José Aparecido Da Silva
Todos nós, em algum momento, já nos sentimentos tristes ou deprimidos. Mas esses sentimentos ou emoções geralmente passam com um pouco de tempo. A depressão, também chamada de transtorno depressivo maior ou depressão clínica, é diferente. Pode causar sintomas graves que afetam como você se sente, pensa e lida com as atividades diárias, como dormir, comer, trabalhar ou, até mesmo, ao escrever como estamos fazendo agora. A depressão é uma doença que pode afetar qualquer pessoa, independente de idade, raça, renda, cultura ou educação. Também pode ser exacerbada por fatores ambientais, como, por exemplo, atritos domésticos, violências que nos circundam, guerras e pandemias, ou, até mesmo, por confraternizações de fim de ano. Assim considerando, fatores genéticos, biológicos, ambientais e psicológicos desempenham um papel na depressão. Ademais, a depressão pode ocorrer com outros transtornos mentais e outras doenças, como diabetes, câncer, doenças cardiovasculares e dores crônicas, piorando essas condições e vice-versa. Às vezes, medicamentos tomados para tratar essas doenças podem causar efeitos colaterais que contribuem para o sentimento de depressão. Por esta razão, e também considerando o grau de vulnerabilidade das pessoas deprimidas, outras formas terapêuticas podem ser eficazes e mais seguras para mitigar ou aliviar os sintomas depressivos e suas comorbidades agregadas.
A depressão é, muitas vezes, subdiagnosticada e subtratada. Levantamentos globais têm revelado que ela é a principal causa de incapacidade nos quatro quadrantes do planeta, contribuindo significativamente para a sobrecarga global de doenças, sendo os estudantes universitários um importante grupo de risco. Segundo De Oliveira Rodrigues e colaboradores, do Departamento de Medicina Preventiva, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, em artigo publicado na JAMA Network Open, em 30 nov de 2023, há uma demanda crescente por tratamento não farmacológico para a depressão e, nesse sentido, entende-se que a acupuntura auricular, por ser uma técnica simples e de baixo custo, pode ser bem aceita pelos pacientes. Os autores também afirmam que o Sistema Único de Saúde (SUS) já tem incorporado essa prática desde 2006, mas ainda faltam estudos empíricos que tenham avaliado tanto sua segurança quanto sua validade.
O estudo publicado em JAMA teve como objetivo principal avaliar a eficácia da acupuntura auricular na redução dos sintomas depressivos em comparação com os cuidados habituais e a acupuntura auricular inespecífica. Este ensaio clínico e randomizado foi realizado com 4 centros universitários de pesquisa no Brasil, envolvendo 280 participantes universitários, de março a julho de 2023. Os pacientes elegíveis foram adultos com idades entre 18 e 50 anos, cuja pontuação no Questionário de Saúde do Paciente (PHQ-9) indicou depressão moderada (pontuação 10-14) ou depressão moderadamente grave (15-19). Os participantes foram randomizados em dois grupos de tratamento, um incluindo acupuntura auricular (AA) específica e outro, grupo controle, de acupuntura (AA) inespecífica. Ambos os grupos receberam doze sessões de AA com agulhas semipermanentes, com estimulação diária duas vezes por semana, durante seis semanas, e foram acompanhados durante três meses. Todos os participantes continuaram com seus cuidados habituais por razões éticas. O protocolo de tratamento do grupo AA específico consistiu em seis pontos de acupuntura no pavilhão auricular, escolhido de acordo com o diagnóstico de depressão pela medicina chinesa. Os pontos de acupuntura do grupo AA não específico foram a orelha externa, a área da bochecha e da face, além de pontos inespecíficos, não associados a sintomas de saúde mental.
Os desfechos primários do estudo foram a proporção de participantes que apresentaram melhora de 50% ou mais em seus sintomas, avaliados pelo PHQ-9, três meses após a inclusão. Os desfechos secundários foram: melhora de 50% ou mais nos sintomas, após seis meses; qualidade de vida (a partir do questionário SF-36), alteração no uso de medicação antidepressiva, eventos e efeitos adversos, níveis de fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), e do plasma sanguíneo. Os dados foram analisados visando tratá-los de acordo com os princípios do CONSORT (em português, Padrões Consolidados de Relatos de Ensaios). Os resultados não mostraram diferença estatisticamente significativa na recuperação depressiva entre os grupos aos 3 meses. As proporções de recuperação, e remissão, da depressão, em 4 e 6 semanas, com base no PHQ-9, foram maiores no grupo AA específico (exceto para recuperação da depressão em 6 semanas), sem diferenças estatisticamente significativas.
No entanto, uma diferença estatisticamente significativa foi observada na redução dos sintomas aos três meses. O relevante é que os resultados sugerem que AA específica, durante 6 meses, é segura, ainda que não tenha havido diferença estatisticamente significativa entre os grupos primários de eficácia. Mas o certo é que pacientes que receberam AA específica apresentaram maior remissão dos sintomas em três meses.
Professor Pesquisador da UnB-DF*