Tribuna Ribeirão
Geral

O primeiro mês do novo ano se avizinha do fim e pouco se ouviu falar, no âmbito da Segurança Pública, sobre o “Janeiro Branco”, cam­panha mundial que visa conscientizar sobre a importância da saúde mental e, sobretudo, o combate à depressão e ao suicídio. Em 2023, o tema do movimento é “A vida pede equilíbrio! Juntos, a gente consegue levar essa mensagem ao mundo!”.

Não é nenhuma novidade que a profissão do policial é repleta de dificul­dades e desafios. Estes profissionais prestam serviço em condições adversas de segurança, com risco iminente, e muitas vezes, no período noturno. Além disso, podem ser chamados a qualquer hora para realizar diligências em diferentes regiões do País. Via de regra, policiais saem pela manhã de suas casas e não sabem como será o dia de trabalho; não sabem em que condições retornarão para suas famílias e para o seu lar. Não sabem, sequer, se retorna­rão. Arriscam suas vidas para proteger o cidadão, a população, o patrimônio público; se arriscam para garantir a ordem e combater o crime – diga-se de passagem, cada vez mais aparelhado, organizado, audacioso e cruel.

Sendo assim, é natural que a tensão, o medo e a insegurança sejam alguns sentimentos que orbitam os pensamentos de um policial e que podem fazer com o mesmo adoeça. Os índices quanto a afastamento médico, desistência da carreira, desenvolvimento de depressão severa e de tentativas (incluindo as com êxito) de suicídio corroboram, infelizmente, com minhas palavras. Por outro lado, pouco se fala a respeito da saúde mental dos profis­sionais de segurança. A maioria dos Governos não têm preocupação em pro­por uma política de saúde voltada a este público. O pouco que se tem sobre é raso, superficial e pouco efetivo e, porque também não dizer, envergonhado.

Em recente pesquisa publicada pela Secretaria Nacional de Segurança Pública e pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública foi constatado que a quantidade de óbitos de policiais fora do expediente é consideravelmente superior às mortes em horário de trabalho: são 295 baixas por ano no pri­meiro caso em contraponto a 16 óbitos anuais da segunda ilustração.

O mesmo levantamento analisou as causas das mortes dos profissionais da Segurança Pública entre os anos de 2015 e de 2020 e notou que as doen­ças físicas assumiram o protagonismo – parte delas, também provocadas por estresse, ansiedade, melancolia e depressão. Muitas das enfermidades, inclusive, poderiam ser tratadas por meio de atendimento adequado e um acompanhamento preventivo da saúde do policial. Este cenário desolador só não é pior que outro dado deste estudo: o que alerta que a segunda maior frequência de óbitos entre policiais é o suicídio. E, não menos importante: o profissional de segurança está ceifando a própria vida e, muitas vezes, com uso de sua arma de fogo, instrumento de trabalho de seu dia-a-dia.

Mais do que nunca, é imprescindível que, no que ainda resta deste “Janeiro Branco”, possamos, poder público e sociedade, refletir sobre as causas que levam um policial a dar fim à própria vida. O suicídio tem cau­sas multifatoriais quando se fala em Psicologia e Medicina, mas ainda inclui conflitos familiares – não raro, desencadeados pela sobrecarga de trabalho. O superendividamento, reflexo dos baixos salários pagos não de hoje à cate­goria, também reforça a lista de fatores, bem como o medo, a insegurança e a incerteza do futuro.

Falar sobre o que acontece é importante e pode salvar vidas. Sabemos que o operador da segurança pública é preparado e treinado para ser capaz de enfrentar perigos e desafios. É forte e destemido desde a gênese. No entanto, isso não significa que deva levar o mundo nas costas e a mente à exaustão. Não se pode banalizar as necessidades de saúde dos policiais, tampouco ignorar um ideal de invulnerabilidade, supervalorizando o mito do “herói” que não precisa cuidados.

Em síntese, o que se pretende aqui é destacar a necessidade de que os governos (federal, estaduais e municipais) implementem, de forma institucional, contínua e efetiva, políticas de saúde na Segurança Pública. Todavia, imperioso que se tenha em mente que tais providências não devem ter como norte, tão somente, a remediação, mas, sim, a prevenção por meio de assistência à saúde física (alimentação, sono, condição orgânica), mental (desmistificação e combate ao estigma do policial invulnerável), social (fortalecimento das relações familiares), ambiental (moradia, transporte, remuneração adequada) e institucional (infraestrutura de trabalho) destes profissionais.

Este é um desafio que lanço aos atuais governantes. Quem cuida, afinal, também precisa de cuidados. Quem protege precisa também ser protegi­do. E esta prerrogativa é de quem responde pela operação das forças de segurança de nosso País. É preciso que se invista nesta frente e, sobretudo, admitir essa necessidade. É preciso, em suma, coragem.

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