A Lei 11.738/2008 determinou no seu artigo segundo, que na composição da jornada do professor, 1/3 dela será para trabalhos de atividades extraclasse, tais como preparar aulas, correções de provas, planejamento, aperfeiçoamento e formação continuada do professor, através de cursos, oficinas, etc. Em 28/05/2020 o STF reconheceu a constitucionalidade da hora-atividade.
A luta pelo 1/3 foi árdua e longa. Em São Paulo desde a aprovação do Estatuto do Magistério Estadual em 1985 e nacionalmente a partir da promulgação da Constituição de 1988, vínhamos lutando com nossos sindicatos pela regulamentação e aprovação dessa lei.
Na Rede Municipal essa lei foi regulamentada e passou a ser colocada em prática com a promulgação do Estatuto, lei 2.524/12. No seu Anexo V consta uma tabela de carga horária de aulas suplementares e eventuais do professor de educação básica I, II e III, que serve de referencial para o cumprimento do TDC (Trabalho Didático Coletivo).
Desde essa data a Secretaria Municipal da Educação vem modificando a estrutura e o funcionamento do trabalho do professor no cumprimento da lei do 1/3, chegando hoje a uma grande descaracterização do espírito e do propósito pedagógico da lei, fazendo o professor cumprir diversos horários e tarefas de forma despropositada e sem nexo, um burocratismo desnecessário que transformou um trabalho que deveria ser complementar e significativo em um trabalho de tarefismo absurdo que extenua o professor e não cumpre o papel principal de aperfeiçoar o trabalho docente, ou seja, se transformou numa atividade inócua e contraproducente.
A falta de uma filosofia educacional, um modelo pedagógico democrático na rede, que pode ser explicado pela ausência de um Plano Municipal de Educação aprovado pela sociedade civil há 8 anos, que não foi regulamentado e colocado em prática pelo governo, que está no seu segundo mandato, gera todo esse descaso deliberado do governo municipal e dos seus gestores responsáveis com a educação pública de qualidade na nossa cidade.
Criaram órgãos como o CAAF, que logo alteraram apenas a nomenclatura para Centro Paulo Freire, para que seus burocratas teoricamente estudassem, debatessem e deliberassem com os professores sobre a melhor forma de se cumprir o TDC. Entretanto, na prática esses burocratas centralizaram as decisões, não fizeram o debate com os professores e de forma monocrática definiram como deveríamos cumprir a lei, o secretário publicou a portaria e para nós restou o cumpra-se.
Proponho uma reflexão a respeito do TDC que estamos cumprindo, que está dividido em 4 segmentos: Rede, Acompanhamento, Plataforma e Escola. Na prática será que ele está de acordo com os princípios pedagógicos e didáticos da lei de 1/3 de hora-atividade? Teoricamente a resolução SME Nº 1 de 28/02/2023 parece cumprir o seu objetivo e coadunar com a lei do 1/3, mas na prática cotidiana e didática não é isso o que acontece.
O termo TDC ou Trabalho Didático Coletivo está fora de propósito, pois as atividades extraclasses com hora-atividade são em grande parte atividades individuais e não coletivas. Eu não corrijo provas, não planejo aulas ou trabalhos necessariamente de forma coletiva. Eu não atendo pais junto com outros colegas, com exceção das reuniões ou conselhos de classe e série e reunião de pais, portanto, várias atividades sugeridas e reconhecidas pela lei do 1/3 não são coletivas, são individuais.
Com relação ao planejamento feito coletivamente ele não está acontecendo a contento, pois não temos oportunidades reais de discutir e deliberar a respeito, mesmo com todas essas modalidades de TDC. Formação e aperfeiçoamento aos professores não está sendo ofertado. Não tive formação nos últimos 7 anos, não estamos tendo oportunidades de aprender novas vivências, técnicas ou métodos de trabalho para aperfeiçoarmos e melhorarmos a qualidade das nossas aulas.
Discutindo com os colegas em várias oportunidades, chegamos à conclusão que a gestão engessou todo o processo apenas para controlar o nosso trabalho, nossos horários e tarefas e para eles o TDC é um fim em si mesmo, não há propósito didático e pedagógico sérios. Lutamos muito por esse momento de hora-atividade extraclasse, mas a gestão municipal está indo na contramão da história por falta de uma gestão democrática, de uma filosofia educacional apropriada coletivamente pelos educadores e solidificada de forma plural e participativa por toda a comunidade escolar. A luta dos educadores municipais por qualidade de ensino passa pela consolidação de um trabalho extraclasse significativo, virtuoso e construtivo, pois é isso que a comunidade escolar espera de nós educadores e gestores da educação.