O interventor federal na Segurança Pública do Distrito Federal (DF), Ricardo Cappelli, aponta o acampamento bolsonarista em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, como central para os ataques golpistas que resultaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro, na capital.
“Isso [a centralidade do acampamento] fica claro e evidente porque todos os atos de vandalismo que aconteceram na capital, passaram, tiveram a sua organização, o seu planejamento e o ponto de apoio naquele acampamento que virou um centro de construção de planos contra a democracia brasileira”, disse nesta sexta-feira, 27 de janeiro.
Torres
Cappelli disse ainda que houve falta de comando e responsabilidade do então secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, e do alto comando da Polícia Militar no planejamento operacional relacionado aos atos do dia 8, uma vez que havia um relatório de inteligência mostrando a intenção de prática de violência.
“Na melhor das hipóteses faltou comando e responsabilidade. A Justiça está apurando e esse conjunto de coincidências podem caracterizar algo muito pior do que ausência de comando e responsabilidade”, afirmou. As considerações foram feitas durante a entrega do relatório detalhado sobre o episódio.
Relatório
A previsão era de que o documento fosse entregue na quinta-feira (26), mas houve adiamento para que imagens da depredação ao prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) fossem analisadas. O interventor disse que o documento servirá para apurar o que aconteceu e na individualização das condutas das pessoas envolvidas com os ataques.
Cópias do relatório foram encaminhadas para o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, e para o ministro do STF, Alexandre de Moraes, responsável por conduzir o inquérito que apura os atos. Será possível acessar o documento na íntegra, na página do ministério.
De acordo com o interventor, os eventos que ocorreram em Brasília desde o final do ano passado até o ataque terrorista do dia 8 passaram pelo acampamento, entre eles a tentativa de invasão da sede da Polícia Federal, no dia 12 de dezembro, que resultou no incêndio a veículos e a tentativa de explosão de uma bomba no Aeroporto Internacional de Brasília.
Estrutura
Cappelli também disse que o relatório mostra que o acampamento de apoiadores do ex-presidente tinha uma grande estrutura, com uma grande cozinha, banheiros químicos, geradores, chegando a ter mais de 300 veículos estacionados, entre eles caminhões vindos de diferentes estados do país e que na véspera dos ataques do dia 8 de janeiro, o local abrigava cerca de 4 mil pessoas.
Desde que o acampamento foi montado – logo após o resultado do segundo turno das eleições presidenciais –, foram registradas 73 ocorrências policiais, em casos de roubo e furto. O relatório aponta ainda que houve a tentativa de desmobilização do acampamento, ainda no final do ano passado, mas que houve resistência por parte do Comando Militar do Planalto.
“As nossas polícias, Militar e Civil, em conjunto, tentaram fazer incursões no acampamento para coibir o comércio ilegal, para desmontar. Inclusive houve a mobilização de homens para essas operações registradas e que foram canceladas na véspera por ponderações feitas pelo Exército brasileiro, pelo Comando Militar do Planalto”, disse.
O interventor apontou que após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), houve uma redução no número de acampados, mas que o quantitativo voltou a crescer na antevéspera dos ataques terroristas. “As investigações vão dizer se isso foi uma tática para despistar ou o que que houve”, disse.
“Mas o fato é que no dia seguinte o acampamento sofre um processo de desmobilização e quando chega no dia seis e sete ele explode novamente e chega a ter ali concentrações de em torno de quatro mil pessoas no dia 7 de janeiro”.
Inteligência
Outro ponto destacado por Cappelli foi que no dia 6 de janeiro, um documento da inteligência da polícia apontando a intenção de um ato golpista foi entregue ao gabinete do então secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres. “Nesse relatório de inteligência dizia que uma manifestação era convocada como tomada do poder. Existia a ameaça concreta de invasão aos prédios públicos e ali está escrito tudo o que poderia acontecer”, disse.
Cappelli citou a atuação de Torres como secretário de segurança como um fator que gerou instabilidade. Logo ao assumir o cargo, no dia 2 de janeiro, Torres trocou todo o comando da Secretaria de Segurança. “O impacto da posse do senhor Anderson Torres, no dia 2, com a instabilidade que ele gerou com as trocas. O gabinete recebe um relatório de inteligência e não tem nenhum desdobramento”, disse.