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Pelé, o soberano

Aceitar escrever sobre alguém que todos já escreveram talvez seja um dos maiores desafios, pois possivelmente o pretencioso autor repetirá informações, dados estatísticos e adjetivos que já foram exaustivamente utilizados e pouco acrescentará, especialmente quando se trata do maior atleta da maior modalidade esportiva criada pela humanidade.

Tratar de sua infância humilde, da admiração pelo pai, dos conselhos da centenária mãe ou abordar a superação de todas as dificuldades, inclusive as raciais, talvez se torne lugar comum. Uma alternativa seria destacar sua genialidade ao criar novos dribles e passes, explorando todos os espaços nos gramados e desfilando o mais genuíno talento, sua técnica refinada, seu vigor físico, sua visão, seu raciocínio genial, capazes de antever as jogadas, prevendo a reação dos adversários e a trajetória da bola que proporcionaria o extasiante encontro com as redes. Creio que alguém já tentou esse expediente.

Então, que tal falar da admiração dos chefes de governo e estado e dos líderes mundiais dos mais variados setores políticos e econômicos? Eles, que tratavam o rei do futebol como uma autoridade com todas as honras, pompas e protocolos, e ao final, se declaravam fãs que sucumbiam diante do astro maior.

Existem aqueles que, diante da incapacidade de encontrar algum reparo em sua carreira futebolística, optam por criticar sua vida privada, o pouco engajamento político, as incursões pela música, pelo cinema e televisão. Tempo perdido, pois ele mesmo fazia questão de separar o homem do desportista. E tinha razão, pois o humano era cercado de todas as fragilidades inerentes da espécie, mas o jogador era irretocável. Apenas reservo um espaço para lembrar dois momentos icônicos onde esportes e política se encontraram: Conclamar o povo brasileiro a cuidar das crianças, ao fazer o milésimo gol; e fazer 75.646 espectadores em partida de encerramento de carreira repetir: Love, Love, Love and Love.

No esporte, ele alcançou a excelência e se tornou referência. A mística da camisa número 10 é apenas um dos indicadores de sua influência. Se voltarmos nossa atenção aos grandes craques do passado, encontraremos muitos, porém, nenhum com a mesma eficiência desportiva. Se passarmos pelos atuais, a dificuldade será a mesma, pois tudo o que eles fazem hoje, ele já fez um dia. Ficar projetando alguém para suplanta-lo no futuro, também será outro exercício impossível e desnecessário. Ele foi único, superior… Incomparável.

Não sei se tudo o que falam sobre suas atuações nos gramados é verdade já que no futebol a mística e o exagero fazem parte do espetáculo, mas pelo que visualizei, ele foi simplesmente genial e, além de parar uma guerra (por um dia), em vários momentos conseguiu unir pessoas de todo planeta que independente de condição financeira, formação cultural ou educacional, sexo, raça, profissão, credo religioso e convicções políticas, vibraram com suas atuações e o reconhecem como o melhor de todos.

Em sua despedida faltaram os campeões de 1994, 2002 e outros atletas que jogaram pela seleção brasileira, talvez por impolidez ou pela empáfia, se esqueceram de quem lhes abriu os caminhos. Mas as orações,  lágrimas sinceras, cantos e homenagens do povo foram suficientes para suplantar o fiasco e confortar amigos e familiares.

Um dia lhe outorgaram o título de rei, mas geralmente os reis herdam o controle de determinado Estado ou território. Ele no mínimo seria um imperador, pois suas conquistas levaram a uma expansão do seu reinado para todo mundo, algo jamais observado em qualquer tempo ou atividade profissional e sua majestade será permanente. Talvez, um dia, a lexicografia encontre a melhor definição para o menino Dico, o homem Edson Arantes do Nascimento, o soberano Pelé.

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