nove de Julho, são ônus. 

Mesmo com o orçamento bilionário que a cidade tem não aprendemos nada com cidades históricas, como Paraty, no Estado do Rio de Janeiro e Mariana, Ouro Preto, Tiradentes e Congonhas em Minas Gerais. Todas elas cuidam e exploram economicamente o patrimônio cultural, enquanto Ribeirão Preto, não consegue fazer uma licitação de restauro.  

Caso o atual governo consiga entregar um projeto de lei na área da política de turismo poderá deixar importante contribuição. Desde que o projeto não tenha os vícios como aquele que apresentaram na reestruturação administrativa, que terminou drenando milhões dos contribuintes num projeto inconstitucional. De mais a mais, o legado positivo só foi possível graças a mudança e o empenho da nova equipe da Secretaria de Cultura.  

 

Tribuna Ribeirão – Em sua opinião falta uma política de estado de preservação cultural na cidade? 

Lucas Gabriel Pereira – Falta. O humorista Millôr Fernandes dizia que o “Brasil é um país governado por um gigantesco “tour-de-farsa”. O cinema francês deu um nome a isso, se chama mise-en-scene. Ribeirão não foge à regra – desse teatro. Não termos uma lei que obrigue o gestor público a perseguir objetos e metas pré-programados, sob pena de exoneração do cargo, daí a população ficar à mercê de devaneios do gestor. O patrimônio cultural de Ribeirão é uma fonte inestimável de riqueza cultural, econômica e imagética.  

 

Tribuna Ribeirão – Entidades de classe reclamam que o Conppac propõe o tombamento de muitos imóveis. Como analisa estas críticas? 

Lucas Gabriel Pereira – Carlos Drummond de Andrade olhou para pedra e viu a oportunidade de escrever um poema. Fernando Pessoa, idem. E a poetisa Adélia Prado viu uma não-oportunidade e lamentou que Deus tirava dela a poesia. Dois viram no obstáculo, uma oportunidade de construção, enquanto outro viu uma barreira. Qual deles nós queremos ser? O que seria “muitos imóveis tombados”? A depender do que for, Brasília não seria um patrimônio cultural da humanidade reconhecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).  

Pergunto: Por que tantos brasileiros vão à Paris, Barcelona, Milão, Londres, senão para conhecer o patrimônio cultural? Por serem preservados e bem explorados, geram receitas econômicas milionárias para suas respectivas cidades e milhares de empregos. 

Quais obras públicas municipais podemos destacar nos últimos trinta anos, exceto os parques Luiz Carlos Raia, Curupira e parque Tom Jobim, nos idos do prefeito Luiz Roberto Jábali? Nos próximos trinta anos, estaremos comemorando esse legado junto com a reserva técnica, além dos restauros dos museus, propriamente ditos. Fora isso, não há nada substantivo na gestão municipal. 

Qual setor da economia estaria sendo prejudicado com os tombamentos?  Valho-me do falecido educador Darcy Ribeiro. Ele dizia que “o que se expande no Brasil é uma economia de prosperidade socialmente irresponsável, insensível aos requisitos essenciais de uma vida, porque só se preocupa com o lucro”. 

Nos últimos anos Ribeirão vem se consolidando no setor de turismo de negócios graças ao crescimento gigantesco da Agrishow e do setor de entretenimento com eventos como o Ribeirão Rodeio Music e o Festival João Rock. E por que o setor do turismo cultural não é explorado? O setor da iniciativa privada, vai bem, obrigado. E os do poder público?  Quais as rotas gastronômicas que perfazem a memória da culinária da “capital do café? Onde está o poder público que não viabiliza?  

Tribuna Ribeirão – Qual sua maior conquista enquanto presidente do Conppac? 

Lucas Gabriel Pereira – Dar visibilidade as ações do Conppac. Ser um farol em meio a miopia que paira sobre o setor político da cidade. De promover a conscientização do papel do conselho de patrimônio. Conscientização que deu resultado (parcial), o poder público nos deu mais um servidor para o quadro do Conselho.  

