Por Adalberto Luque
Depois de recuar em julho, os casos de furto voltaram a assustar os moradores de Ribeirão Preto em agosto. De acordo com a apuração feita pela Secretaria da Segurança Pública (SSP), os furtos aumentaram 38% na cidade em apenas um mês. Em comparação com agosto de 2022, os casos de 2023 são 15% maiores.
A cidade teve, em 2023, uma média de 27 furtos por dia. Foram 6.545 desde o dia 01 de janeiro. Em agosto foram registradas 972 ocorrências desse tipo, contra 704 em julho. Os dados são da SSP, em análise feita junto aos oito Distritos Policiais (DP) da cidade.
O total apurado em agosto foi o quarto maior em um mês desde setembro de 2016, quando foram registrados 1.007 furtos. Estes dados não levam em consideração os casos de furto de veículos, que tem estatística à parte. Mas reúne uma variedade de produtos levados de seus donos, que vão desde aparelhos celulares até postes de iluminação, passando pelo principal produto que garante um número tão alto nesta modalidade de crime: os fios elétricos, sobretudo os de semáforo.
“Jornada” noturna
Um estudo divulgado pelo Sindicato das Seguradoras (SindSeg) aponta que 52% dos furtos ocorrem durante a madrugada. Em Ribeirão Preto isso parece se confirmar, sobretudo nos casos de furtos de fios de semáforo, onde o ladrão fica exposto.
A questão inclusive, chegou a ser tratada pelo Superior Tribunal de Justiça em agosto de 2022, quando ficou definido que a pena por furto pode ser aumentada em um terço, como previsto no parágrafo 1º do artigo 155 do Código Penal, bastando que o crime tenha sido praticado durante o repouso noturno, diante de tantos casos no período.
Mais de 3 km
Uma das principais vítimas da ação dos criminosos é a RP Mobi, antiga Transerp. A empresa de trânsito já registrou, somente de janeiro a julho de 2023, 71 ocorrências. Uma a mais do que havia registrado no mesmo período de 2022.
Mas os prejuízos causados pelos criminosos vêm crescendo. De um ano para o outro, a quantidade de fios de semáforo furtados aumentou 23,14%.
“A RP Mobi informa que em 2022 (até julho), registrou 2.600 metros de cabos semafóricos furtados na cidade, em um total de 70 ocorrências. Quanto aos gastos, foram R$ 32.268,00 com reparos somente neste ano. Em 2023 (até julho), a RP Mobi registrou mais de 3.201 metros de cabos semafóricos furtados na cidade, em um total de 71 ocorrências. Quanto aos gastos, foram R$ 38.412,00 com reparos somente neste ano”, explicou a RP Mobi.
De acordo com a empresa de trânsito, a região Norte de Ribeirão Preto é a que mais registrou furtos de fiação nos dois anos citados. “Caso qualquer cidadão verificar alguma suspeita de furto de cabos de semáforos orientamos a ligar para a Polícia Militar no telefone 190”, acrescenta.
Para todos os casos de furto de fios de semáforos são registrados boletins de ocorrência que acabam investigados pela Polícia Civil. “A RP Mobi lamenta tais ocorrências que podem comprometer a segurança dos usuários do trânsito na cidade”.
Receptação
Dono de uma lanchonete no Higienópolis, região central da cidade, Ricardo Dutra resolveu trabalhar de bicicleta. Chegou para abrir seu estabelecimento por volta de 06h30. Colocou a bicicleta dentro da loja, com a porta entreaberta e foi para os fundos acender as luzes do local.
“Perdeu”, foi o que Ricardo ouviu enquanto estava nos fundos. Ainda chegou a ver dois homens em uma motocicleta levando sua bicicleta e vários pacotes de cigarro que havia recebido no dia anterior. Só da bicicleta, prejuízo de R$ 8 mil. No total foram mais de R$ 10 mil. Felizmente Dutra tinha seguro na lanchonete, que cobriu os gastos.
“Tinha seguro da lanchonete. Um corretor me disse que dificilmente iriam recuperar minha bicicleta. Só não fiquei no prejuízo porque o seguro cobriu as despesas”, conta Dutra, que acrescenta: “Já tivemos muitos furtos por aqui, quase todo mundo já foi furtado aqui nessa região. Se tem quem furte ou roube, é porque tem quem compre.”, lamenta.
Lei do Ferro Velho
Ribeirão Preto já criou uma Lei para tratar da questão dos ferros velhos, locais apontados como pontos de receptação de produtos furtados, como os fios de semáforos por exemplo. A Lei 3.165, de 08 de março de 2023, trata da questão.
