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USP cria floresta depois do caos

Adriana Dorazi – especial para o Tribuna Ribeirão

Plantar uma floresta não é tão simples quanto parece, pelo menos para os pesquisa­dores da Universidade de São Paulo (USP), Campus Ribei­rão Preto. A trajetória de mais de três décadas para compor uma floresta com as caracte­rísticas daquela nativa que já cobriu todo o estado, a Mata Atlântica, é tão minuciosa que virou tema de filme.

O documentário “Nossa Floresta” estreou no final de março e deve ganhar voos al­tos. Produzido pela Superin­tendência de Gestão Ambien­tal (SGA), em parceria com o polo local da Superintendência de Comunicação Social (SCS), o curta-metragem conta como foi a implantação da floresta desde a criação do projeto, no final da década de 80, quando a degradação ambiental no es­tado de São Paulo atingia mo­mento crítico.

Incêndio de 2011 foi o mais recente de quatro episódios, com o maior prejuízo para a floresta

O filme relata também o incêndio mais recente que destruiu grande parte do ver­de, em 2011, chegando até a atualidade, quando o espaço revitalizado, composto por vegetação estacional semide­cidual, está com nova admi­nistração e projetos. O tra­balho em campo foi liderado desde o início pela professora Elenice Varanda que já se apo­sentou, mas ainda acompanha os estudos que a fauna e flora do local proporcionam.

“O projeto de implantação da floresta foi uma construção coletiva, de união de diversas pessoas em subprojetos, como a criação de um banco genético vivo numa área de 40 hectares”, destaca. O Centro de Estudos e Extensão Florestal da USP-RP (CEFLORUSP) é responsável pelo plantio e reflorestamento, em parceria com a Fundação Florestal, prefeituras, fazendas e ONGS, possibilitando amplo campo de pesquisas, aprendi­zagem e até turismo ambiental.

Nossa floresta
O filme traz entrevistas com pessoas que participaram de diversas fases e de diversos subprojetos em que a floresta estava envolvida. “O conteúdo leva a plateia a reflexões sobre a importância do reflorestamen­to de áreas urbanas e como o contato da população com áreas verdes ajuda na consci­ência ambiental”, conta Gabriel Mendeleh, produtor e diretor do documentário.

Para Fernanda Brando, assessora técnica na SGA e professora do Departamento de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, o documentário também tem o intuito de apresentar os projetos socioambientais e tra­zer a população para dentro dos muros da Universidade.

Já a professora Patrícia Iglecias, superintendente de Gestão Ambiental da USP, re­força que “a Universidade tem o compromisso de promover ações de cooperação e de in­centivo à conservação de suas áreas verdes e reservas eco­lógicas. “Por meio de alíneas orçamentárias específicas, a SGA apoia projetos como este, que visam à recuperação e ma­nutenção dessas áreas e que favorecem a governança am­biental dentro de seus campi”.

2011, antes e depois: a natureza trabalha silenciosa pra se recuperar depois da ação criminosa
Reflorestamento permitiu reativar poços artesianos e a formação de uma nascente

Quem assistir ao do­cumentário de 30 minutos (https://www.youtube.com/watch?v=JulHuPJyx1w) verá como foram seleciona­das as sementes em diversas florestas de várias regiões, formando pelo menos 50 mil árvores de 50 espécies. Enten­derá que foi preciso um siste­ma informatizado para evitar que houvesse proximidade de plantio de espécies iguais, por exemplo, favorecendo o desenvolvimento genético.

Na próxima semana o do­cumentário chega à Itália du­rante o Festival Oito e Meio, em Roma. Segundo a profes­sora Elenice destaca, hoje a Floresta da USP é fornecedora de sementes de alta qualidade para novos projetos que, como esse, contribuem significativa­mente para aumentar a quanti­dade de áreas verdes da cidade que está bem abaixo do consi­derado ideal.

