José Antônio Lages *
A semana foi agitada com a repercussão de uma diligência organizada pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural de Ribeirão Preto – CONPPAC, em dia 20/10. Cerca de dez pessoas estiveram no Museu Histórico de Ordem Geral e no Museu do Café, no campus da USP. Entre elas, membros do próprio conselho, outros historiadores e arquitetos convidados e funcionários da Secretaria Municipal da Cultura e Turismo. Como historiador, eu fui convidado para participar dessa visita técnica pelo presidente do CONPPAC. Ao sair de lá, depois de umas duas horas de inspeção, tive uma clara percepção: os nossos museus gritam por socorro!
Encontramos o acervo em uma situação calamitosa. A impressão foi de que, quando se decidiu pelo fechamento dos museus, eles foram simplesmente lacrados, sem nenhum cuidado técnico de salvaguardar os itens com todos os protocolos exigidos neste caso. Muitas peças a descoberto, espalhadas, amontoadas. Salas inteiras vazias com a pergunta que não quer calar: onde está o que estava aqui? Acredito que o fechamento de um equipamento cultural de grande relevância para a nossa história e a nossa memória teria de se basear em um ato administrativo publicado em Diário Oficial. Houve? Se houve, partiu de um laudo, um estudo técnico que apontava para a necessidade urgente de fechamento? Os nossos museus gritam por socorro!
O que vimos comprova mais uma vez que as nossas administrações municipais, não somente a atual, não conseguiram desenvolver, junto com a sociedade civil organizada, uma política pública de preservação de nosso patrimônio cultural. Pequenas intervenções pontuais não resolvem o problema como um todo. É preciso uma política! O próprio Museu Histórico passou por reformas do telhado e do assoalho há cerca de oito anos, quando foi fechado. Não encontramos sinais visíveis de deterioração do prédio que justificassem um fechamento atabalhoado… O que pede socorro urgente é o acervo reunido por décadas por verdadeiros arautos preocupados com a nossa memória, nossa história.
Muitas perguntas ficaram sem resposta. O tombamento é restrito às duas edificações, mas não ao acervo. Existe, pelo menos, um registro, um inventário completo de todos os itens pertencentes aos museus? Existe algum sistema mínimo de proteção contra incêndio e outras intempéries dos prédios e do acervo? Existem peças que foram emprestadas para outras instituições e não foram devolvidas, como afirma a ex-diretora dos museus, a professora da USP Silvia do Espírito Santo? Eu mesmo fui acionado por um amigo de Cajuru, reclamando de duas urnas funerárias indígenas que a comunidade de sua cidade cedeu à USP que, por sua vez, as transferiu para o Museu Histórico com uma forma de comodato. Já as querem de volta… os nossos museus gritam por socorro!
Uma ação judicial de 2017 obrigava a Prefeitura a reabrir os museus dentro de seis meses, sob multa diária de R$ 1.000,00. A Prefeitura recorreu ao TJ-SP e perdeu de novo, agora com uma multa diária de R$ 10.000,00. Recorreu de novo e a
decisão final está suspensa no STF. O que temos ali é um crime não apenas contra Ribeirão Preto, mas um crime contra o Brasil. A memória e a história que se quer preservar ali não são apenas de Ribeirão Preto, mas são a memória e a história do café que tem relevância para o estado e para o país. Comete-se um crime nos nossos museus! E por analogia, quero lembrar que uma das condenações que estão sendo dadas pelo STF aos golpistas bolsonaristas do 8 de janeiro é justamente a depredação de patrimônio tombado em Brasília. As autoridades precisam ficar alertas quanto a isso. Nem tudo continua terminando em pizza.
Por fim, quero lembrar uma postagem do nosso prefeito em suas redes em 2018, lamentando o terrível incêndio que destruiu o Museu Nacional do Rio de Janeiro naquele ano: “Estamos muito tristes com o incêndio que destruiu cerca de 90% do acervo do Museu Nacional. A história do nosso país deve ser preservada e valorizada, sempre. Diante disso, muitas dúvidas surgiram a respeito da nossa cidade. E venho tranquilizar a todos que, na semana que vem, será firmado um convênio com o Centro Universitário Moura Lacerda para desenvolver um projeto básico da futura restauração dos Museus do Café e Histórico. O projeto deve ser entregue em 6 meses. Como sempre digo, a mudança do país começa pelas cidades”. Concordo plenamente, prefeito! Mas os nossos museus continuam gritando por socorro!
* Consultor técnico-legislativo e ex-vereador em Ribeirão Preto (Legislatura 2001-2004)