Estabelece funcionamento, restringindo ao horário entre 6h e 19h, de segunda-feira a sábado. Determina que o local seja murado em todo o seu perímetro e, entre outras medidas, determina sistema de monitoramento por câmeras de segurança nos ferros-velhos.
Se não obedecer a estes e outros requisitos e houver mercadoria sem origem comprovada, o local está sujeito a penalidades que vão de multa a lacração, além do perder os produtos irregulares.
Mas a Lei ainda não deu resultados práticos, pois, de acordo com as estatísticas, os furtos só têm aumentado em quantidade.
Campos Elíseos e Bonfim Paulista
Em todas as áreas sedes dos DPs houve aumento, à exceção do 6º DP. A área da Vila Virgínia registrou queda de 1,3% nos casos de furto entre julho e agosto. Nos demais sete DPs, houve alta.
As mais significativas foram notadas na área do 2º DP, nos Campos Elíseos, 5º DP, no Alto do Ipiranga e 7% DP, de Bonfim Paulista.
No traço das ocorrências até há poucos anos, Bonfim Paulista foi onde os furtos mais cresceram: 171%. Passou de sete casos em julho para 19 em agosto. Na área do 5º DP, o aumento foi de 45%.
Mas o maior volume de furtos ficou mesmo na área do 2º DP. Em julho foram 143 casos e em agosto 300. Um acréscimo de 110%. Boa parte das ocorrências na sede do DP, os Campos Elíseos. Antes uma área residencial e predominantemente familiar. Hoje dividida entre comércios e residências. Mas todos têm em comum o medo do furto. E mudaram a paisagem local. Nos Campos Elíseos o que mais se vê nas casas e comércios são câmeras de monitoramento, concertinas, cercas elétricas e outros aparatos de segurança. Foram-se os tempos onde as famílias se reuniam na calçada ao entardecer e ficavam conversando por horas.
Especialista acredita em estabilidade nos casos
Coronel da PM aposentado e especialista em Segurança Pública, Marco Aurélio Gritti explica que a região dos Campos Elíseos é alvo constante dos criminosos por deter grande densidade populacional, por ter forte área comercial e de serviços, com bancos, hospitais e universidades, além da proximidade com o Centro. “Aliado ao fato de que possui avenidas que acessam a [Rodovia] Anhanguera, servem como vias de fuga. Ademais, os furtos em sua maioria são cometidos por dependentes químicos para manter o vício, portanto trata-se de questão de assistência social, de saúde, que reflete na segurança pública”, acredita.
Para o especialista, todavia, os dados acumulados entre janeiro e agosto deste ano em relação aos furtos, estão próximos do mesmo período do ano anterior e Gritti considera que houve alta produtividade policial, com inquéritos e flagrantes, o que possibilita projetar estabilidade.
Sobre a região de Bonfim Paulista, que durante anos viveu próximo ao traço na estatística criminal, ele credita o crescimento imobiliário como fator que alavancou o aumento. “A região de Bonfim Paulista, há alguns anos, tornou-se alvo dos criminosos em face sobretudo da expansão de condomínios, circulação de pessoas e veículos. Somando-se ao fato de que também possui muitas propriedades rurais e vias de fuga a rodovias e estradas rurais com acesso a outros municípios.”
Gritti observa que os furtos e roubos e o tráfico de drogas são crimes fomentadores “do mais perverso ciclo vicioso a ser enfrentado na segurança pública”. Ele destaque que a legislação aprovada em Ribeirão Preto atribui poder de fiscalização aos órgãos municipais do executivo, que deve aplicar sanções àqueles eventualmente irregulares, com apoio operacional e investigativo das Polícias Civil ou Militar.
SSP discorda individualizar números por DP
Em nota, a SSP avaliou a questão. “A Secretaria da Segurança Pública esclarece que não é correto fazer comparações dos indicadores criminais de distritos policiais distintos, visto que cada região possui características sazonais e geográficas diferentes. A SSP tem se empenhado para garantir a segurança e manutenção da ordem pública em todo o estado de São Paulo, incluindo a cidade de Ribeirão Preto. O trabalho conjunto das Polícias Civil e Militar resultou na queda dos indicadores de roubos e furtos de veículos, em 4,1% e 18,9% de janeiro a agosto deste ano, em comparação com o mesmo período do ano anterior, em toda cidade. Além disso, houve o aumento de 46,5% no número de pessoas presas e apreendidas na cidade. Ao todo, foram 2.314 detenções. Na mesma comparação, houve aumento de 20,6% no número de veículos recuperados no município. As forças de segurança seguem empenhadas nos trabalhos investigativos e no reforço do policiamento ostensivo e preventivo, visando proporcionar à população uma maior sensação de segurança.”