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A interpretação expansiva da lei

O Tribunal Superior Eleitoral cassou o mandato do deputado federal, Deltan Dellagnol, parceiro de Sergio Moro na parte certa e boa e na grande podridão da Lava-Jato, que, abusada, contaminou a legitimidade da justiça brasileira e patrocinou os efeitos deletérios da economia, com desemprego desenfreado e liquidação das empresas de engenharia que concorriam no mercado internacional.

Na sequência dos abusos cometidos, descobertos pela Incercept Brasil o do point power sobre Lula, o então Procurador-Coordena­dor revogou, abusivamente, a necessidade de provas no processo penal brasileiro, declarando que não as tinha, mas tinha convicção. Um verdadeiro fanático solto na televisão e nas redes sociais.

Agora, o TSE destina a ele a cassação de seu mandato, como fi­cha suja, não optando por nenhum argumento novíssimo para inflar a vaidade do cassado, como sendo ele o primeiro e único. Afinal, esse mesmo argumento da sentença, a Folha de São Paulo, em sua edição do dia 18 do corrente mês de maio, apresentou outros proces­sos julgados pelo mesmo Tribunal e nos quais a razão de decidir não aplicou simplesmente a letra fria da lei, mas partindo-se dela buscou retirar-se de algum princípio constitucional o que melhor realiza a efetividade da justiça.

Dá-se a esse critério de aplicação da lei a designação de interpre­tação expansiva. É dessa maneira que compreendo o voto do Relator Ministro Benedito Gonçalves. Naturalmente, existem opiniões contrárias a esse método interpretativo e que defendem a aplicação da letra fria da lei.

Mas a gratuidade irresponsável do discurso do deputado cassa­do, que acusa a suposta influência determinante do Presidente Lula no julgamento do Tribunal Eleitoral, se revela como digna de um boquirroto, já que a unanimidade da sentença de cassação contou com três votos de ministros nomeados pelo governo anterior.

Na verdade emerge dessa condenação o debate doutrinário que traz de um lado a aplicação da letra fria da lei ou a colocação dela sob a iluminação de princípios constitucionais, celebrando a inter­pretação expansiva. É possível tal debate jurídico?

A resposta pode ser obtida, mediante as afirmações de dois professores de Filosofia do Direito, Miguel Reale (1910/2006) e seu brilhante aluno, Tercio Sampaio Ferraz Junior (1941), nosso colega de Turma de 1964, que logo após a publicação da Constituição de 1988, abordaram aspectos fundamentais do nosso pacto de convi­vência social.

Para Miguel Reale, o Poder Judiciário aplicando a Constituição poderia fazer uma revolução. Por outro lado, Tercio Sampaio já alertava que a aplicação da letra da lei constitui a pratica vigorante desde o Século XIX, e já ficava ultrapassada com a nova Constitui­ção, porque agora a interpretação necessariamente é a da aplicação da letra da lei mas sobre o influxo das necessidades sociais. Por isso os princípios consagrados pela Constituição constituem a régua fundamental para dar vida e efetividade à letra da lei e a consequen­te efetividade da justiça.

Assim a nossa Constituição é principiológica e sua irradiação contamina todo o sistema jurídico, todas as leis infraconstitucionais.

O Ministro Benedito Gonçalves nada mais vez do que interpretar a “fuga” do cassado de sua instituição, o Ministério Público Federal, para impedir a eventualidade de quaisquer punições, tomando por base a lei e os princípios constitucionais. Aliás, a Constituição é tão expansiva que ela se refere expressamente à aplicação de princípios escritos e a princípios implícitos.

Particularmente, sugiro um princípio: “ninguém pode fazer de forma indireta o que diretamente a lei proíbe”.

Pessoalmente, eu preferiria ver o final de um processo crime contra o cassado, que como Procurador Federal até manteve ligação direta com organismos policiais estrangeiros, entregando ao De­partamento do Estado norte-americano provas contra a Petrobras, que era vítima, para receber, num acordo, dinheirama de volta, para uma Fundação gerida por ele. Tudo às escondidas da lei e do gover­no brasileiro.

Na verdade, como diz o famoso advogado Antônio Carlos de Al­meida Castro (1957), conhecido pela alcunha de KaKay: “A Lava-jato não acabou. É hora de responsabilizar os que têm culpa”.

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