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O golpe fake: a quase renúncia e as trapalhadas

Não consigo atinar qual seria a importância e a força de um obscuro senador (por mais poder que tenha um senador) para desfechar um golpe de Estado ou melar as eleições. Além de Marcos do Val que, na madrugada fez a “live” dizendo que renunciaria ao mandato e acusando o ex-presi­dente Jair Bolsonaro de tê-lo pressionado para participar de um golpe que teria por objetivo frustrar a posse de Lula, existem no Congresso Nacional outros 80 senadores e, pensando bem, nem a reunião de todos eles seria suficiente para afastar um governo regularmente estabelecido ou invalidar o resultado eleitoral.

Para impedir a posse dos eleitos, teria de se provar fraude nas eleições, o que não ocorreu, apesar das especulações e denúncias. Já, para derrubar o go­verno empossado seria necessária a união do Senado e da Câmara dos Depu­tados e, também, o concurso do Supremo Tribunal Federal, para a montagem de um processo de impeachment, onde as sessões de votação seriam dirigidas pela presidente da Suprema Corte, a exemplo do ocorrido em 2016, quando o ministro Ricardo Lewandowski, então presidente do STF, comandou o afastamento da presidente Dilma Rousseff (que, apesar do rito constitucional seguido, o Partido dos Trabalhadores, seus aliados e seguidores e até o presi­dente Lula, insistem em classificar como “golpe”).

Um golpe não dependeria da força de parlamentares. Num momento desses, para se concretizar a virada de mesa, seriam necessárias a concor­dância, força e rebelião dos militares das três armas (Exército, Marinha e Aeronáutica). Apesar das manifestações nas portas das unidades militares, isso não ocorreu. Tivesse acontecido, aí seria o típico golpe militar, onde o governo seria afastado, o Congresso e o STF colocados em recesso, e uma junta militar ou um general, almirante ou brigadeiro assumiria a chefia do Estado. E a Constituição estaria, no mínimo, suspensa.

Será muito difícil a Marcos do Val produzir provas que incriminem o ex-presidente. Tanto que ele próprio, pateticamente, voltou atrás sobre a renúncia, criou nova versão sobre os fatos narrados e passou boa parte da quinta-feira concedendo entrevistas onde aliviou o dito sobre Bolsonaro e jogou o fardo sobre o ex-deputado Daniel Silveira que, no novo quadro, seria o operador do golpe que, segundo disse, incluiria gravar clandestina­mente o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, na tentativa de obter algo que pudesse ser usado para anular as eleições.

É muito difícil crer que o capitão, se estivesse conspirando, convida­ria apenas do Val para a suposta empreitada golpista. Onde estariam os outros parceiros do golpe, quem seriam? O quê lhes teria sido proposto? Mesmo que apareçam outros franco-atiradores, é preciso investigar deta­lhes da virtual conspiração e verificar se houve algo de concreto. Não ten­do ocorrido nenhum ato, não há crime. Pensar e conjecturar, não é delito.

O crime efetivamente cometido foi a invasão e depredação das sedes dos três poderes, em 8 de janeiro. Mas atribuir esse ato a uma tentativa de derru­bada institucional, parece algo demasiado. Até porque, apesar das omissões de segurança, tudo restou sob absoluto controle e severa reprimenda. Afastou-se o governador e, além de exonerar dos postos, encarcerou-se o secretário da Segurança Pública e o comandante da Polícia Militar do DF.

Ainda há os quase 2 mil presos que passarão pela investigação sobre a efetiva participação de cada um nos atos criminosos, pela qual serão pro­cessados e julgados. Esses crimes dificilmente se repetirão, pois o governo está alterando e reforçando a guarda das sedes e, inclusive, projeta criar a Guarda Nacional, com atribuição específica de proteger sedes e próprios governamentais.

A situação política brasileira é controversa. Desde as manifestações anteriores à Copa do Mundo de Futebol, que sediamos em 2014, as extremas (direita e esquerda) se inflamaram e chamaram para si o direito de praticar a desobediência civil. Não contidas adequadamente, o quadro foi se agravando a cada ataque e, finalmente, ocorreu o 8 de janeiro. Espera-se que agora seja tudo devidamente esclarecido e os culpados recebam a devida e justa punição.

Fora as medidas jurídicas aos envolvidos, aguarda-se que a classe política – independente de partido ou ideologia – se empenhe pela paci­ficação. Se todo governante – isso já aconteceu a Lula e Michel Temer e hoje tentam impor a Bolsonaro – correr o risco de ir para a cadeia quando deixar o posto, ficará cada dia mais difícil encontrar homens (e mulheres) de bem para nos governar.

Com parceiros políticos semelhantes a esse senador, Bolsonaro, Lula ou qualquer outro líder político, nem precisará de adversários. A dor de cabeça está garantida…

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