Oferecer tratamento de qualidade e de maneira humanizada é uma das prioridades do Hospital de Amor, da cidade de Barretos. Referência nacional no tratamento do câncer, o hospital criou o programa “Chamado do Herói”, que, com o uso da realidade virtual, permite que as crianças e adolescentes tratados estejam em outro “universo” durante a realização dos procedimentos. Inédito no país, o programa permite que eles participem do game virtual com a utilização de óculos especiais VR.
No jogo a intenção é que a criança seja a protagonista da própria aventura. Quando for submetida a algum procedimento que envolva algo desconfortável, ela será transportada a um mundo de fantasia 3D, através do uso dos óculos VR, unindo as duas realidades, por meio da distração e da sensação tátil.
A ideia é transformar o que é sentido fisicamente em uma aventura no mundo virtual a fim de combater os altos níveis de ansiedade e estresse relacionados à doença e seu tratamento. Por consequência também auxilia o círculo familiar mais próximo durante o processo.
Criado em parceria com o estúdio de Desenvolvimento Goblin o projeto é liderado pelo cirurgião pediátrico Wilson Oliveira Junior e ainda passa por adaptação e melhorias, mas o game – que foi criado do zero especialmente para o Hospital de Amor -, já traz muitos benefícios.
“Além da felicidade que vem trazendo aos pequenos, ‘O chamado do Herói’ ficou em 2º lugar no programa Centelha, iniciativa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI)”, afirma o desenvolvedor de jogos e um dos fundadores da Goblin, Chris Silva.
Segundo o cirurgião pediátrico Wilson Oliveira Junior nenhum outro hospital brasileiro – seja da rede particular ou do Sistema Único de Saúde (SUS) – oferece serviço semelhante ou equivalente às crianças com câncer. “A possibilidade de redução de dor e ansiedade das crianças e seus familiares traz efeitos benéficos a curto, médio e longo prazo, o que além de suavizar o tratamento e melhorar a dignidade dos indivíduos, traz redução de custos hospitalares, por exemplo, menos medicações para anestesia ou redução da dor, além do impacto extremamente positivo na vida social destes pacientes após o término do tratamento”, explica o médico.
Ele conta ainda, que todas as crianças acima de 3 anos, em tratamento para o câncer, poderão ser beneficiadas pelo programa. Até o momento, a aplicação foi oferecida a oito crianças que necessitaram de anestesia para realização de procedimento de quimioterapia intratecal.
Segundo o médico, a utilização dos óculos reduziu de forma expressiva a ansiedade da criança e de seus pais desde antes da entrada no Centro Cirúrgico facilitando todo o processo. Ao final, todas as crianças convidadas para participar da experiência relataram que o procedimento foi divertido e que em uma próxima vez que necessitassem de anestesia, elas iriam com muito mais tranquilidade ao Centro Cirúrgico do Hospital.
O programa ainda está em desenvolvimento e validação e faz parte do projeto de Mestrado Profissional de Inovação em Saúde da médica anestesiologista pediátrica do Hospital de Amor infanto-juvenil, Leticia Bachette, e além de ser inovador por usar tecnologia de realidade virtual imersiva, será o pioneiro na sua aplicação em crianças oncológicas.
O médico argumenta ainda que dentro desse contexto, o uso da gamificação, que utiliza da interação associada a um design de jogo num contexto que não seja de jogo, transforma procedimentos traumáticos, como uma punção venosa, por exemplo, em uma experiência prazerosa e divertida. Para facilitar este processo, o uso de tecnologias imersas como a Realidade Virtual (RV) estende o ambiente sensorial da criança simulando a realidade física através da tecnologia.
O enfrentamento da doença
A trajetória da criança com câncer, de um modo geral, desde o diagnóstico até a cura ou a paliação com dignidade exige um longo caminho. Uma jornada hercúlea, digna de grandes heróis míticos.
“O nosso projeto vem suavizar esta jornada. Esse programa nasceu por meio da observação do sofrimento diário das crianças com câncer diante dos inúmeros procedimentos que são submetidas todos os dias”, conta o cirurgião pediátrico.
De acordo com ele, crianças com câncer, por realizarem inúmeros procedimentos invasivos que necessitam de anestesia, tendem a apresentar quadros ansiosos potencialmente exacerbados. Este quadro pode trazer inúmeros prejuízos para os pacientes, prejudicando a adesão e o tratamento em si.
Desta forma, buscar métodos de redução de ansiedade é um desafio para a equipe envolvida no cuidado da criança, dentre estes métodos, aqueles que promovem distração antes e durante os procedimentos, especialmente, por meio de métodos audiovisuais, possuem um bom resultado.
Para o médico, a utilização de ferramentas de inovação tecnológica buscando transportar a criança em tratamento oncológico, no momento de seu sofrimento a um mundo de fantasia, fundindo animação em RV, com sensação tátil do tratamento, traz uma nova perspectiva de cuidado humanizado para a “Oncologia Pediátrica”, em todas as suas vertentes de cuidado. “De acordo com a filosofia do Hospital de Amor, a unidade infanto-juvenil é o lugar ideal para esta ideia germinar e se desenvolver”, finaliza o médico.