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O motorista, o pintor e o painel

Era o ano de 1981, o Brasil ainda sob o manto da nefasta, déspota e sanguinária ditadura militar, trabalhava no Uniban­co, antigo Banco Moreira Salles, já participando da luta pela volta da democracia e queda da tirania, já sindicalizado, sob os olhares difíceis e desconfiados do meus colegas e da ge­rência da Instituição, com o tempo levei muitos funcionários para o sindicato e para a luta.

Engraçado que na minha infância em Minas foi cunhado um dito que fez muito sucesso e enchia o peito dos mineiros de glória.

“Nós vendemos queijos e possuímos Bancos”, meia ver­dade, realmente grande parte deles eram mineiros: Banco da Lavoura, Banco Nacional, Banco de Crédito Real, Banco Real, Banco Moreira Salles o próprio Bemge – Banco do Estado de Minas Gerais.

Penso eu que um ditado bem fora de moda, principalmen­te no mundo de hoje, ao sabor das intempéries e dos ardis do tal “Mercado”, que comanda os mundos, com seus juros, fazendo com que a desconfiança mineira, voltasse a guardar seus proventos e o rico dinheirinho em um lugar verdadeira­mente seguro, debaixo dos colchões.

Não consigo nem imaginar o motivo enveredei-me por este tortuoso caminho regado com base monetária, spread, com­pulsório, renda fixa, variável, compulsório, carteira de ativos, ações, alíquotas e o resto, levando o mundo à penúria e ruína.

A estória que pretendo contar não possui a mínima supre­macia ou relação com os nuances, segredos, artimanhas e os mistérios do sistema financeiro, a não ser com o exercício do meu labor no estabelecimento.

Em uma das minhas férias, me dirigi ao ateliê e residência do Paulo Camargo, exímio, brilhante e talentoso pintor, com obras em todo Estado e país, seus quadros e painéis, obras que enchiam de emoção as pessoas e seus olhares, Paulo Ca­margo, um sujeito despojado, homem do povo, comprometi­do com a resistência e a defesa dos oprimidos e desvalidos.

Foi marcada uma exposição e vernissage pela Prefeitura Municipal, que colocou veículos à disposição para o trans­porte das obras, que o Paulinho exigia cuidar pessoalmente.

Dentre as obras, um painel imenso, feito a pedido de uma igreja em Rio Claro, que necessitava um caminhão grande, tipo “aqueles Mercedes antigos”.

Acompanhei o Paulo para levar as obras, principalmente o painel.

Chegando o caminhão, o painel foi colocado, preenchen­do toda a carroceria.

O nosso querido pintor estava com uma calça surrada jeans, bastante marcada de tintas, fomos na boléia, onde aconteceu um fato hilário, cerne e razão da história.

O Motorista puxou conversa elogiando a obra:

Que coisa linda, estou sem saber o que falar com o tama­nho, nunca tive oportunidade de conhecer.

– Quem fez isto?

E o Camargo simples e tranquilo, fui eu.

O Motorista caiu na risada e nos chamou de gozadores, teve que estacionar o caminhão, não parando de gracejos e risadas.

Bom! Chegamos à “Casa da Cultura Juscelino Kubitschek” em um rico complexo patrimonial, idealizado pelo arquiteto, Jaime Zeiger, que dá nome ao destacado “Teatro de Arena”, uma das joias do lugar.

Foi como sempre um sucesso, apesar do Paulo detestar.

O motorista até hoje está às gargalhadas.

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