Me alegro saber que conseguimos dar início as obras de recuperação estrutural da Igreja Santo Antônio Pão dos Pobres, o restauro do Palacete Camilo de Mattos, a construção da reserva técnica dos museus, do restauro do Palácio do Rio Branco e, até março, pretendo autorizar o restauro do edifício Antônio Diederichsen. 

Além dessas conquistas na área arquitetônica, iniciamos um processo de conscientização do meio-ambiente no âmbito do patrimônio cultural, que ficará de legado para as próximas gerações. Gostaria de destacar o projeto de restauro do Lar Santana. Estamos em vias de finalizá-lo.  

 

Tribuna Ribeirão – Quantos imóveis existem tombados pelo Conppac na cidade? 

Lucas Gabriel Pereira – O “tombamento” é apenas uma das formas de proteção. Há outras, como a “chancela, inventário, entre outros. A quantidade não é exata, já que para todo imóvel tombado existe uma área de proteção que chamamos de “envoltória”. No Conppac existem 124 bens materiais tombados, além do inventário do sítio histórico de Bonfim Paulista, datado de 2012, com 90 bens – material e imaterial, formas de expressão e lugares, sob proteção. Isso além dos tombamentos do Condephaat e do Iphan, cada um com uma área de ambiência. 

 

Tribuna Ribeirão – Quantos imóveis foram tombados em sua gestão? 

Lucas Gabriel Pereira – Ao todo, oito. Mais do que a quantidade, friso a importância da educação patrimonial. Destacaria os tombamentos dos prédios do Museu Histórico, do Café, e adjacentes, da edificação do Sesc e do painel Irênio Maia; a construção modernista da rua Marcondes Salgado, n. 1857, da árvore Gameleira, “Ficus”, na rua Bernadino de Campos, do Edifício Diaderichsen; da floresta urbana da avenida Costábile Romano e, por último toda malha férrea remanescente. Em breve, faremos o tombamento da Caixa d´água, da Vila Tibério, e também das árvores da avenida Treze de Maio.  

De todas as ações que podemos empreender para a salvaguarda da memória de um povo, a educação é a única que deixa legados perenes. Não é por acaso que a classe política, salvo algumas exceções, não investe em educação crítica e optam por manter esse sistema de perpetuação do projeto de colonização. Enquanto um tombamento salva um bem, a educação necessária erige um projeto de nação. 

 

Tribuna Ribeirão – E em quantos imóveis foram iniciados processos de restauração? 

Lucas Gabriel Pereira – Destacaria o início do restauro do Palacete Camilo de Mattos. Era um processo que se arrastava há quatro anos no Conselho, sem previsão de ponto final. Da Casa de Cultura, Juscelino Kubistchek, além da recuperação do antigo espaço da Estação do Alto que virou uma Unidade de Saúde. 

 Tribuna Ribeirão – Como avalia a estrutura do Conppac enquanto órgão fiscalizador do patrimônio da cidade?  Como melhorar sua estrutura? 

Lucas Gabriel Pereira – Estamos aquém do necessário segundo o que nos é previsto em lei. Estamos sem um historiador e um urbanista há anos. Embora a lei que rege o Conppac não fale de museólogos, como pode uma cidade ter museus públicos e a prefeitura não ter museólogos de formação? Também não temos turismólogos, para tratar conosco do plano de cultura voltado ao patrimônio cultural. Isso impacta na produção de projetos no âmbito do poder público e, consequente, deixamos de gerar emprego e renda no turismo cultural.  Quanto maior a qualificação do corpo técnico de servidores de carreira, maior e melhor serão os resultados. Isto é, se o gestor responsável por liderar a equipe estiver à altura dos desafios da cidade. 

 

Tribuna Ribeirão – O Conselho terá eleição no mês de março. O senhor continuará sendo o candidato indicado pela OAB? 

Lucas Gabriel Pereira – Se sim ou não, depende da atual diretoria da minha entidade de classe. Ainda não falamos sobre isso. Este ano, teremos eleições municipais em outubro e na Ordem dos Advogados do Brasil de Ribeirão Preto em novembro. 

Na medida do possível, procurei representar minha classe com denodo fazendo, cumprir com a missão do Conppac. Uma cidade que não preserva sua memória é desmemoriada e sem raízes.  

 

 

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