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O Chile e sua literatura (25): Roberto Bolaño

Roberto Bolaño (1953 – 2003) foi um escritor chileno que, aos dez anos de idade, fez seu primeiro trabalho como bilhetei­ro em uma linha de ônibus que fazia o trajeto Quilpué-Valpa­raíso. Segundo especialistas, em 1968 a família mudou-se para a Cidade do México, onde Roberto passou a adolescência con­centrado na leitura, trancado por horas na biblioteca pública. Ele logo decidiu que queria ser escritor e começou a trabalhar como colunista para diferentes mídias. Quando completou vinte anos, quis voltar ao Chile. Foi dias antes do golpe de Au­gusto Pinochet e Bolaño se juntou à resistência, mas foi preso. Após oito dias de prisão foi libertado graças à intercessão de dois detetives que acabaram por ser ex-colegas de escola. De­cidiu voltar ao México e dedicar-se integralmente à literatura. No México fundou, junto com um grupo de poetas mexicanos, um movimento de vanguarda chamado infrarrealismo e, em 1975, finalmente viu seus primeiros trabalhos publicados, reunidos na antologia poética “Poetas infrarrealistas mexicanos”. Porém, “cansado de literatura”, deixou o México e foi primeiro para El Salvador, onde conheceu o poeta Roque Dalton, depois para a Europa, seguindo para o continente africano e retornando à Espanha. Não foi uma época fácil; estava sozinho, sem documentos, com dificuldades econômicas… Trabalhou em vários ofícios (foi lavador de pratos, empregado de mesa, vigia noturno, lixeiro, descarregador de navios, vindimador…) até conseguir sustentar-se participando em concursos literários. Todas essas experiências mais tarde se tornariam o tema de sua ficção.

Em 1984, em colaboração com Antoni García Porta, publicou seu primeiro roman­ce, “Consejos de un discípulo de Morrison a un fanático de Joyce”, pelo qual ganhou o prêmio Ámbito Literario. Nesse mesmo ano lançou “La senda de los elefantes”, que recebeu o prêmio Félix Urabayen. Dois anos depois, fixou-se na localidade costeira de Blanes (Girona), onde, sem abandonar o interesse pela poesia, dedicou-se cada vez mais à narrativa. Ele trabalhava em um pequeno estúdio a apenas cinquenta metros de sua casa, seguindo alguns rituais essenciais: rock dos anos 1970, infusão de camomila com mel e tabaco e muitos cigarros. Escrevia, então, três páginas por dia; e até dez, se tudo corresse bem, cuidando da estrutura de seus livros e reescrevendo muito. Em 1993, os médicos o diagnosticaram com uma doença hepática grave. A partir de então, Bolaño ficou obcecado em deixar um importante legado literário e de­dicou-se ainda com mais zelo à escrita e multiplicou suas publicações. Nesse mesmo ano, “Los perros românticos”, uma compilação da obra poética criada entre 1977 e 1990, e o romance “La pista de hielo” viram a luz do dia . Em 1996 apresentou “La literatura nazi en América” e “Estrella distante”, em 1997, a compilação de contos “Llamadas telefónicas”, que lhe valeu o Prêmio Municipal de Santiago do Chile, o mais importante de seu país.

O ano de 1998 foi, sem dúvida, um ano chave na vida de Roberto Bolaño que, pouco antes, começara a publicar na Anagrama. Nesse ano, seu romance “Los detectives salvajes” recebeu duas importantes distinções: o prêmio de novela Herralde e o Prêmio Internacio­nal de Novela Rómulo Gallegos “pela qualidade da obra e seu compromisso narrativo inovador”. O romance, no qual se destaca “o humor esbanjador, raro na literatura escrita em espanhol”, narra as aventuras de dois homens embarcados na busca de um escritor mexicano desapa­recido durante a revolução. Os esforços para encontrá-lo durariam de 1976 a 1996. Pouco depois desse reconhe­cimento público, e após vinte e cinco anos de ausência, Bolaño visitou o Chile. Como resultado dessa visita, surgiu um novo romance, uma pintura alegórica do Chile de Pinochet, carregada de fantasmas, torturadores e toques de recolher, intitulada “Nocturno de Chile” (2000) e descrita pelo editor Jorge Herralde como uma “pequena obra de arte arrepiante”.

No mesmo ano em que apareceu o “Nocturno de Chile”, Bolaño entrou na lista de espera para um trans­plante de fígado. Seu estado de saúde piorou e ele decidiu dedicar “o que resta da minha vida” ao que deveria ser sua obra-prima, 2666. “Ciente da sombra que a morte lançara sobre ele”, nas palavras de Enrique Vila-Matas. Continuou escrevendo até sua morte em 14 de julho de 2003, vítima de insuficiência hepática. Poucos dias antes, ele havia participado do 1º Encontro de Au­tores Latino-Americanos em Sevilha, sua última aparição pública, e havia entregado à sua editora o manuscrito do livro de contos “El gaucho insufrible”.

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