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Indústria bélica: o maior e mais sujo negócio do mundo

Fui estudante universitário, na USP-Ribeirão, em tempos de profunda politização do movimento estudantil. Como consequência vários colegas fo­ram presos ou precisaram deixar Ribeirão ou, até mesmo, o País. Falávamos de um Brasil mais justo e humano, que não tivesse atrelado aos interesses dos poderosos, fossem brasileiros ou estrangeiros. Elegíamos como algoz maior uma coisa chamada “complexo industrial militar”, que ditava os rumos do mundo em função de seus interesses comerciais, disfarçados como “luta pela democracia” ou “luta anti-comunista” geralmente ficando atrás das cortinas e agindo por meio de terceiros que realmente acreditavam nessa corrente ou que eram testas de ferro contratados. Entendíamos que as sedes desse complexo estavam espalhadas pelo mundo, com a unidade central nos Estados Unidos.
O golpe militar de 1964 varreu essa juventude universitária politica­mente esclarecida. Todos conhecem muito bem a história daquela época.

Leio agora, mais de meio século depois, que o gasto militar tem cres­cido, chegando, em 2008, ao quase inacreditável total de US$ 1,46 trilhão, que corresponde a R$ 2,85 trilhões. O dado é do Instituto Internacional de Estudos para a Paz (Sipri) sediado em Estocolmo, Suécia.

Quero me aprofundar na análise desses dados.

O convívio, no mundo “globalizado” tem nos tornado insensíveis ao que representam os grandes números. Um telespectador se horroriza, com razão, diante de um crime cometido na rua, mas não presta muita atenção à notícia de um bombardeio que matou 80 pessoas, inclusive crianças, na Líbia, Iraque, Afeganistão, Kosovo e tantos outros países… afinal é tão longe! Essa “anestesia” de sensibilidade é produto da chamada globalização, como também o é não se indignar ao saber que o gasto com armamentos é mais que 190 vezes maior que o que se gasta para combater a fome, promover o desenvolvimento agrícola e melhorar, de forma paliativa, a situação nutri­cional das populações de países pobres que lutam contra a dificuldade de obter alimentos seja pela baixa produção, seja pelo alto preço.

São dados da FAO, divulgados a partir da Conferência de Alto Nível sobre Segurança Alimentar, realizada em Roma.

É indispensável que cada um pare e pense um pouco: o mundo gasta para matar, mais que 190 vezes o que gasta para aliviar a fome da população mais pobre do planeta.

Volto a lembrar do “complexo industrial militar”. Estávamos certos, é ele mesmo o grande vilão. E continua agindo por meio de terceiros, nos últimos tempos incluindo a OTAN e a própria ONU. Derrubam governos, elegem ou impõem governos, que, muitas vezes, acabam sendo nada mais que executivos de luxo de um interesse maior, que é absolutamente co­mercial. Afinal, eles tem o melhor negócio do mundo: fabricam e vendem armas que, em última análise, são pagos com o dinheiro do povo para o qual essas armas levaram morte e destruição. Ou alguém ainda acredita em “ajuda” militar?

O Iraque sairá, um dia, do domínio a que está submetido a partir de uma guerra baseada em mentiras, hoje admitidas até pelos seus executores. Mas talvez não saia nunca mais do lodaçal econômico em que se envolveu, já que terá que pagar dólar por dólar, euro por euro, libra por libra, cada bomba que foi jogada sobre sua população. Ou será que ainda pensam que esses gastos ficarão por conta dos Estados Unidos ou da Inglaterra? Ou ainda, ingenuamente, que a indústria bélica vai pagar a conta?

Depois foi a vez da Líbia. De repente descobriram que Kadhafi (ou Ga­dhafi ou seja lá o que for) era um ditador sanguinário. Parece que ele sempre foi, mas não haviam desconfiado disso enquanto forneciam armas para seu exército (fornecer, aqui, significa vender mesmo). A OTAN passa a despejar bombas na Líbia. Alguém vai pagar por elas. Não será a indústria bélica. Os rebeldes pedem armas. Certamente pagam por elas e como venceram comprarão mais (e isto aparecerá como “ajuda”).

Se Kadhafi vencesse compraria mais armas. Se ficasse muito feio comprar oficialmente ele o faria “no paralelo”, mas o dinheiro iria para o mesmo lugar.

A filosofia do complexo industrial militar é claramente traduzida na ideia “fantástica” da “bomba limpa”. E o que vem a ser isso? Nada mais, nada menos que uma bomba que mata pessoas, mas não destrói casas, propriedades e objetos.

Pronto, está aí a definição de objetivos dos que comandam o mundo: as propriedades e os bens materiais valem muito mais que as pessoas, que a vida. Lamentavelmente o poder no mundo decorre do dinheiro. O dinheiro vem principalmente dos negócios e não há melhor negócio no mundo do que produzir e vender armas. Pena que o preço maior não é pago em dinhei­ro, mas em vidas e desgraças.
Até quando?

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