Os juristas europeus, no século XX, passaram a reconhecer que os moradores das cidades têm não somente direito de propriedade sobre sua residência, como também direitos a serem exercidos como moradores de sua cidade: como cidadãos. Por se tratar de direito reconhecido, o titular tem portas abertas para defendê-lo perante o Judiciário.
Tal visão está refletida no artigo quinto, da Constituição, onde se lê que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
Daí se extrai que os membros da sociedade civil podem agir segundo a sua livre vontade desde que não infrinjam uma lei. A sua liberdade pode ser restringida somente por lei.
Ao contrário, os governantes nada podem fazer salvo se autorizados por uma lei atributiva de poder.
Assim a moderna literatura – não tão moderna assim – define cinco caminhos para fixar o controle dos atos da Administração pelo Poder Judiciário: a) o controle da norma atributiva de poder; b) o controle jurídico da pessoa atingida pelo ato; c) o controle da publicidade do ato; d) o controle dos motivos; e) o controle da finalidade.
O controle da norma atributiva de poder refere-se à autorização legal outorgada à autoridade responsável para edição do ato administrativo. Há ou não há norma atributiva de poder autorizando o constrangimento da liberdade? Não existindo, o ato é nulo de pleno direito.
O controle da qualificação jurídica da pessoa atingida pelo ato, como exemplo, será possível anular o ato editado, referente à nomeação de alguém para um cargo de médico, se para tanto não tem qualificação profissional.
O controle da publicidade do ato administrativo tem como objetivo comunicar a sua existência para o interessado e para a sociedade. Trata-se de sua publicação.
O controle dos motivos que teriam dado concreção fática para o ato editado. Portanto, se se trata de um ato motivado a propiciar vantagem ilícita em favor de alguém protegido pelo governante, o ato poderá ser judicialmente corrigido.
O quinto instrumento de controle do ato surgiu com a jurisprudência francesa, ou seja, o exame da finalidade do ato. A decisão administrativa tem sempre a finalidade de satisfazer um fim. Se incompatível com a estrutura jurídica, o ato poderá ser corrigido. Muitas vezes, os governantes não indicam o fim do ato. Ao Juiz caberá decidir se o ato satisfaz ou não um interesse público.
O direito moderno afastou-se do reconhecimento da discricionariedade administrativa: no passado recente, reconhecida a discricionariedade, não caberia ao Juiz o seu controle da legalidade.
O grande professor português Afonso Queiró assim conceituou a discricionariedade: o legislador pode valer-se tanto de uma linguagem técnica como de uma linguagem vulgar para redigir o texto. Por exemplo: 1) é técnica a linguagem que fixa a idade para o cidadão candidatar-se a determinado cargo público; 2) ao contrário, poderá usar a linguagem popular ou vulgar, como “bom pai de família”.
Se a linguagem normativa é técnica, o Judiciário tem o poder de corrigir o ato administrativo. Dá-se o nome de ato vinculado. Ao contrário, se a linguagem da lei é a comum, como “bom pai de família”, a sua aplicação permanece inteiramente em poder do governante ou do administrador, não autorizado o controle pelo Judiciário. Aqui residiria a discricionariedade administrativa.
A tendência moderna é ampliar todos os poderes de controle do Judiciário, afastando qualquer reconhecimento de discricionariedade. Ou seja, todos os atos administrativos estão sob o controle de legalidade pelo Poder Judiciário.