A presença da vegetação permitiu até mesmo que po­ços artesianos da área, que estavam secos, voltassem a jorrar água limpa, até mesmo em meio à cana-de-açúcar de propriedades vizinhas. A diversidade genética é im­portante para aumentar a capacidade das espécies de sobreviver diante de distúr­bios que ocorrem na natureza, como os ataques de pragas ou eventos extremos, a exemplo de períodos de seca ou geadas.

História que precisa ser preservada
*com informações do Jornal da USP

Entre 1870 e 1940 o espaço onde hoje está instalada a USP em Ribeirão Preto abrigou uma fazenda de café chamada Monte Alegre – o primeiro local da cidade a receber luz elétrica. Em 1940, a região foi desapropriada pelo governo do Estado para a construção da Escola Prática de Agricultura Getúlio Vargas, mas alguns anos depois, em 1952, o terreno e o prédio passariam a ser propriedade da Universida­de. O objetivo era a instalação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), a primeira unidade do novo campus.

Dessa época até 1986, grande parte da Mata Atlântica do entorno do campus foi derrubada e arrendada para o plantio da cana-de-açúcar. Na década de 90 começaram de fato as ações para ampliar o reflorestamento. O plantio vem de mudas cultivadas no Banco Genético criado já nos anos 2000, com 90 mil mudas de 45 diferentes espécies, provenientes de mais de 3,3 mil árvores-mãe (25 para cada espécie em três repetições), cujas sementes foram coleta­das em mais de 400 fragmen­tos de mata.

A Floresta da USP em Ribeirão Preto é considerada pioneira com implantação aliada a con­ceitos de sucessão ecológica e plantio matematicamente pla­nejado. Localizada na região noroeste do campus, atrás do Departamento de Biologia e das Sessões de Parques e Jar­dins e de Transporte – tendo como ponto de referência o acesso pela avenida do Café, a floresta estende-se próximo às dependências do Hospital das Clínicas e faz divisa com o bairro Jardim Paiva, ocupando uma área de 75 hectares.

“A Floresta da USP teve ainda uma grande contribuição para um aumento de 20% da cober­tura vegetal da área urbana do município de Ribeirão Preto e para o retorno da fauna nativa. Também é notável o aumento da vazão das minas existentes no campus e o surgimento de uma nova nascente d’água. Espécies nativas bastante populares como ipê-branco, ipê-amarelo, jequitibá-rosa, quaresmeira, paineira, jaca­randá, jenipapo e embaúba, já produzindo flores e frutos, podem ser vistas no cam­pus”, comemora a professora Elenice.

No total, a USP em Ribeirão Preto possui 168,95 hectares (1,6 milhão de metros quadra­dos) de reservas ecológicas, segundo número da Superin­tendência de Gestão Ambiental (SGA) da USP, o que corres­ponde a 28,82% da área total do campus.

Nesse tipo de mata, incêndios são pouco usuais, por isso, eles foram muito danosos. Poucas espécies possuíram a capacidade de se recu­perar após o caso e houve uma mortalidade bastante acentuada em algumas áreas do banco genético. Há um monitoramento das áreas, com câmeras instaladas em torres. Elas tornam possível à Guarda Universitária acompanhar, em tempo real, tudo que acontece na mata. Caso seja detectado algum sinal de fumaça, ações são tomadas imediatamente para impedir o alastramento do fogo.

Há um grande interesse dos alunos em explorar o banco, muitas teses baseadas na Floresta da USP já foram apresentadas no campus. Um ponto interessante na fauna do campus em Ribeirão Preto são as diversas pesquisas sobre abelhas. Esses estudos começaram em 1964, trazen­do cientistas renomados do Japão e Argentina, por exem­plo, para ministrar disciplinas e orientar pós-graduandos.

Atualmente, o campus é mundialmente reconhecido por suas pesquisas com abelhas africanizadas e possui a maior coleção de abelhas sociais sem ferrão (Meliponini) do mundo, além de desenvolver atividades como o Encontro sobre Abelhas de Ribeirão Pre­to, principal evento científico sobre pesquisas com abelhas no Brasil.

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