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A bossa e o rock

O rock sucedeu à bossa nova. Eu fiquei prisioneiro da batida incomum dela, que João Gilberto conseguiu conquis­tá-la, de tanto ficar tentando no banheiro da casa da irmã, grávida, na cidade mineira de Diamantina, onde nasceu Jus­celino, Presidente bossa nova, acusado de introduzir o sorriso na política brasileira.

Não sei, exatamente, se fiquei prisioneiro dela ou do tempo em que ela explodiu, período de criatividade brasileira (1955-1960), no qual o Brasil expandiu arte, literatura, o es­plendor de Brasília, otimismo, alegria e confiança no futuro, para vagarosamente ir ao cadafalso do golpe de Estado de 1964, cuja brutalidade muita gente de hoje, desconhecendo sua história, não sabe que a violência também é brasileira.

Por exemplo, esse período recente da mediocridade apre­sentada como talento novo, é consequência da anistia decre­tada no Brasil para tentar superar aquele período histórico, sem saber que sua misericórdia daria fôlego e ousadia, para os que tentaram executar a organização do golpe de estado no Brasil, recentemente, e continuam às escondidas…

Mas, o assunto é a música e sua virtude de contaminar alegremente o coração do mundo. E bossa nova é criação da arte brasileira, que até hoje circula pelo universo como prova de nosso gênio. O rock é produto de importação.

Uma fonte não anula a outra, já que a música é universal, e ambas refletem correntes invisíveis de uma época, dentro da qual elas sempre coexistem, sendo que uma prevalece ocasio­nalmente sobre a outra.

Mas, o rock apareceu com o Elvis requebrando e conquis­tando o mundo e o Brasil. Eu continuei prisioneiro da bossa nova.

O tempo, julgo ter aprendido, me mostrou que o estilo, a expressão corporal, as letras do rock representavam um anúncio, um aviso prévio de um mundo que ali começara a trincar, revolucionar as relações humanas, contribuir com mais conteúdo ao feminismo crescente, despertar as consci­ências para uma liberdade e uma justiça, que só ficavam no papel, congelando as diferenças e as desigualdades sociais.

Essa reflexão me acontece avaliando o conjunto da obra de Rita Lee, morta recentemente, e que no palco da sua vida não se cansou de explodir em criatividade, movida pela música, que fez sua e contaminando de alegria e prazer os corações de milhões de pessoas que choram sua morte. Aqui no Brasil e com forte repercussão no exterior.

A morte não enterra tudo. O eco da vida de quem assumiu o destino histórico de anunciar a vida e o futuro permanece presente como força de arribação para todos nós, que olha­mos o mapa do amanhã com a curiosidade de quem quer advinhá-lo, sabê-lo e conquistá-lo.

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